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Individualmente sábio e coletivamente burro

Individualmente sábio e coletivamente burro

James Surowiecki, autor do livro “The Wisdom of Crowds“, publicado no ano 2004, defende a independência ser importante para tomar decisões inteligentes por dois motivos.

Primeiro, evita a correlação de erros cometidos por pessoas. Os erros individuais não prejudicam o julgamento coletivo do grupo, exceto quando todos os erros apontam sistematicamente na mesma direção. Uma das maneiras mais rápidas de distorcer a opinião do grupo, em uma determinada direção, é tornar os seus membros dependentes uns dos outros para obter informações.

Em segundo lugar, é mais provável indivíduos independentes fornecerem novos dados, em vez de repetir informações já conhecidas de todos. Os grupos mais inteligentes, portanto, são aqueles formados por sujeitos com perspectivas diferentes e capazes de permanecer independentes uns dos outros.

No entanto, independência não implica imparcialidade ou racionalidade. Alguém tendencioso e irracional, enquanto permanecer independente, não prejudicará a inteligência do grupo.

Esta suposição de independência dá como certa a autonomia do indivíduo, a ideia central do liberalismo ocidental. É também a referência da maioria dos manuais de teoria económica, sob o nome habitual de “individualismo metodológico”.

O economista geralmente considera axiomático os indivíduos serem motivados por interesses egoístas. Pressupõe cada pessoa desenvolver por si a noção de qual é o seu interesse particular.

Somos seres autônomos, mas também somos seres sociais. Precisamos aprender uns com os outros. A aprendizagem, em si, é um processo social.

Os ambientes onde vivemos, onde estudamos e onde trabalhamos moldam a nossa forma de sentir e pensar. Ao permanecer durante longo tempo exposto a certos fluxos de comunicação e isolado de outros, o indivíduo experimenta os efeitos mais profundos sobre o que conhece, acredita, espera, observa, deseja, atribui importância, teme e propõe.

Os economistas, embora reconheçam a natureza social da existência, preferem enfatizar a autonomia das pessoas e minimizar como os outros influenciam as nossas preferências e julgamentos. Em contraste, os sociólogos e os teóricos das redes sociais descrevem as pessoas como inseridas em determinados contextos sociais e sujeitas a influências inevitáveis. Não consideram isso um problema, porque a vida humana cotidiana é simplesmente organizada dessa forma.

Quanto mais influência os membros de um grupo tiverem uns sobre os outros, e quanto mais contato pessoal tiverem entre si, menor será a probabilidade de chegarem a decisões inteligentes como grupo. Quanto maior a influência mútua, maior a probabilidade de todos acreditarem no mesmo e cometerem erros iguais.

Logo, existe a possibilidade de alguém se tornar individualmente mais sábio, mas coletivamente mais burro. Portanto, a pergunta feita por Surowiecki ao refletir sobre a sabedoria coletiva é: as pessoas tomam decisões inteligentes mesmo quando estão em constante interação, embora aleatória, umas com as outras?

A ideia de “prova social” se refere à tendência de assumir como verdadeira a hipótese de quando muitas pessoas concordam em fazer algo ou acreditam em algo, certamente terem um bom motivo para fazê-lo. Não é conformismo.

Por exemplo, quem olha para o céu não o faz porque se submete à pressão do comportamento de manada, nem porque teme uma repreensão do grupo. Olha movido por suposição bastante racional: muitas pessoas não estariam olhando para cima se não houvesse nada para ver…

Por isso, a multidão se torna tanto mais influente quanto maior é. Cada seguidor adicionado é a prova de algo importante estar acontecendo.

A conclusão dominante parece ser, em condições de incerteza, é melhor fazer o feito pelos outros. Na verdade, não é uma conclusão totalmente irracional.

Afinal de contas, se o grupo muitas vezes sabe, experimentalmente, o que é melhor, então, a estratégia mais sensata é seguir o grupo. O ruim é quando todos obedecem a tal estratégia: aí ela deixa de ser sensata e o grupo deixa de ser inteligente. Por exemplo, seguir a tendência altista em uma bolha de ações.

Temos de estar atentos com o instinto de imitação, com a prova social e com as limitações da mentalidade de grupo. A tática conservadora é quase como um dogma básico, na ausência de provas incontestáveis ​​em contrário. É mais fácil para o indivíduo inventar explicações capazes de justificarem o que está sendo feito, em vez de tentar imaginar como poderia ser feito de forma diferente. Como ninguém mais está tentando, isso deve significar, simplesmente, não vale a pena tentar…

O fenômeno chamado de gregarismo é buscar a proteção do rebanho. Por exemplo, muitos gestores de investimentos profissionais acabam seguindo as mesmas estratégias e concordando com os mesmos valores, errando coletivamente. Afinal, esses gestores convenceram os investidores de serem capazes de obter retornos superiores aos do mercado. Mas a maioria deles não cumpre a promessa. Pastorear, sem dúvida, torna essa tarefa já difícil ainda mais difícil, pois os executivos imitam o comportamento dos seus concorrentes.

A rentabilidade em curto prazo é, na melhor das hipóteses, um indicador imperfeito da experiência do gestor. Em determinado período, os resultados de um gestor são significativamente melhores ou piores, dependendo de fatores sem nada a ver com a sua habilidade na seleção de ações ou na diversificação de riscos.

Pior, se alguém decidir desviar-se da norma e navegar contra a corrente, corre o risco de ser considerado dissidente ou incompetente. Se não der certo, será despedido… “A sabedoria comum ensina ser melhor, para a reputação, fracassar de maneira convencional em vez de ter sucesso de forma não convencional”.

“Informação em cascata” é um conceito para descrever como as decisões de um grupo são influenciadas pela ordem na qual são tomadas, levando potencialmente a decisões erradas, mesmo quando os indivíduos possuem informações capazes de sugerirem uma escolha diferente. Esse fenômeno ocorre quando as pessoas, em vez de confiarem em seu próprio julgamento (informação privada), baseiam suas decisões nas ações daqueles antecedentes.

As cascatas de informação levam a decisões ruins porque criam uma situação na qual a informação individual é ignorada em favor da conformidade. Embora as cascatas de informação sejam uma forma de agregar informação, elas diferem de métodos como votação ou via mercado, onde as decisões são tomadas simultaneamente. A natureza sequencial das cascatas de informação impede a sabedoria da multidão ser totalmente aproveitada.

O problema essencial da cascata de informação é, a partir de um certo ponto, a decisão mais racional para as pessoas é abandonar o sabido por elas próprias, e deixar de prestar atenção às suas informações privadas para imitarem o feito pelos outros. Pensam: se todos têm maior probabilidade de escolher corretamente e se todos os nossos antecessores escolheram a mesma coisa, então temos de fazer a mesma coisa feita pelos outros…

Quando cada indivíduo deixa de ouvir o seu próprio conhecimento, em vez de somar toda a informação disponível aos indivíduos, como fazem os mercados ou os sistemas de votação, a cascata torna-se uma sucessão de escolhas desinformadas. Então, coletivamente, o grupo acaba tomando uma decisão errada, como investir todo o dinheiro em seguir tendência.

A esperança é quanto maior for a importância de uma decisão, menor será a probabilidade de uma cascata de informação se estabelecer. Isso porque, em situações críticas, as pessoas tendem a confiar mais em seu próprio julgamento e a buscar informações adicionais, em vez de simplesmente seguir a multidão.

As decisões coletivas têm maior probabilidade de serem boas quando são tomadas por pessoas com opiniões diferentes com conclusões independentes, baseadas principalmente nas informações privadas das quais dispõem. Nenhuma dessas condições é atendida em cascatas.

Pior ainda é se a direção de uma cascata de informação é determinada por uma minoria de indivíduos influentes, seja porque estão à frente dos outros, seja porque possuem certas habilidades e se enquadram como “celebridades” ou “influenciadores”. Nesta situação, as pessoas não decidem de forma independente, mas são profundamente influenciadas e, em alguns casos, até determinadas por aqueles participantes de sua “bolha” ou “câmera de eco”.

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