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EUA mudam regras e intensificam o risco para migrantes vindos do México

EUA mudam regras e intensificam o risco para migrantes vindos do México

Nas cidades de Matamoros, Ciudad Juárez e Reynosa, localizadas ao norte do México, na fronteira com os Estados Unidos, há uma aglomeração de milhares de homens, mulheres e crianças indocumentados em abrigos e acampamentos improvisados, aguardando uma oportunidade de atravessar para o outro lado.

Essa situação ocorre porque a aplicação temporária do Título 42, uma parte de uma lei de 1944 que permite o controle da migração para proteger a saúde pública, chegou ao fim na noite da última quinta-feira, 11 de maio. Com base na pandemia de Covid-19, declarada em março de 2020, os Estados Unidos empregaram essa norma para efetuar a expulsão imediata de imigrantes indocumentados por cerca de três anos.

Em substituição, Washington tem utilizado desde a sexta-feira (12), o Título 8, que já estava em vigor e permite a rápida expulsão de migrantes que entram nos EUA de forma irregular, além de os proibirem de uma nova entrada por cinco anos. Sob o Título 42, os EUA realizaram 2,78 milhões de expulsões desde 2020.

O México enfrenta essa nova fase sombria da crise em sua política migratória, entre incerteza e pouca clareza nas políticas de adaptação ao término de uma medida aplicada por 40 meses e à implementação mais rigorosa de outra para aqueles que conseguem atravessar uma fronteira de 3200 quilômetros.

Segundo Maureen Meyer, vice-presidente de Programas da ONG Washington Office on Latin America (Wola), sediada em Washington, esse novo episódio representa uma intensificação das dinâmicas migratórias na fronteira.

“O governo mexicano enfrenta desafios ao lidar com a população não mexicana e determinar quais serviços oferecer aos seus próprios cidadãos. Haverá falta de serviços e preocupações, como sequestros e violência sexual. Continuaremos a ver muitas pessoas chegando sem os serviços necessários”, afirmou ela à IPS, questionando: “A pergunta é ‘o que vai acontecer?’. Há muitas questões que o governo mexicano deverá fazer”.

O Ministério das Relações Exteriores do México informou que está preparando assistência consular ao longo da fronteira para a população mexicana afetada.

Um coletivo de organizações não governamentais enviou uma carta ao governo em 9 de maio solicitando definição de ações diante do fim do Título 42, sem que as autoridades tenham esclarecido qualquer ponto sobre as medidas a serem adotadas.

Desde 2019, o presidente Andrés Manuel López Obrador, que assumiu o cargo em dezembro do ano anterior, utilizou os migrantes como moeda de troca para negociar questões energéticas, políticas e ambientais com os Estados Unidos, primeiramente com o presidente Donald Trump (2016-2020) e depois com seu sucessor, Joe Biden.

Ambos os países, parceiros juntamente com o Canadá no Tratado México-Estados Unidos-Canadá (T-MEC), enfrentam sérias divergências em questões energéticas, trabalhistas e ambientais.  Com base nessa estratégia e respondendo a uma solicitação após outra da Casa Branca, o México tem se tornado um destino incerto para migrantes de outros países.

Paul Mayorkas, secretário de Segurança Interna dos EUA, anunciou na quinta-feira (11), que a fronteira está fechada e que todos aqueles que tentarem ingressar para solicitar asilo sem um motivo justificado ou sem pré-aprovação online serão deportados.

Após várias reuniões entre autoridades mexicanas e seus homólogos americanos, López Obrador anunciou na quinta-feira, enquanto uma onda de migrantes aguardava do lado mexicano o fim do Título 42, que enviará mais soldados para a fronteira com a Guatemala, repetindo o endurecimento da fronteiriço que ocorreu há uma década.

Cerca de 25.000 militares mexicanos já participam da vigilância fronteiriça, de acordo com números de organizações de defesa de pessoas indocumentadas, especialmente na fronteira com a Guatemala.

O México facilita a passagem de migrantes por meio de vistos humanitários, sabendo que eles irão encontrar a barreira fronteiriça dos Estados Unidos ao norte, o que tem causado o colapso da infraestrutura migratória, criando abrigos humanitários e centros de detenção.

No entanto, nenhuma das medidas implementadas desde pelo menos 2020 tem conseguido deter a mobilidade humana, muito menos a retórica mexicana de bolsas de estudo, apoio econômico e subsídios para o plantio de árvores em El Salvador, Guatemala e Honduras, como pregado por López Obrador.

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À medida que atravessam o México, os imigrantes indocumentados enfrentam maus-tratos, roubo, discriminação, sequestro e extorsão por parte de grupos criminosos, com a cumplicidade da polícia, militares e agentes de imigração.

Enquanto isso, a subsecretária do Escritório de População, Refugiados e Migração dos Estados Unidos, Julieta Valls Noyes, está preparando uma visita ao México de 17 a 19 de maio.

Tragédia em tempo real

As estatísticas revelam a magnitude da crise migratória atual. Durante os primeiros três meses de 2023, o México deteve 111.505 imigrantes indocumentados, o que representa um quarto do total de 2022.

A Venezuela tem sido o maior contribuinte para essa lista, com 19.944 migrantes em situação irregular, seguida pelo Equador (14.883) e Guatemala (13.349), o que demonstra o surgimento de novos geradores de fluxos migratórios que deslocam atores históricos, como El Salvador, Guatemala e Honduras.

Dos 444.439 capturados em 2022, 97.078 vieram da Venezuela, 72.928 de Honduras e 69.515 da Guatemala, de acordo com dados oficiais.

O México também lidera a máquina da deportação, com um total de 106.008 pessoas deportadas em 2022, das quais 44.959 eram da Guatemala, 40.700 de Honduras e 5.003 de Cuba.

Até o final de março, as expatriações deste ano somaram um total de 21.758, incluindo 9.375 guatemaltecos, 7.168 hondurenhos e 1.836 equatorianos.

A diretora da ONG Sin Fronteras Sandra Álvarez previu um aumento maciço de pessoas buscando asilo nos EUA em ambas as fronteiras, em especial na fronteira ao norte. “O fim do Título 42 implica que as pessoas busquem rotas mais perigados, aumentando o tráfico de pessoas, vítimas do crime organizado, que são sequestradas e extorquidas, e acabam pedindo asilo sem querer”, alerta ela.

A detenção e deportação de imigrantes indocumentados pelos EUA têm aumentado muito nos últimos anos, passando de 596.560 pessoas detidas em 2015 para 1,87 milhão em 2021.

A quantidade de pessoas detidas no México aumentou de 307.535 em 2018 para 695.582 em 2021, atingindo o nível mais alto em uma década. A detenção de cidadãos guatemaltecos, salvadorenhos e hondurenhos tem crescido desde 2017, totalizando, respectivamente, 293.954, 104.586 e 331.397 em 2021.

Na expectativa

À medida que o novo episódio da tragédia migratória vai se desenrolando, as organizações que defendem os imigrantes indocumentados avaliam as alternativas disponíveis para enfrentar a situação.

Maureen  Meyer, da Wola, ressalta a importância de abordar as causas da migração em ambas as nações. “Precisamos tornar visível essa situação dos que solicitam refúgio, monitorando as alterações das políticas de controle de imigração no México, os esforços para proteger e fornecer serviços à população na fronteira ao norte, e a impunidade por violações dos direitos humanos”, afirma ela.

Já Sandra Álvarez, do Sin Fronteras, pede o fim da criminalização da migração. “Os indivíduos em deslocamento são os mais afetados. É fundamental estabelecer a responsabilidade dos Estados, levando em consideração se são países de origem, trânsito ou destino. Embora cada Estado tenha o poder de decidir quem admite, ele também está sujeito a normas internacionais. É necessário abordar o assunto com profundidade, por meio de abordagens preventivas e uma co-responsabilidade direta entre os países”, propõe.

*Créditos da imagem em destaque: Migrantes aguardam do outro lado do Rio Grande, ao lado do muro de metal instalado pelos Estados Unidos entre El Paso e Ciudad Juárez, em tendas ou abrigos improvisados com cobertores pendurados em arame farpado que a Guarda Nacional do Texas colocou (Rey R. Jáuregui/La Verdad-Rodapé)

**Publicado originalmente em IPS – Inter Press Service | Tradução de Marcos Diniz

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