A esquerda diante da extrema direita na Europa

A esquerda diante da extrema direita na Europa

Paraenfrentar o avanço da extrema direita, a esquerda precisaria desenvolver umacapacidade renovada de abordar os desafios contemporâneos e apresentar umnovo projeto de sociedade que esteja alinhado com as demandas do séculoXXI.

A extrema direita tem avançado nos países da Europa de uma forma que
muitos consideram avassaladora. É a onda marrom, como foi chamada. As
últimas eleições legislativas foram uma advertência para a ameaça que
significou o crescimento de partidos neonazistas, neofascistas e reacionários
em geral. Seus apelos de ação contra o que chamam “sistema”, contra a
imigração e contra a própria União Europeia têm conquistado o apoio eleitoral
de uma classe média perplexa, insegura e atônita pela vivência de uma crise
que se arrasta no tempo. O que já foi diagnosticado como a crise do modelo
capitalista e a organização da sociedade por ele determinada.
Os movimentos de esquerda têm procurado estabelecer estratégias para o
enfrentamento com a formação de coalizões e frentes unidas. Na França, nas
últimas eleições, uma frente popular uniu as organizações de esquerda e foi
bem-sucedida num panorama em que despontava uma quase certa vitória do
partido de Marine Le Pen. No Reino Unido, o Partido Trabalhista adotou uma
abordagem moderada com um candidato pragmático e uma plataforma de
propostas para enfrentar problemas reais da população. E foi igualmente bem-
sucedido.
Líderes de centro-esquerda, como Rolf Mützenich na Alemanha, alertam que a
própria democracia está em risco.
Há reconhecimento da necessidade de enfrentar as causas do sucesso da
extrema direita, entre elas as questões econômicas e as preocupações com a
imigração.
Partidos como a Aliança de Esquerda, na Finlândia, o Partido Popular Socialista
na Dinamarca e o Partido de Esquerda na Suécia têm se destacado como
alternativas à extrema direita.
Plataformas
Há esforços para manter a grande coalizão entre partidos populares, socialistas
e liberais que já governaram a União Europeia, em oposição a alianças com
partidos de extrema direita. Partidos de esquerda, como o La France
Insoumise, estão defendendo plataformas de cunho social, rejeitando medidas
de austeridade e políticas xenófobas e antiecológicas. Os partidos de centro-
esquerda passaram a se posicionar firmemente contra os valores da extrema-
direita, como a glorificação da violência, xenofobia, homofobia e
ultranacionalismo. Há um esforço para denunciar o populismo de direita em
todas as suas formas, seja no campo político, laboral ou cultural.
Os partidos de centro-esquerda e de esquerda defendem a implementação de
programas nas áreas de educação, mídia, saúde mental e apoio às famílias,
visando prevenir a radicalização e desradicalizar indivíduos já envolvidos em
movimentos extremistas. Buscam o fortalecimento de iniciativas como a Rede
de Conscientização sobre Radicalização (RAN) da União Europeia, que permite
a troca de experiências e práticas bem-sucedidas entre diferentes países.
Investem no financiamento de centros de pesquisa especializados no estudo
do extremismo, como o Centro para Pesquisa do Extremismo na Universidade
de Oslo, para melhor compreender e prevenir o fenômeno.
Alemanha
A Alemanha está enfrentando o crescimento da extrema-direita,
principalmente representada pelo partido Alternativa para a Alemanha (AfD),
através de várias estratégias. Os partidos tradicionais mantêm uma política de
não-cooperação com a AfD, recusando-se a formar coalizões ou acordos com o
partido de extrema-direita. Após revelações sobre reuniões secretas da AfD
com figuras neonazistas, ocorreram protestos massivos em toda a Alemanha,
pedindo a proibição do partido. A AfD foi expulsa do grupo de extrema-direita
Identidade e Democracia no Parlamento Europeu, em resposta a escândalos
recentes e o governo alemão adotou leis mais rígidas sobre porte de armas e
controles mais apertados para requerentes de asilo, em resposta a ataques
terroristas.
Há na Alemanha um esforço para alertar sobre os perigos da normalização de
mensagens extremistas na sociedade. Especialistas e acadêmicos estão
estudando o fenômeno do crescimento da extrema-direita para melhor
compreendê-lo e combatê-lo.
Apesar desses esforços, a AfD continua a ganhar força em algumas regiões,
especialmente na Alemanha Oriental, onde chegou a vencer eleições
estaduais. Isso tem gerado preocupações sobre a eficácia das estratégias atuais
e debates sobre como lidar com um partido que, embora extremista, tem
conquistado apoio entre os eleitores.
A AfD, fundada por antigos oficiais nazistas e se diferencia de outros partidos
de extrema direita na Europa pelo seu grau de radicalismo. É o mais extremista
entre todos os partidos de extrema-direita na Europa e foi expulsa do grupo
Identidade e Democracia no Parlamento Europeu devido a escândalos e
posições extremistas. O partido agora faz parte de um novo grupo chamado
Europa das Nações Soberanas, considerado ainda mais à direita do que outros
grupos de extrema-direita no Parlamento Europeu.
A AfD tem sido protagonista de múltiplos escândalos envolvendo a presença
de negacionistas do Holocausto, racistas e outros extremistas nas fileiras do
partido. Andreas Kalbitz, ex-líder estadual, foi expulso devido a antigas ligações
com um movimento juvenil neonazista e Christian Lüth, ex-porta-voz, foi
desligado após sugerir que imigrantes deveriam ser mortos “com tiros ou gás”.
Maximilian Krah, principal candidato às eleições europeias, fez declarações
polêmicas que levaram à sua demissão da comissão executiva federal do
partido. Jian Guo, assistente de Krah, foi detido por suspeita de ser “um
empregado dos serviços secretos chineses”. Petr Bystron, segundo nome na
lista do AfD, foi acusado de aceitar mais de 20 mil euros de uma agência de
influência apoiada por Moscou e Siegbert Droese posou em frente ao bunker
de Hitler e fez campanha com um carro com placa alusiva ao líder nazista.
Em Portugal
Em Portugal, onde o partido Chega tem se fortalecido e hoje é a terceira força
eleitoral do país, os partidos de esquerda (Partido Socialista (PS), (Bloco de
Esquerda (BE), Partido Comunista Português (PCP) Partido Ecologista “Os
Verdes”(PEV) e Livre (L), discutem estabelecer uma frente única e procuram
demarcar-se clara e constantemente da extrema-direita, reafirmando os
valores democráticos e progressistas. Denunciam o populismo em todas as
suas formas e recusam estratégias políticas que estigmatizam o diálogo entre
correntes centristas. Procura também focar na integridade moral e política,
combatendo ofensas à lei e desvios éticos no serviço público.
Tem havido debates internos para reavaliar estratégias políticas, como a
conferência nacional do Bloco de Esquerda para discutir as eleições
autárquicas e o crescimento da extrema-direita, procurando manter a unidade
entre as forças de esquerda e dificultar as manobras extremistas de direita.
Comentaristas assinalam que a esquerda atualmente não possui um projeto
alternativo bem definido que ofereça uma visão convincente para a construção
de uma nova ordem social ou reformas profundas no modelo atual. Para
enfrentar o avanço da extrema direita, a esquerda precisaria desenvolver uma
capacidade renovada de abordar os desafios contemporâneos e apresentar um
novo projeto de sociedade que esteja alinhado com as demandas do século
XXI.

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