‘Pessoas em Gaza são cadáveres ambulantes’

Mais de cem pessoas morreram devido à desnutrição generalizada, que também afeta médicos e trabalhadores humanitários responsáveis por salvar vidas, enquanto milhares de caminhões carregados com suprimentos aguardam autorização de Israel para entrar no território palestino. (Imagem: UNRWA)
CORRESPONDENTE IPS
AMÃ – Um em cada cinco crianças está desnutrido na cidade de Gaza como consequência da ofensiva militar e do bloqueio impostos pelo exército de Israel, e os casos aumentam a cada dia, denunciou a Agência das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA).
“As pessoas em Gaza não estão vivas nem mortas, são cadáveres ambulantes”, escreveu Philippe Lazzarini, comissário-geral da UNRWA, em sua conta na rede social X, relatando a mensagem de um trabalhador em campo.
Ele alertou que a maioria das crianças que suas equipes veem estão esqueléticas, fracas e correm alto risco de morrer se não receberem tratamento urgente.
Segundo relatos, mais de 100 pessoas, a grande maioria crianças, morreram de fome nas últimas semanas.
Por sua vez, o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA) denunciou que em toda a Faixa de Gaza “mais de um milhão de crianças sofrem as consequências de uma fome e desnutrição cada vez mais graves”, e os casos de morte por desnutrição aumentam dia após dia.
De acordo com o OCHA, nas duas primeiras semanas de julho, 9% das crianças examinadas sofriam de desnutrição aguda grave nas províncias de Gaza, Deir al-Balah e Khan Yunis, contra 6% em junho e 2% em fevereiro.
A prevalência na cidade de Gaza, no norte dessa faixa de 365 quilômetros quadrados, é ainda mais alarmante, chegando a 16%, em comparação com 4% em fevereiro.
“Os que sobrevivem enfrentam riscos graves que alteram suas vidas, como atrasos no desenvolvimento cognitivo e físico”, alertou um relatório do OCHA.
Lazzarini destacou que essa situação “cada vez mais grave afeta a todos, inclusive aqueles que tentam salvar vidas”.
Assim, os trabalhadores de saúde da UNRWA na linha de frente “sobrevivem com uma pequena refeição por dia, muitas vezes apenas lentilhas, quando têm sorte”.
“Cada vez mais, eles desmaiam de fome enquanto trabalham”, colocando em risco todo o sistema humanitário, advertiu.
Quanto às famílias, ele alertou que “os pais estão com tanta fome que não conseguem cuidar de seus filhos”, e aqueles que chegam às clínicas da UNRWA não têm energia, comida ou meios para seguir os conselhos médicos.
“As famílias não aguentam mais, estão desmoronando, incapazes de sobreviver. Sua existência está ameaçada”, enfatizou Lazzarini.
O comissário afirmou que, em contraste, a UNRWA e outras agências da ONU têm o equivalente a 6.000 caminhões carregados de alimentos e suprimentos médicos em dois países vizinhos, Egito e Jordânia, prontos para entrar na Faixa de Gaza e auxiliar mais de dois milhões de pessoas submetidas a 21 meses de guerra e privações.
Por outro lado, mais de 100 organizações internacionais de ajuda humanitária e direitos humanos publicaram um comunicado alertando que a população na Faixa de Gaza e seus trabalhadores em campo “estão sendo consumidos pela propagação de uma fome em massa” no território palestino.
Entre essas organizações estão a Cáritas, Médicos Sem Fronteiras, Anistia Internacional, Oxfam e Save the Children.
Quase mil gazanos morreram desde fevereiro ao buscarem comida nos pontos de distribuição da Fundação Humanitária de Gaza, estabelecida por Israel e Estados Unidos e atualmente a única autorizada a distribuir alimentos à população.
O OCHA informou que as forças israelenses continuam seus intensos bombardeios aéreos, terrestres e marítimos em toda a Faixa de Gaza na última semana. Além disso, emitiram novas ordens de deslocamento e expandiram ainda mais as operações terrestres.
Em 20 de julho, o exército israelense emitiu uma ordem de deslocamento para as áreas a oeste de Deir al-Balah e alertou a população para não retornar ao norte de Gaza, que, segundo eles, agora são zonas de combate ativo.
Também houve lançamentos de foguetes contra Israel por parte de grupos armados palestinos e confrontos com as forças israelenses.
Segundo o Ministério da Saúde de Gaza, entre 16 e 23 de julho, 646 palestinos morreram e 3.438 ficaram feridos. Desde outubro de 2023, pelo menos 59.219 palestinos morreram e 143.045 ficaram feridos, de acordo com a mesma fonte.
O conflito atual eclodiu após o ataque do grupo islâmico Hamas, sediado em Gaza, ao sul de Israel, onde cerca de 1.200 pessoas morreram e 250 foram feitas reféns, levando Israel a responder com sua ofensiva militar.

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