Unila concede título de doutor honoris causa ao jornalista Aluízio Palmar

Unila concede título de doutor honoris causa ao jornalista Aluízio Palmar

Por Renato Martins

Aluízio Palmar tinha 27 anos ao ser obrigado a deixar a faculdade de Ciências Sociais na Universidade Federal Fluminense. Militante estudantil da Geração de 68, ele foi perseguido e ingressou na clandestinidade quando ainda vivia em Niterói. Ligado ao Partidão, ajudou a criar com outros jovens militantes a dissidência que daria origem ao MR8, grupo de resistência armada à ditadura militar. Em razão de sua luta em defesa da democracia, Aluízio acabou sendo preso na Ilha Grande, onde permaneceu por mais de dois anos até ser libertado em troca do embaixador suíço Giovanni Bucher, diplomata capturado numa ousada ação comandada pelo capitão Carlos Lamarca. Banido do país, seguiu para o exílio no Chile, e não pôde jamais concluir o sonhado curso de Ciências Sociais.

57 anos depois, Aluízio Palmar retorna à universidade para receber o título de doutor honoris causa concedido pela Unila, a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila). Aprovada pelo Conselho Universitário, em reunião ordinária de 30/05/25, a honraria representa um gesto de reparação simbólica nos marcos da frágil justiça de transição – sistema que nunca chegou a vigorar plenamente no Brasil, apesar da persistente luta dos familiares dos presos políticos desaparecidos. De fato, o ajuste de contas com o passado autoritário avançou mais nos países vizinhos do Cone Sul. A lei da anistia “ampla, geral e irrestrita” garantiu, como se sabe, a impunidade dos torturadores e dos responsáveis pelo terror do estado praticado naqueles anos.

Por isso não deixa de ser significativa a decisão de conferir-lhe este titulo. Trata-se de uma reparação simbólica, que neste caso restitui o prestígio de um cientista social cuja carreira foi interrompida por motivos políticos. Trata-se, sobretudo, da restituição do sonho de um jovem estudante que retorna aos 82 anos à universidade para reaver o que lhe foi negado: um diploma universitário.

É verdade que, mesmo sem o diploma, Aluízio nunca deixou de militar no jornalismo. Assim que retornou do Chile ele fundou em Foz do Iguaçu, juntamente com outros companheiros, o jornal Nosso Tempo, que se notabilizou como uma voz vibrante na defesa das eleições diretas no município – então considerado área de segurança nacional e por isso impedido de eleger seus governantes. Posteriormente, já neste século, Aluízio fundou – e até hoje coordena – o site Documentos Revelados, um dos mais completos acervos sobre direitos humanos na cidade de Foz e na fronteira trinacional. Este banco de dados encontra-se à disposição da população e constitui uma fonte de consulta imprescindível para estudantes e pesquisadores interessados em conhecer a problemática dinâmica dos direitos humanos na região.

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Por fim, convém assinalar que a iniciativa de realizar essa homenagem ao jornalista Aluízio Palmar partiu do grupo de professores, estudantes e pesquisadores do projeto Memória, Resistência e Verdade. Ela é parte de um programa mais amplo de resgate histórico, que neste ano já promoveu a celebração dos 100 anos da Coluna Prestes em Foz do Iguaçu.

Salvo estudiosos e especialistas da primeira república, poucos se dão conta de que foi nesta cidade onde se encontraram as tropas comandadas por Miguel Costa, vindas de São Paulo, e por Luiz Carlos Prestes, vindas de Santo Ângelo, no Rio Grande do Sul. A decisão de prosseguir a marcha que percorreu 25 mil quilômetros do território nacional, em 2 anos e 3 meses de duração, enfrentando 53 combates sem sofrer nenhuma derrota foi aprovada pelo Estado Maior das duas colunas em Foz do Iguaçu. E o tirocínio militar de Prestes foi decisivo para que isso acontecesse.

A cidade que o nosso homenageado adotou como sua ao retornar do exílio é a mesma por onde passou o jovem tenente Luiz Carlos Prestes, em 1925, aos 27 anos de idade. Assim como ele, Aluízio também tinha 27 anos ao deixar os estudos e ingressar na clandestinidade. Cada qual a seu modo, ambos se insurgiram contra as oligarquias de seu tempo. Esta homenagem, portando, é duplamente emblemática, e representa um estímulo aos olhos das novas gerações quanto a importância do resgate da memória como uma ferramenta de reparação e justiça. Viva o doutor Aluízio Palmar.

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