Milhões de pessoas morrerão por HIV/Aids sem a ajuda dos EUA

Por Correspondente da IPS
GENEBRA – Cerca de seis milhões de pessoas provavelmente morrerão vítimas de HIV/Aids nos próximos quatro anos com o fim dos programas de combate à doença mantidos pelos Estados Unidos, alertou o Unaids nesta segunda-feira, 24.
“Veremos um aumento real desta doença, voltaremos a ver pessoas morrendo da mesma forma que nos anos 90 e 2000”, disse Winnie Byanyima, diretora executiva do Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/Aids (Unaids).
Byanyima disse a jornalistas nesta cidade suíça que pode haver “um aumento de 10 vezes” em relação às 600.000 mortes relacionadas à Aids registradas no mundo em 2023.
“Também esperamos 8,7 milhões de novas infecções adicionais. Na última contagem, em 2023, havia 1,3 milhão de novas infecções em todo o mundo”, acrescentou.
Byanyima destacou que o congelamento do financiamento anunciado pela Casa Branca em 20 de janeiro deveria terminar no mês que vem, após uma revisão de 90 dias, e “não temos notícias de que outros governos tenham se comprometido a cobrir o déficit”.
Os Estados Unidos têm sido o maior contribuinte para as campanhas e programas do Unaids, inclusive com mais de 5 bilhões de dólares anuais e um total de 110 bilhões no período 2003-2023, segundo dados de sua Agência para o Desenvolvimento Internacional (Usaid).
Após esse país, e com contribuições entre 150 e 600 milhões de dólares anuais, estiveram o Reino Unido, França, Países Baixos e Alemanha. Os recursos foram direcionados prioritariamente para os 55 países em desenvolvimento mais afetados pelo HIV/Aids, muitos deles no continente africano.
O novo governo americano, liderado pelo republicano Donald Trump, congelou a maior parte da ajuda externa e determinou uma reestruturação ou eliminação de várias agências e departamentos governamentais, entre eles a Usaid.
Na América Latina e no Caribe, estão sendo afetados programas de prevenção e atenção ao HIV, de profilaxia pré-exposição, de transmissão materno-infantil, de atenção à violência de gênero e de abordagem ao estigma e à discriminação.
Em todas as regiões do Sul em desenvolvimento, mas particularmente na África, “essa repentina retirada do financiamento americano provocou o fechamento de muitas clínicas e a demissão de milhares de trabalhadores da saúde: enfermeiras, médicos, técnicos de laboratório, farmacêuticos. São muitos”, lamentou Byanyima.
Os centros de acolhimento onde os pacientes de HIV podem retirar os medicamentos antirretrovirais que precisam “já não estão reabrindo, por medo de que isso não seja consistente com as novas diretrizes”, acrescentou.
Byanyima lembrou que o leste e o sul da África representam 53% da carga mundial do HIV, e alertou que “fechar repentinamente os centros de acolhimento para meninas e mulheres jovens será desastroso, porque nelas ocorrem mais de 60% das novas infecções entre jovens no continente”.
Várias outras agências da ONU que dependem em grande parte do financiamento americano também advertiram que o corte da ajuda – além da falta crônica de investimento em trabalhos humanitários em nível mundial – já está tendo um grave impacto nas comunidades às quais servem.
Em 21 de março, a Agência das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) declarou que milhares de pessoas ficaram sem ajuda vital no leste da República Democrática do Congo, devastado pela guerra.
A Organização Internacional para as Migrações (OIM) também anunciou que os cortes de financiamento têm graves repercussões para as comunidades migrantes vulneráveis, agravando as crises humanitárias e enfraquecendo os sistemas de apoio essenciais para as populações deslocadas.
E o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) alertou que a falta de liquidez colocou em perigo o trabalho de salvar vidas, incluindo os avanços na redução da mortalidade infantil, que diminuiu 60% desde 1990.
“É razoável que os Estados Unidos queiram reduzir seu financiamento, com o tempo. Mas a retirada repentina da ajuda para salvar vidas está tendo um impacto devastador em todos os países, especialmente na África, mas também na Ásia e na América Latina. Pedimos uma reconsideração”, disse Byanyima.
Em um apelo direto ao presidente Trump, ela destacou que o novo titular da Casa Branca poderia fazer parte da “revolução da prevenção”, injeções contra o HIV que são necessárias apenas duas vezes ao ano para fornecer proteção.
“Trata-se de permitir que uma empresa americana possa produzir e conceder licenças de genéricos em todas as regiões para produzir milhões e estender este injetável a quem realmente precisa”, comentou finalmente.
*Imagem em destaque: Mulher mostra um teste de HIV com resultado negativo em um centro de saúde da cidade de Moutarwa, em Uganda (Frank Dejong / Unicef)
**Publicado originalmente em IPS – Inter Press Service | Versão e revisão: Marcos Diniz

Jornalismo e comunicação para a mudança global