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Ataques da extrema-direita, neoliberalismo e desilusão

Ataques da extrema-direita, neoliberalismo e desilusão

Nos últimos anos, a Europa tem sido palco de atos violentos praticados por grupos de extrema-direita. São incidentes caracterizados por ataques contra minorias, migrantes e opositores políticos. No Reino Unido, houve uma série de motins violentos após o ataque em Southport, onde três crianças foram esfaqueadas. A desinformação nas redes sociais, que apontou o agressor erroneamente como um muçulmano requerente de asilo, alimentou ainda mais a violência contra migrantes. Em Plymouth, os ataques resultaram em ferimentos a cidadãos e policiais e seis pessoas foram detidas. Os ataques foram inicialmente organizados pelos remanescentes da Liga de Defesa Inglesa (English Defence League), um grupo de hooligans de extrema-direita oficialmente desarticulado, mas ainda ativo e atuante.

O governo britânico reagiu com medidas de repressão, aumentando o número de policiais mobilizados para conter os motins e a proposta de endurecimento das penas para manifestantes violentos. O primeiro-ministro deu ênfase à necessidade de combater a desinformação veiculada pelas redes sociais que provoca e alimenta esses incidentes. Elon Musk, dono da plataforma X e um ativista de extrema-direita, publicou um post em que falava de guerra civil.

Em toda a Europa

A violência de extrema-direita não é um fenômeno isolado no Reino Unido. Em toda a Europa há um ressurgimento de movimentos neofascistas que promovem a violência contra minorias e migrantes. O Parlamento Europeu já discutiu a questão da violência neofascista, reconhecendo a ameaça que essas organizações representam para a coesão social e a segurança pública. O aumento da violência de extrema-direita levanta questões sobre a segurança dos migrantes e a estabilidade social. Especialistas como o sociólogo Leonardo Palmisano, da Universidade de Foggia, na Itália, destacam que a desilusão política e a manipulação de informações são fatores que alimentam a radicalização desses grupos. A resposta a esse desafio envolve não apenas medidas de segurança, mas também políticas que promovam a inclusão social e combatam a desinformação.

A violência da extrema-direita é impulsionada por uma combinação de fatores políticos, sociais e econômicos. No Reino Unido, a extrema-direita tem reagido violentamente à vitória de partidos de esquerda nas eleições, como há pouco aconteceu após o recente sucesso do Partido Trabalhista. Em várias partes da Europa, a morte política dos partidos de centro-esquerda criou um vácuo que a extrema-direita tem preenchido, apresentando-se como uma alternativa para eleitores desiludidos. A insegurança econômica, tornada pior pela pandemia, a guerra na Ucrânia e a inflação, tem levado muitos jovens a buscar soluções na extrema-direita, que promete empregos e estabilidade econômica. A situação é agravada pela percepção de que os governos não estão fornecendo a necessária segurança social. A chegada de refugiados e requerentes de asilo é vista como uma ameaça aos recursos limitados, o que alimenta a xenofobia e o racismo, pilares da plataforma da extrema-direita.

A Propaganda

A propaganda dos partidos da extrema-direita tem sabido manipular informações e criar lendas que demonizam imigrantes e minorias. Isso é evidente em incidentes como o ataque em Southport, onde informações falsas sobre o agressor alimentaram a violência. Muitos jovens europeus não têm memória dos regimes autoritários do passado recente, o que os torna mais suscetíveis à propaganda de extrema-direita que promete soluções rápidas e autoritárias para os problemas atuais. Partidos como o Alternativa para a Alemanha (AfD) e o Reagrupamento Nacional na França têm crescido. Esses partidos têm divergências entre si, mas compartilham uma agenda comum de mudança política reacionária e radical. Os conflitos em curso no mundo e o consequente aumento no fluxo de refugiados a requerer asilo intensificam a retórica e as ações da extrema-direita, que se opõe à imigração e utiliza essa realidade para fortalecer sua agenda.

As políticas neoliberais e o capitalismo financeiro, inspirados na Reaganomics, herança do governo Reagan nos Estados Unidos, têm gerado desigualdade econômica e criado um terreno fértil para o crescimento da extrema-direita. Muitos sentem que foram deixados para trás pelo progresso econômico, o que alimenta o descontentamento com os partidos tradicionais. A crise migratória de 2015, quando muitos países europeus abriram suas portas para os refugiados que chegavam em massa, gerou uma reação negativa em segmentos da população que veem os imigrantes como ameaça econômica e cultural, o que aumenta a popularidade dos partidos de extrema-direita e suas políticas anti-imigração.

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Identidade

A insatisfação com a globalização e a percepção de perda de identidade nacional têm levado muitos eleitores a apoiarem partidos que promovem o nacionalismo, o controle das fronteiras e o protecionismo econômico. Esses partidos frequentemente utilizam a tradicional retórica de “Deus, pátria e família” para atrair eleitores que se sentem desconectados das elites políticas. O euroceticismo, ou rejeição à União Europeia, é uma característica comum entre os partidos de extrema-direita. Eles criticam a interferência percebida da UE nas políticas nacionais e defendem uma maior soberania nacional, o que influencia eleitores que se sentem alienados pelas políticas centralizadas de Bruxelas.

O neoliberalismo econômico e seus mecanismos financeiros são fatores para o crescimento da extrema-direita. Na Suécia, cortes em políticas sociais têm sido associados ao aumento do apoio à extrema-direita. São cortes que deixam muitos cidadãos sem acesso a serviços essenciais, aumentam a sensação de abandono e alimentam o ressentimento contra o sistema político estabelecido. Após a crise financeira de 2007/08, muitos países europeus adotaram políticas de austeridade que resultaram em empobrecimento e desemprego para grandes segmentos da população. Foram medidas muitas vezes impostas por instituições internacionais que enfraqueceram as políticas sociais e aumentaram a desigualdade, criando um terreno fértil para o crescimento de movimentos reacionários e de extrema-direita.

As políticas neoliberais promovem a desregulamentação do mercado de trabalho, conduzindo a empregos mais precários e insegurança econômica. Isso provoca frustração entre os trabalhadores, que podem se voltar para a extrema-direita em busca de soluções. A privatização de serviços públicos essenciais, como é o exemplo da Saúde em alguns países, pode resultar em acesso desigual a esses serviços, aumentando a insatisfação entre os que se sentem abandonados pelo sistema econômico.

Desigualdade

O neoliberalismo tem aumentado a concentração da riqueza, com benefícios econômicos concentrados nas mãos de poucos. Isso gera a percepção de injustiça econômica e social, explorada por partidos de extrema-direita para mobilizar apoio. A ênfase na competição individual em detrimento da solidariedade e do bem-estar coletivo leva à fragmentação social, onde grupos vulneráveis são vistos como concorrentes em vez de membros da comunidade. Isso pode aumentar a xenofobia e o apoio a políticas nacionalistas.

As políticas neoliberais, ao exacerbarem desigualdades e inseguranças, criam um ambiente propício ao crescimento da extrema-direita, que se apresenta como uma alternativa ao status quo, prometendo restaurar a ordem e proteger os interesses nacionais contra elites percebidas como corruptas e ineficazes. Os dogmas do neoliberalismo, bem conhecidos dos leitores de jornais brasileiros, que fazem deles permanente defesa, incluem cortes em gastos sociais, austeridade econômica com seus cortes nos serviços públicos, desregulação econômica, privatizações, precarização do trabalho, concentração e desigualdade de renda.

*Imagem em destaque: Ted Eytan/Reprodução

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