Fome e furacões ameaçam o Haiti em crise humanitária

Por Correspondente da IPS
NAÇÕES UNIDAS – O Haiti enfrenta extrema vulnerabilidade durante a temporada de furacões no Caribe, que começou em 1º de junho. Com metade de seus habitantes já sofrendo com a fome, uma única tempestade pode mergulhar milhões de pessoas em uma catástrofe humanitária, alertam agências das Nações Unidas.
Lola Castro, diretora do Programa Mundial de Alimentos (PMA), destaca que mais de 5,7 milhões de haitianos, em um país de 11,5 milhões de habitantes, passam fome e precisam de assistência urgente. Desse total, pelo menos 8.400 pessoas se encontram em níveis catastróficos, correndo risco de inanição.
“A situação no Haiti é dramática e devastadora, especialmente porque acontece no hemisfério ocidental, onde não deveria existir essa magnitude de fome e violência”, afirma Castro.
A violência protagonizada por gangues armadas que controlam grande parte de Porto Príncipe – a capital – e regiões do interior nesse território de 28 mil quilômetros quadrados aumenta o grau de perigo que representam os riscos de catástrofe associados à fome e aos furacões.
Mais de 5.600 pessoas foram assassinadas em 2024, outras 1.600 apenas nos três primeiros meses de 2025 – incluindo massacres indiscriminados com dezenas de vítimas em pequenos povoados – e mais de um milhão de pessoas fugiu de suas casas devido à violência e à impossibilidade de acessar serviços essenciais.
Enquanto a situação humanitária se deteriora pela insuficiente ajuda internacional, o Haiti enfrenta o alerta da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), segundo a qual se espera que a temporada de furacões de 2025 esteja muito acima da média em termos de intensidade das tempestades.
Castro explica que o PMA sempre teve recursos no terreno para ajudar entre 250 mil e 500 mil pessoas imediatamente após um desastre, mas “este ano não conseguiu posicionar previamente reservas de alimentos no Haiti nem o dinheiro necessário para uma resposta rápida em caso de furacão ou fenômeno meteorológico extremo”.
Um ponto crítico são as pessoas deslocadas devido à insegurança: mais de 200 mil vivem em acampamentos, número que quase dobrou entre março e abril, principalmente devido à violência armada no departamento Central.
A maioria desses locais está situada em áreas propensas a inundações e não possui abrigo, drenagem e saneamento adequados, o que torna as famílias extremamente vulneráveis às tempestades.
O Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) alertou sobre a chegada contínua de deslocados nos departamentos Central e Oeste (onde fica Porto Príncipe), agravando as precárias condições de segurança, alimentação, saúde e educação, já que cerca de 1.600 escolas fecharam.
O OCHA trabalha no mapeamento dos locais de deslocamento de alto risco, fortalecimento dos sistemas de alerta precoce, posicionamento prévio das reservas disponíveis e coordenação para enfrentar as deficiências críticas.
No entanto, o financiamento continua sendo um obstáculo fundamental, porque o Plano de Ação Humanitária mantido pelas agências da ONU, de 908 milhões de dólares, está financiado em apenas 8%, ou seja, 72 milhões de dólares.
No PMA, “temos reservas e dinheiro para apoiar as populações afetadas pela crise apenas até julho. E a grave falta de financiamento ameaça a continuidade de programas essenciais, como o de merenda escolar”, diz Castro.
“Se não recebermos fundos adicionais, seremos obrigados a reduzir pela metade o número de crianças que recebem almoços escolares, aproximadamente meio milhão”, ressalta a responsável pelo PMA.
A diretora destaca que o PMA compra seus alimentos de pequenos produtores locais, tanto homens quanto mulheres, que ainda conseguem cultivar em certas áreas rurais.
“Isso ajuda a reduzir a insegurança alimentar, fortalece a economia local e contribui para que as famílias possam continuar sendo autossuficientes”, explica Castro.
Mas ela também observa que muitas áreas agrícolas que antes produziam alimentos foram devastadas pela violência, fazendo com que a população dessas regiões dependa hoje da ajuda alimentar para sobreviver.
“Não queremos competir com ninguém, sabemos que há crises no mundo todo e que os doadores precisam distribuir seus recursos, mas pedimos que o Haiti não seja esquecido. Esta população precisa de alimentos, água potável e serviços de saneamento para evitar uma catástrofe humanitária ainda maior”, acrescenta Castro.
O PMA indica que precisa de 46 milhões de dólares para ajudar metade dos haitianos que sofrem com a fome durante os próximos seis meses, ou pelo menos 20 milhões para emergências e proteção social aos grupos mais vulneráveis.
*Imagem em destaque: Um acampamento de pessoas deslocadas pela violência no Haiti. Há mais de 200 mil em acampamentos como este, fugindo da violência desencadeada por gangues criminosas, e estão entre os grupos mais vulneráveis diante da possibilidade de que um ou vários furacões atinjam este ano esse país onde já padecem de fome vários milhões de seus habitantes. Crédito: Antoine Lemounnier / OIM
Publicado originalmente em IPS – Inter Press Service

Jornalismo e comunicação para a mudança global
