A humanidade no planeta enfermo

A humanidade no planeta enfermo

Não está tão distante a paisagem de um planeta árido e desértico. A seca, que era um fenômeno típico nos países do Sul europeu, alastra-se hoje para o Centro e o Norte, países nórdicos e do Leste do continente. Aponta-se um crescente déficit de umidade no solo mesmo quando chove.

POR CELSO JAPIASSU

Os trágicos incêndios que ameaçam a vida no Brasil, na Grécia, Itália, Portugal, Espanha, Austrália, Canadá, Chile, Indonésia e Estados Unidos, para não estender ainda mais a lista onde caberia grande parte dos países do mundo, é a catástrofe que ronda o planeta. Uma catástrofe que não surpreende. Autoridades mais conscientes não escondem sua preocupação e o seu medo do que está por vir. “A era do aquecimento global acabou, disse o secretário-geral da ONU Antônio Guterres. Começou a era da ebulição global”. Os termômetros já acusam mais de cinquenta graus centígrados em algumas regiões do planeta. O mês de julho deste ano foi o mais quente de que se tem notícia desde que começaram a se fazer registros da temperatura na Terra. Os dados foram confirmados pelo Copernicus, programa de observação da terra da União Europeia.

As causas dos dramáticos incêndios que destroem os biomas brasileiros são em primeiro lugar as mudanças climáticas que tornam a floresta mais inflamável, especialmente nas bordas próximas a áreas desmatadas. O desmatamento que fragmenta a floresta cria áreas mais suscetíveis à propagação do fogo. Um relatório da ONU acusa que, diferentemente de outras regiões como a Califórnia ou a Austrália, os incêndios na Amazônia não são um fenômeno natural do ecossistema, mas sim resultado direto da ação humana para transformação da paisagem.

Não está tão distante a paisagem de um planeta árido e desértico. A seca, que era um fenômeno típico nos países do Sul europeu, alastra-se hoje para o Centro e o Norte, países nórdicos e do Leste do continente. Aponta-se um crescente déficit de umidade no solo mesmo quando chove.

Em todos os encontros oficiais para tratar do clima, nos editoriais da imprensa, em todas as discussões sobre o assunto e mesmo diante da opinião pública internacional, o Brasil durante o governo Bolsonaro foi condenado como um grande vilão, um dos maiores responsáveis pela ameaça à vida no planeta. A Europa ameaçou rejeitar o acordo comercial com o Mercosul, que levou mais de vinte anos de negociações, por causa da posição do Brasil diante dos problemas do meio ambiente. A condenação tem como causa não apenas a destruição das florestas, dos rios e dos pântanos criadores, mas também pela indecente posição do governo de extrema-direita no Brasil diante de um problema que o mundo inteiro considera muito grave porque se refere à própria sobrevivência das espécies, entre elas a humana. Desde a posse do Governo Lula, respira-se uma atmosfera de distensão nos foros internacionais.

Em 2019, na Cimeira do Clima, realizada em Madrid o Brasil bloqueou a edição do documento final com as resoluções do encontro, que só foi publicado após longa discussão. Os representantes brasileiros, liderados pelo então Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, recusavam-se a aceitar parágrafos que falavam do uso da terra e da poluição dos oceanos. Tiveram de ser pressionados pelos outros países presentes para finalmente assinarem o documento.

Os negacionistas, aqueles mesmos que creem na terra plana, que são contra as vacinas e alinham-se à extrema-direita política, negam as ameaças climáticas.
 

As horas que faltam

Em Nova Iorque existe um relógio (https://climateclock.net/). Que exibe uma contagem decrescente e avisa quanto tempo resta para o ponto de não retorno, quando de nada adiantará qualquer esforço para evitar a destruição do mundo tal como a humanidade o conheceu até agora. Pois talvez não exista mais a humanidade.

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O relógio da Union Square mostra o tempo que resta ao planeta. Se forem mantidas as emissões de carbono nos níveis de hoje, dentro de poucos anos a temperatura vai subir 1,5 graus Celsius e tornará insustentável a vida na Terra. A ONU declara que as alterações climáticas representam uma emergência sem precedentes. Nunca a destruição foi tão rápida e a comunidade internacional está falhando no combate a essa crise. Os últimos cinco anos foram os mais quentes de toda a lembrança humana e a temperatura média aumentou quase 1 por cento. A Organização Mundial de Meteorologia – OMM – acredita que, na trajetória atual, o mundo caminha para um aumento de temperatura de 3 a 5 graus Celsius até o final do século.

Gan Golan e Andrew Boyd, responsáveis pelo relógio do fim do mundo, pretendem reproduzi-lo nas principais cidades do mundo porque a humanidade não deve esquecer a ameaça sob a qual está vivendo. Eles dizem que o tempo marcado não significa o prazo para fazer alguma coisa. Pelo contrário, diz que a ação deve ser imediata pois as alterações climáticas já estão presentes.

O degelo

A Expedição Mosaic, que explorou o Ártico durante 389 dias a bordo do quebra-gelo alemão Polarstern, defrontou-se com a surpresa de muito pouco gelo no Polo Norte. O líder da expedição, Markus Rex, disse que “se as alterações climáticas continuarem como estão, em algumas décadas teremos um Ártico sem gelo no verão”. E acrescentou que viu apenas uma calota derretida, fina, com lagos a perder de vista. Voltou com uma certeza: “o Ártico está dez graus mais quente que há vinte e cinco anos”.

Já Antje Boetius, diretor do instituto alemão Alfred-Wegener, que coordenou a expedição, disse que a placa de gelo polar tem metade da espessura que tinha há 40 anos.

O Conselho de Direitos Humanos da ONU publicou seu relatório destacando que os países mais pobres serão os mais afetados pela fome e pelas doenças que se intensificarão com as mudanças climáticas.

O Acordo de Paris, um protocolo em que 194 países se comprometem a reduzir a emissão de gases poluentes, foi assinado em 2015 e esteve sob ameaça de fracasso quando o segundo maior emissor de gases poluentes, os Estados Unidos, responsáveis por quase 18% da poluição mundial, retiraram sua assinatura em 2020, no governo Trump, mas voltaram em 2021.

A ONU declara que as alterações climáticas representam uma emergência sem precedentes. Nunca a destruição foi tão rápida e a comunidade internacional está falhando no combate a essa crise. Os últimos cinco anos foram os mais quentes de toda a lembrança humana e a temperatura média aumentou quase 1 por cento. A Organização Mundial de Meteorologia – OMM – acredita que, na trajetória atual, o mundo caminha para um aumento de temperatura de 3 a 5 graus Celsius até o final do século. E a humanidade terá de procurar outro planeta para onde se mudar.

 O tempo se esgota para a possibilidade de vida na Terra.


FOTO DE CAPA: Brasília (DF), 16/09/2024 – Grandes focos de incêndio atingem áreas do Parque Nacional de Brasília. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.

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