Pacto entre elites e estagnação econômica

Pacto entre elites e estagnação econômica

A estrutura fiscal e financeira da economia brasileira sugere a possível existência de um “pacto entre elites”, estabelecida de maneira informal e conveniente a elas, desde a adoção do chamado “Tripé Macroeconômico” em 1999. Para alcance de uma meta de inflação bem abaixo da média histórica (e irrealista diante o contexto internacional de valorização do dólar), o Banco Central do Brasil fixa uma taxa de juro real entre as maiores do mundo e, expiando-se da responsabilidade por esta política monetária, alega ser devido à não obtenção pelo Tesouro Nacional de superávit primário suficiente para cobrir os encargos financeiros!

Os economistas lobistas na mídia culpam a política tributária pela alocação de recursos públicos em benefício dos mais pobres e/ou dos aposentados. Essa discussão deveria envolver com profundidade (e honestidade intelectual) a análise de gastos sociais, dos encargos financeiros relacionados à dívida pública, da regressividade do sistema tributário e dos efeitos das taxas de juros na economia.

O orçamento público brasileiro destina parcelas menores para programas sociais em benefício das populações de baixa renda e aposentados diante o pagamento de juros da dívida pública. Refletindo sua magnitude e a necessidade de sua rolagem contínua, em 2020, com taxa de juro baixa, gastou-se R$ 312 bilhões com juros nominais: 4,1% do PIB. Desde então, o valor foi crescente e atingiu-se R$ 950 bilhões em 2024 (8,05% do PIB); mesmo com o pequeno déficit primário de 0,4% do PIB, resultou em déficit nominal de quase um trilhão de reais (8,45% do PIB).

O sistema tributário brasileiro é caracterizado por uma alta dependência de tributos indiretos, como impostos sobre consumo. Eles são regressivos, ou seja, afetam proporcionalmente mais as camadas de menor renda. Essa estrutura resulta em uma carga tributária não incidente de forma proporcional sobre os mais ricos (beneficiários dos juros elevados), limitando a progressividade do sistema.

A política monetária restritiva desestimula investimentos produtivos, reduz a competitividade industrial e impacta negativamente a geração de empregos e a renda do trabalho. A combinação de um sistema tributário regressivo, altos encargos financeiros decorrentes da dívida pública e taxas de juros elevadas sugere a existência de uma estrutura favorável a determinados segmentos sociais em detrimento de outros. Essa configuração pode ser interpretada como um “pacto social” implícito, benéfico a todos os atores de maneira desigual, mas limitativo do potencial de crescimento econômico inclusivo no país.

Analiticamente, percebe-se haver uma hierarquia de funções entre os agentes econômicos no circuito monetário.  São classificados como “setores institucionais” famílias, empresas não-financeiras, governo, instituições financeiras e exterior.

Toda produção é objeto de um financiamento inicial (finance) e de um financiamento final (funding) distintos em valor e prazo. A moeda é originada do crédito, portanto, endógena, isto é, criada pelas forças do mercado.

Há leis macroeconômicas só possíveis de serem detectadas pelo holismo (visão do todo) por serem emergentes das interações microeconômicas. Não são observáveis de imediato pela experiência individual ou institucional.

Por exemplo, o Paradoxo da Parcimônia indica um aumento generalizado na poupança pessoal levar a uma diminuição na demanda agregada. Haverá uma
redução na produção e/ou renda e, por isso, reduzirá a poupança futura.

O Sofisma da Composição nas Finanças Corporativas é salário ser custo para as empresas, mas a massa salarial ser demanda agregada. Cortá-lo é “tiro no pé”!

Não é verdadeira a extrapolação das Finanças Pessoais feita por fiscalistas: “a dívida pública interna deve ser paga em algum momento”. Todos os bancos devem pagar todas as suas dívidas com os seus depositantes em algum momento?! As empresas terão de ser dissolvidas, algum dia, para pagar todas as obrigações aos indivíduos investidores em suas debêntures?! Dívida é feita para rolar – e não pagar! Exceto a dívida pessoal…

Outro equívoco da ortodoxia diz respeito à pressuposta igualdade entre o investimento e a poupança. Não é obtida senão ex-post, como uma expressão de um equilíbrio agregado por definição em uma identidade contábil: fluxo de renda total menos consumo. No nível das decisões, crédito substitui poupança escassa.

A questão central não é a determinação do nível da renda agregada, teoricamente, capaz de igualar “poupança” e investimento, mas sim a análise da complementação da circulação monetária. Os analistas deveriam focar as condições nas quais as firmas podem ou não reembolsar os bancos, via amortização dos empréstimos, importando sim o crédito – e não a poupança.

A produção depende da disponibilidade de moeda, pois a força de trabalho é contratada e as matérias primas são compradas por ela, em resposta às pressões da demanda efetiva, também validada monetariamente. Ela é uma moeda bancária – crédito em conta corrente – circulante em uma sequência particular de passos.

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Uma análise desses passos revela a possibilidade de ocorrerem crises de numerosas maneiras, todas elas nascidas de falhas intertemporais em pagamentos monetários, devido a “vazamentos” no circuito monetário. A análise do processo social de produção e consumo começa com a circulação de moeda.

Antes, a consideração do simples ciclo de produção agrícola já sugeria a produção como um processo circular. Neles, os mesmos bens apareciam entre os produtos e entre os meios de produção, como as sementes para a futura plantação.

Na História do Pensamento Econômico, os fisiocratas (François Quesnay) desenvolveram originalmente essa noção por analogia entre a moeda e o sangue. O objetivo essencial da Ciência Econômica seria a investigação das condições sociais e técnicas exigidas para a repetição do processo circular de produção.

Em seus termos mais básicos, a abordagem da circulação assume a posição de  a produção depender de moeda para contratar a força de trabalho e comprar as matérias primas, em resposta às pressões da demanda efetiva, validada por moeda. Por ela ser circulante, em uma sequência particular de passos,  uma análise dessas rodadas revela a possibilidade de ocorrerem crises de numerosas maneiras, todas elas nascidas de falhas intertemporais em pagamentos monetários, devido a “vazamentos” no circuito monetário.

De acordo com a visão funcionalista, os bancos desempenham papéis-chave, além de viabilizar o sistema de pagamentos, atuam no financiamento e no enriquecimento. Agem como intermediários financeiros, complementando os mercados de capitais, ao canalizar aplicações financeiras das famílias para as firmas. Nessa gestão do dinheiro, propiciam a acumulação de riqueza financeira.

Esse papel básico dos bancos pode ser visto como o de substituir títulos financeiros primários pela circulação de títulos secundários, ou seja, dar liquidez aos negócios. Diz respeito tanto a títulos de dívida pública quanto à dívida privada.

Por isso, as instituições financeiras são vistas como canalizadoras de recursos de unidades de dispêndio superavitárias para as unidades de dispêndio deficitárias. Os bancos têm o papel de repartir o poder de compra responsável por começar o processo produtivo.

A oferta de moeda é determinada pela demanda por crédito, tornando-a endógena ao sistema econômico. Na análise do processo circular da atividade econômica, descreve-se a atividade econômica como um circuito, iniciado quando as empresas conseguem empréstimos bancários para financiar a produção.

Esses fundos, para a alavancagem financeira e o aumento da rentabilidade patrimonial, são usados também ​​para pagar outros custos de produção. As famílias dos trabalhadores, ao receberem renda do trabalho, consomem bens e serviços produzidos, permitindo as empresas recuperarem o dinheiro inicialmente investido, obtendo lucro operacional acima das despesas financeiras. Há interdependência entre produção, renda e consumo.

O dinheiro não é neutro porque influencia diretamente a atividade econômica real. A disponibilidade e o custo do crédito afetam decisões de investimento e consumo, impactando o nível de produção, emprego e crescimento econômico.

Devido à capacidade dos bancos de criar dinheiro por meio de empréstimos, há um risco potencial de instabilidade financeira. Expansões excessivas de crédito levam a bolhas de ativos e, depois, crashes, quando os preços dos ativos existentes ficam abaixo do custo de produzir ativos novos. Só com a inversão haverá retomada do crescimento da produção de novos ativos e geração de ocupações e renda.

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