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Violência no Campo: Do Patriarcado à Barbárie

Violência no Campo: Do Patriarcado à Barbárie

Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) sobre conflito no campo no Brasil mostram que entre os anos de 1985 e 2021 foram registrados 1.536 crimes de assassinato resultando em 2.028 mortos. No entanto, apenas 147 desses crimes foram julgados. Ou seja, cerca de 90% dos casos de assassinatos deste período não tiveram qualquer tipo…

Antigamente, havia 3 instituições importantes nas cidades do interior do Brasil: a Igreja, a Prefeitura e o Puteiro. Não necessariamente nessa ordem. Mas quem mandava mesmo era o fazendeiro, chamado de “coronel”. Mandava no padre, no(a) dono(a) do puteiro e no prefeito, sempre escolhido por ele. E explorava seus trabalhadores, evidentemente. Quem destoasse desse esquema de poder, sofria violência. Mas essa paz patriarcal era raramente perturbada.

O processo de urbanização e modernização conservadora iniciada na década de 50 do século passado trouxe mudanças sociais, alterou a estrutura de poder e deslocou a maior parte da violência para a fronteira agrícola, onde são assassinados lideranças rurais, indígenas e defensores da floresta pelos grandes fazendeiros, madeireiros, garimpeiros, mineradores, pecuaristas, principalmente. Além de assassinatos, ocorrem estupros, espancamentos, apropriação violenta de terras onde a lei, relembrando Euclides da Cunha em Os Sertões, está na ponta do fuzil.

O desmatamento ilegal, provocado pela expansão da agricultura e pecuária, acarreta a destruição de florestas e perda da biodiversidade, além de contribuir para as mudanças climáticas. A mineração e o garimpo também estão na origem da degradação ambiental e dos conflitos sociais. Segundo o sistema Deter-B, do Instituto de Pesquisas Espaciais (INPE), de 1º a 30 de dezembro de 2022 a Amazônia perdeu 10.267 km2, superando o registrado nos anos anteriores da série, mais um legado de destruição do ex-governo Bolsonaro (Greenpeace Brasil, 9/1/2023). 

Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) sobre conflito no campo no Brasil mostram que entre os anos de 1985 e 2021 foram registrados 1.536 crimes de assassinato resultando em 2.028 mortos. No entanto, apenas 147 desses crimes foram julgados. Ou seja, cerca de 90% dos casos de assassinatos deste período não tiveram qualquer tipo de julgamento.

A maioria dos assassinatos registrados pela CPT ocorreu dentro da Amazônia Legal. De acordo com os números, foram 984 assassinatos. O Pará concentra o maior número, com 497 registros. Depois vem o Maranhão com 173 registros. O relatório “Assassinatos na Pan-Amazônia”, produzido pela CPT e organizações da Amazônia Legal e Internacional mostrou que, entre janeiro de 2020 e julho de 2022,  202 pessoas foram assassinadas por defenderem seus territórios, em sua maioria homens camponeses. Deste total, 62 assassinatos (30%) ocorreram no Brasil, 18 (8%) no Peru, um no Equador e um na Bolívia. A Colômbia foi o país com o maior número de casos, com 120 mortes registradas (59%). Assassinatos de defensores da Amazônia envolvem narcotraficantes, militares e garimpeiros.

Relatório da ONG Global Witness, divulgado em 12/9/2021, aponta o Brasil como o quarto país no mundo com mais assassinatos de lideranças ambientais e do direito à terra. Mais recentemente, um Levantamento apontou 169 homicídios de defensores de direitos humanos durante governo Bolsonaro. Luta territorial e ambiental são as maiores motivações das violências e a Amazônia Legal é a região com maior número de assassinatos e ameaças, com 1171 casos.

 A vida de defensores de direitos humanos corre, constantemente, um grande perigo segundo o estudo “Na Linha de Frente: Violência Contra Defensores e Defensoras de Direitos Humanos no Brasil”. A pesquisa desenvolvida pelas organizações Terra de Direitos e Justiça Global registrou os casos de violência contra quem defende direitos no Brasil ao longo de todo o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro , de 2019 a 2022. Os dados alarmantes apontam 1171 casos de violência, sendo 169 assassinatos e 579 ameaças, e mostram o acirramento de conflitos territoriais e ambientais no país, com casos registrados em todos os estados brasileiros.

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Com a modernização e urbanização do país, a antiga “bucólica” ordem patriarcal e patrimonial do fazendeiro e das instituições que controlava – a Igreja, a Prefeitura e o Puteiro – foi esvaziada, entre outros fatores, pela penetração da TV nos meios populares, inclusive no campo. Surgiram outras formas de dominação, mas nada comparável à barbárie que vemos hoje na expansão da fronteira agrícola: estupros, assassinatos, apropriação de territórios pela violência.

Os assassinatos de defensores de direitos humanos e do meio ambiente na Amazônia ocorrem praticamente da mesma forma há 40 anos: em locais com vulnerabilidade econômica, crimes brutais são cometidos e permanecem impunes. O caso do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, assassinados no Vale do Javari há um ano, apresenta semelhança com outros crimes de grande repercussão nas últimas décadas na região.

A violência contra indígenas, camponeses, quilombolas, trabalhadores sem terra, ambientalistas e defensores de direitos humanos é a outra face do neo-extrativismo do agronegócio, da pecuária extensiva, da mineração, das madeireiras, que desmatam a floresta e degradam a terra para exportar, sem agregar valor.

No que se refere à reforma agrária, o Orçamento de 2023 prevê apenas R$ 2,4 milhões para aquisição de terras e criação de novos assentamentos, dificultando o cumprimento da promessa de reverter retrocessos do governo Bolsonaro. O governo Lula vem sendo criticado por sua lentidão em resolver diversos problemas. Isso pode ser explicado, pelo menos parcialmente, pela prioridade dada, na prática, à política externa e pelas dificuldades de negociação com a liderança do Centrão na Câmara dos Deputados para obter maioria parlamentar.

Mas os êxitos já obtidos na política econômica, apesar da timidez em retomar o investimento público do Estado para um projeto de desenvolvimento, tendem a fortalecer o Governo em sua relação politica com o Legislativo. Isso se tornará provavelmente mais visível no próximo ano com as eleições municipais. A continuar o aumento do PIB, a redução do desemprego, melhora na Bolsa e queda no dólar, o Governo verá melhorar a correlação de forças pelo maior apoio que obterá na opinião pública.

Apesar da forte pressão do agronegócio e de suas práticas predatórias, tudo indica que o Governo Lula abrirá uma janela de esperança para a civilização suplantar a barbárie que ainda predomina na fronteira agrícola do Brasil.

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