O erro estratégico de Lula do veto à Venezuela no BRICS

O erro estratégico de Lula do veto à Venezuela no BRICS

A decisão do presidente Lula de vetar a entrada da Venezuela no BRICS em outubro de 2024 representa um equívoco de enormes proporções, tanto no plano geopolítico quanto no campo da solidariedade internacionalista. Num momento em que os Estados Unidos intensificam ameaças e agressões contra a República Bolivariana, negar-lhe a adesão a um bloco que nasceu para ser alternativa à hegemonia estadunidense pode significar o enfraquecimento da soberania venezuelana e, por consequência, a de toda a América do Sul.

O BRICS, ainda que heterogêneo, cumpre o papel de contrapeso à ordem unipolar dominada por Washington e seus aliados. Ao impedir que Caracas se some ao bloco, o Brasil perdeu a oportunidade de reforçar um eixo sul-americano dentro dessa articulação, isolando um aliado estratégico que há décadas resiste às ofensivas imperialistas. Em vez de fortalecer a integração regional, a decisão contribui para a narrativa estadunidense de que a Venezuela deve ser mantida à margem das instâncias multilaterais.

Do ponto de vista da solidariedade internacionalista, o veto tem implicações ainda mais graves. Ao negar espaço a um país que sobrevive sob bloqueios econômicos brutais e sob permanente ameaça militar, o Brasil envia um sinal de acomodação diante da pressão imperial. A solidariedade entre os povos não é um gesto de caridade, mas uma condição fundamental para resistir ao avanço do capital transnacional e ao domínio da Doutrina Monroe. Fechar as portas do BRICS à Venezuela equivaleu a enfraquecer o princípio de autodeterminação dos povos e a abandonar um aliado que tem sido farol de resistência para toda a América Latina.

A contradição salta aos olhos: tempo após vetar a Venezuela, Lula não hesitou em enfrentar Donald Trump na questão das tarifas, mostrando que, quando quis, teve coragem de desafiar os Estados Unidos. Por que não aplicar a mesma postura diante da perseguição contra Caracas? Ao ceder à pressão no caso venezuelano, fragilizou o próprio BRICS, que perde densidade no Sul Global, e deixou a América do Sul — e todo o continente a partir do Caribe — mais vulnerável à ingerência imperial. A história mostra que a tibieza diante do imperialismo nunca garantiu soberania a ninguém. A integração regional e a solidariedade entre povos só podem se consolidar quando a política externa se alinha à coragem de dizer não às pressões imperiais.

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Tali Feld Gleiser é cofundadora e diretora geral do Portal Desacato. Toda segunda-feira, apresenta o programa Do Rio ao Mar.

(+) Imagem em destaque: Presidente venezuelano Nicolás Maduro cumprimenta Lula durante encontro da CELAC. Crédito: Ricardo Stuckert / PR

(++) Publicado originalmente em Desacato

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