Revisitando o cenário das guerras
As intermitentes guerras na Europa têm invariavelmente afetado não só todo o continente, mas tambémo mundo. Desde o início do Século 20 os conflitos mudaram a configuração dos territórios, trazendo inquietação e desencadeado as tragédias. Hoje, em dramática repetição da História, respira-se de novo na Europa um clima anunciando o flagelo de uma nova guerra.
A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) marcou o início de uma era de conflitos em larga escala na Europa. Foi um conflito sem precedentes e envolveu as principais potências europeias, resultou em milhões de mortos, destruição generalizada e mudanças geopolíticas. Foi uma guerra excepcionalmente letal e introduziu novas tecnologias militares como os gases venenosos, a aviação e novas armas arrasadoras.
O período entre guerras (1918-1939) foi marcado por tensões políticas e econômicas que só fizeram abrir caminho para novos conflitos. A ascensão de regimes totalitários como o nazismo na Alemanha e o fascismo na Itália criou as condições para a próxima grande guerra, que foi afinal uma continuação da primeira.
A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) eclodiu quando a Alemanha nazista invadiu a Polônia em 1º de setembro de 1939. Foi um conflito global que teve seu epicentro na Europa. A Alemanha conquistou rapidamente grande parte do continente com a sua estratégia de Blitzkrieg. A guerra causou destruição sem precedentes, incluindo o Holocausto, e terminou com o uso de armas nucleares pelos EUA contra o Japão.
A Guerra Fria
Após 1945, a Europa ficou dividida pela Guerra Fria entre o bloco capitalista liderado pelos EUA e o bloco comunista liderado pela União Soviética. Embora não tenha havido confrontos diretos em solo europeu, a tensão constante e a ameaça nuclear definiram toda essa época. A construção do Muro de Berlim em 1961 simbolizou esta divisão.
O fim da Guerra Fria em 1991 não significou o fim dos conflitos na Europa. A dissolução da Iugoslávia nos anos 1990 levou a uma série de guerras sangrentas nos Bálcãs. Mais recentemente, a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014 e a invasão da Ucrânia em 2022 demonstraram que as tensões geopolíticas e os conflitos armados continuam presentes no continente europeu.
Essas guerras transformaram profundamente a paisagem política, social e econômica da Europa. Levaram à criação de instituições internacionais como a ONU e a União Europeia, em busca de promover a paz e a cooperação.
A Guerra Fria teve um impacto profundo e moldou as relações entre os países e a estrutura do continente por décadas.
A Europa ficou dividida em dois blocos antagônicos – o Ocidente capitalista alinhado aos EUA e o Leste comunista sob influência soviética. Esta polarização foi simbolizada pela denominada “Cortina de Ferro”.
A OTAN foi criada pelos países ocidentais para se contrapor à influência soviética, enquanto o Pacto de Varsóvia reuniu os países do Leste Europeu sob liderança da URSS.
A Alemanha foi dividida em Alemanha Ocidental (capitalista) e Oriental (comunista). Berlim também foi repartida, com a construção do Muro de Berlim em 1961 como símbolo máximo dessa divisão.
Os países da Europa Ocidental buscaram maior cooperação econômica e política, o que levou à formação da União Europeia como contraponto ao bloco soviético enquanto a URSS estabelecia governos a ela alinhados nos países do Leste Europeu que havia ocupado ao final da Segunda Guerra Mundial.
Tanto o bloco ocidental quanto o oriental investiram pesadamente em armamentos, especialmente nucleares, gerando um clima de tensão constante.
As duas superpotências buscavam influenciar as políticas domésticas dos países europeus, apoiando partidos e movimentos alinhados e a rivalidade entre os blocos estimulou avanços na exploração espacial e no desenvolvimento de novas tecnologias.
A Guerra Fria redefiniu completamente o cenário político europeu até o colapso da União Soviética em 1991. O legado desse período continua a influenciar as relações entre os países e a organização política do continente.
As estratégias
Durante a Guerra Fria, os Estados Unidos e a União Soviética adotaram diversas estratégias para expandir e manter sua influência na Europa. O continente foi dividido em dois blocos antagônicos e foram formadas as alianças militares.
Os EUA promoveram a criação da OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) em 1949 para unir militarmente os países ocidentais e URSS respondeu com o Pacto de Varsóvia em 1955, reunindo os países do Leste Europeu sob sua liderança. A Alemanha foi dividida em Alemanha Ocidental (capitalista) e Oriental (comunista). A construção do Muro de Berlim em 1961 pela URSS simbolizou essa divisão. Os EUA promoveram a integração econômica da Europa Ocidental, que veio a originar a formação da União Europeia enquanto a URSS criava o Comecon (Conselho para Assistência Econômica Mútua) para integrar economicamente o bloco socialista.
Ambos os lados investiram pesadamente em armamentos, especialmente nucleares, trazendo ao mundo um clima de tensão constante.
As duas superpotências buscavam influenciar as políticas domésticas dos países europeus, apoiando partidos e movimentos alinhados às respectivas ideologias. Os EUA adotaram a política de “contenção” do comunismo, buscando impedir sua expansão na Europa e em outras partes do mundo. A URSS, especialmente após Stalin, adotou uma política de coexistência pacífica, evitando confrontos diretos com o Ocidente. Ambos os lados utilizaram intensamente a propaganda ideológica e desacreditar o adversário.
As ameaças
A invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022 é vista pelos governos europeus como a maior ameaça de uma nova guerra generalizada. Há receio de que a Rússia possa tentar “recriar o império soviético” e teme-se a redução do apoio dos EUA. Vários líderes alertam que o continente não está adequadamente preparado para um conflito em larga escala.
Há uma crescente percepção de que a Europa está entrando em uma “era pré-guerra”, com governos como o do primeiro-ministro polonês Donald Tusk alertando que “literalmente qualquer cenário é possível”. Muitos países estão aumentando seus gastos militares e reintroduzindo o serviço militar obrigatório. O cenário atual é comparado a períodos históricos de grande instabilidade, como os momentos que antecederam a Segunda Guerra Mundial.
Essas ameaças têm levado a uma mudança significativa na política de defesa da Europa. Muitos países reconsideram estratégias militares e de segurança para enfrentar possíveis conflitos.
Várias nações, especialmente na Escandinávia e nos Bálcãs, reintroduziram ou expandiram o serviço militar obrigatório para reforçar as defesas e preparar a mobilização de milhões de pessoas para a eventualidade de um conflito armado.
O general americano Wesley Clark, ex-Comandante Supremo da OTAN, enfatizou a necessidade de ajustar a forma como os países europeus mobilizam recursos para a guerra, incluindo a produção de equipamentos militares e o recrutamento e treinamento de pessoal com a reintrodução do alistamento obrigatório.
O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orbán, acusou a União Europeia e a OTAN de estarem a preparar a Europa para um conflito armado criando uma atmosfera de preparação para a guerra.
*Imagem em destaque: Flickr/Manhhai
Poeta, articulista, jornalista e publicitário. Traballhou no Diário de Minas como repórter, na Última Hora como chefe de reportagem e no Correio de Minas como Chefe de Redação antes de se transferir para a publicidade, área em que se dedicou ao planejamento e criação de campanhas publicitárias. Colaborou com artigos em Carta Maior e atualmente em Fórum 21. Mora hoje no Porto, Portugal.
É autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).