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Médicos Sem Fronteiras denuncia as políticas migratórias da UE

Médicos Sem Fronteiras denuncia as políticas migratórias da UE

Imigrantes, refugiados e solicitantes de asilo estão sujeitos a duras condições de detenção nas portas da União Europeia, após suportarem privações, maus-tratos e tortura nos países de onde iniciam sua jornada migratória.

CORRESPONDENTE IPS

GENEBRA – As políticas da União Europeia (UE) negam segurança e proteção a pessoas refugiadas e migrantes e promovem uma brutalidade sistemática, denunciou em um novo relatório nesta quarta-feira, 21, a organização humanitária Médicos Sem Fronteiras (MSF).

Pessoas que cruzam as fronteiras da UE “estão morrendo de desidratação, hipotermia e ferimentos ao tentar se proteger ou escapar de devoluções violentas para os países de onde iniciaram sua jornada migratória”, aponta o relatório da organização.

Outros migrantes e pessoas em busca de refúgio e asilo “se afogam nos mares Mediterrâneo e Egeu devido à falta de assistência e busca e salvamento, e às práticas perigosas das guardas costeiras”, conforme o relatório.

O relatório “Morte, desespero e desamparo: o custo humano das políticas migratórias da União Europeia” foi elaborado a partir de depoimentos de médicos e pacientes, apenas em 2023, foram mais de 7.900 consultas médicas de emergência e mais de 8400 pessoas resgatadas no mar.

Segundo o MSF, o documento “ilustra uma assustadora adoção de táticas violentas, autorizadas pelas políticas da UE e por seus Estados-membros, e encorajadas pela retórica política cada vez mais desumanizadora dos líderes europeus”.

O relatório evoca o que ficou conhecido como a crise migratória de 2015, quando centenas de milhares de pessoas chegaram às portas da Europa, por terra e mar, fugindo de conflitos no Afeganistão, Iraque e Síria, principalmente.

Desde então, “na MSF, temos pedido sistematicamente à UE e seus Estados-membros que assumam sua responsabilidade de atender às necessidades urgentes de assistência e proteção a migrantes e refugiados”.

Raquel González, coordenadora do MSF na Espanha, disse que “a decisão de permitir e promover políticas de violência e privação contra refugiados e migrantes, em vez de buscar soluções políticas humanas, deveria sacudir a consciência coletiva”.

“Em vez disso, vemos como os líderes da UE intensificam seus esforços e até celebram políticas desumanas como um grito de guerra. Isso contradiz diretamente os valores fundamentais que a UE diz defender”, acrescentou González.

Segundo a MSF, “uma normalização da violência contra refugiados e migrantes se arraigou, com investimentos significativos das instituições da UE em países terceiros como Níger e Líbia, onde frequentemente as pessoas são bloqueadas ou devolvidas à força, enfrentando tratamento desumano”.

Como exemplo desse investimento, o relatório menciona as guardas costeiras líbias, que interceptam rotineiramente pessoas no mar e as mantêm em centros de detenção na Líbia.

“Nossas equipes trabalharam em alguns desses centros de detenção, de 2016 a 2023, onde testemunharam e documentaram condições de vida deploráveis, que facilitam a propagação de doenças transmissíveis”, diz o relatório.

Em dezembro de 2023, a MSF publicou um relatório intitulado “Você vai morrer aqui”, descrevendo abusos nos centros de detenção de Abu Salim e Ain Zara, perto de Trípoli, como espancamentos, tráfico de pessoas, agressões sexuais e tortura.

Entre janeiro de 2022 e julho de 2023, as equipes médicas da MSF nesses centros diagnosticaram e trataram 58 casos de tuberculose e, em um caso, advogaram pela libertação de um paciente adulto gravemente desnutrido, pesando menos de 40 quilos e incapaz de receber atendimento adequado enquanto detido.

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Na Níger, Sérvia e Tunísia, padrões semelhantes de violência externalizada da UE e negação de acesso à assistência médica básica e segurança a migrantes e refugiados ocorrem, “e essa violência também é clara e bem documentada dentro das fronteiras da UE”, diz o relatório.

Além disso, “nossas equipes documentaram a prática de expulsões repetidas em países como Polônia, Grécia, Bulgária e Hungria”.

Com mais de 2000 quilômetros de muros e cercas fronteiriças projetados para manter as pessoas fora da UE, muitas vezes coroados com arame farpado e reforçados com câmeras de vigilância e drones, “a arquitetura física das políticas dissuasivas da UE causa as lesões tratadas por nossas equipes médicas”.

Exemplos são encontrados nas fronteiras polaco-bielorrussa e sérvio-húngara. Essa arquitetura “é complementada por forças de segurança encarregadas de fazer cumprir a lei, cujas repressões violentas contra aqueles que buscam segurança, incluindo tratamento degradante, causaram lesões físicas e transtorno de estresse pós-traumático”.

Muitas vezes, aqueles que procuram refúgio nos países europeus já sofreram violência antes de chegar à Europa.

Em Palermo, no sudoeste da Itália, entre os 57 pacientes atendidos entre janeiro e agosto de 2023, 61% afirmaram ter sido torturados na Líbia, enquanto 58% declararam ter sido submetidos à tortura em um centro de detenção.

Além de bloquear a entrada na UE por terra, os Estados-membros também negligenciaram sua obrigação de prestar assistência a pessoas em perigo no mar, afirma o relatório.

Ele afirma que “a externalização das responsabilidades de resgate para guardas costeiras não pertencentes à UE e a suspensão da capacidade europeia de busca e resgate no Mediterrâneo transformaram os naufrágios e as mortes evitáveis em tragédias quase diárias no Mediterrâneo central”.

Segundo a Organização Internacional para as Migrações (OIM), na última década, cerca de 29.000 pessoas morreram ou desapareceram no Mediterrâneo. Em 2024, até agora, foram relatados 150 desaparecimentos ou mortes.

O documento da MSF argumenta que a UE e seus Estados-membros devem “mudar urgentemente de curso, implementando soluções para a situação, em vez de ver pessoas migrantes e refugiadas através de uma lente puramente de segurança”.

De acordo com dados da Comissão Europeia, o órgão executivo da UE, embora a migração irregular geralmente esteja em foco, a realidade é que as entradas irregulares representam uma pequena fração da migração nessa União de 27 países.

Em 2022, por exemplo, dos 3.777.063 migrantes que chegaram à UE, 3.445.630 o fizeram legalmente e 331.433 de forma irregular.

Naquele ano, 431.200 pessoas de países não pertencentes à UE receberam ordens de deixar a União, um aumento de 27% em relação a 2021. As maiores porcentagens corresponderam a cidadãos da Argélia, Marrocos, Paquistão, Afeganistão e Albânia.

Artigo publicado na Inter Press Service.


FOTO DE CAPA: Acampamento temporário para migrantes e refugiados em Rüdninkai, Letônia. MSF afirma que muitos migrantes, refugiados e solicitantes de asilo estão sujeitos a duras condições de detenção nas portas da União Europeia, após suportarem privações, maus-tratos e tortura nos países de onde iniciam sua jornada migratória. Foto: Vidmantas Balkurnas / MSF.

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