Fatoflix, uma plataforma de formação e organização coletiva

Fatoflix, uma plataforma de formação e organização coletiva

Fatoflix nasce com a mostra Cidades e Cidadania – Eleições Municipais, disponibilizando filmes e documentários sobre habitação e luta pela moradia, participação popular e organização comunitária, trabalho e renda, educação e cultura, meio ambiente, urbanismo e governança. (Foto: Gabriela Matos, do filme Amanhã, de Marcos Pimentel).

POR TATIANA CARLOTTI

Nesta quinta-feira (15), quando os partidos formalizam suas candidaturas, iniciando oficialmente o processo eleitoral nos 5.570 municípios brasileiros, o Fórum 21 promove o lançamento da Fatoflix, uma plataforma de streaming voltada à formação política e à organização coletiva do campo democrático-progressista.

Fatoflix nasce com a mostra Cidades e Cidadania – Eleições Municipais, disponibilizando filmes e documentários indicados pelos membros do Fórum 21 e intelectuais como a arquiteta e urbanista Ermínia Maricato – que em sua entrevista para este site trouxe sugestões valiosas dos participantes da rede BR Cidades – e o economista Ladislau Dowbor.

Ambos participaram – Dowbor na Secretaria de Assuntos Extraordinários e Maricato na de Habitação – do inovador governo de Luíza Erundina em São Paulo (1988-1993), ao lado de Paulo Freire (Educação), Paul Singer (Planejamento), Perseu Abramo (Comunicação), Marilena Chauí (Cultura), Amir Khair (Finanças), Aldaíza Sposati (Administrações Regionais) entre outros nomes de peso.

A “gestão dos sonhos” na capital paulista, que daria origem aos mutirões populares, foi uma entre as várias experiências inovadoras durante os anos de redemocratização, no chamado ciclo da democracia participativa que, segundo Maricato, precisa urgentemente ser resgatado para orientar os atuais e futuros gestores públicos.

Nas entrevistas sobre as eleições municipais a este site, Dowbor e Maricato foram unânimes ao afirmar que sem participação popular e organização social no território não haverá saída nem para as cidades, nem para a nossa democracia.

DEMOCRACIA, CÂMERA, AÇÃO!

Com base neste diagnóstico, até as eleições de outubro, a Fatoflix oferecerá aos eleitores e a todos os envolvidos nas candidaturas do campo progressista, um crescente acervo de títulos, com documentários e filmes de primeira linha sobre os principais desafios e soluções para as cidades brasileiras.

A plataforma estreia com 26 filmes e 2 séries gratuitamente disponíveis (acesse aqui), reunindo depoimentos, análises e informações sobre habitação e luta pela moradia, participação popular e organização comunitária, trabalho e renda, educação e cultura, meio ambiente, urbanismo e governança.


O objetivo da iniciativa, capitaneada pelo jornalista Carlos Tibúrcio, editor deste Fórum 21 e ex-Coordenador da Equipe de Discursos da Presidência da República dos governos Lula e Dilma Rousseff (2003-2016), é levar esse acervo, composto pelas vozes que atuam no território, para eleitores, movimentos e coletivos que estarão nos próximos três meses na linha de frente da disputa eleitoral.

“O desafio é enorme, a extrema-direita saiu bem na frente neste campo, como sabemos, mas a necessidade e as potencialidades de uma plataforma como esta para as forças democrático-progressistas são maiores ainda”, aponta Tibúrcio.

Não será fácil. Contra a verdade dos fatos – e daí o título Fatoflix – teremos de lidar com a difusão em grande escala de mentiras e preconceitos pela extrema-direita. Além disso, a plataforma almeja contribuir para o processo participativo e de ampliação da consciência do campo progressista sobre as urgências da realidade local.

Neste sentido, a Fatoflix oferece nesta primeira mostra dados e informações, a partir da perspectiva de quem enfrenta e estuda os desafios das nossas cidades. Um material de formação política para ser disseminado junto aos nossos familiares, amigos, colegas, alunos e leitores.

MUNIÇÃO CONTRA AS FAKENEWS

A luta pela moradia é tema da grande maioria dos documentários da mostra Cidades e Cidadania – Eleições Municipais e não à toa. A habitação, apesar de ser um direito garantido pela Constituição de 1988, como a saúde pública e a educação gratuita e universal, ainda é um sonho para imensa maioria da população urbana no Brasil, que vive em ocupações e sob contínua ameaça de perderem o pouco que têm.

A luta dessas pessoas, como vivem, o que sonham e como enfrentam a ausência desse direito é tema de documentários de extrema qualidade como a Vila dos criadores: O Direito de (R) Existir (2024) do coletivo Vila dos Criadores, localizada às margens do Rio Casqueiro na Baixada Santista. De Quilombo Rio dos Macacos (2017), de Josias Pires Neto, sobre a resistência dos quilombolas no território situado entre Salvador e Simões Filho na Bahia.

De Loteamento Clandestino, filmado por Ermínia Maricato em 1978, sobre as ocupações na periferia paulistana. E, também, de Quem Mora Lá (2018), média-metragem de Conrado Ferrato, Rafael Crespo e César Viera, sobre a comunidade do Pocotó em Boa Viagem, no Recife.

Já a violência policial ganha destaque nos documentários Parque Oeste (2018) de Fabiana Assis, que traz a brutal reintegração de posse em Goiânia. Em Muribeca (2020), de Alcione Ferreira e Camilo Soares, que mostra a destruição do Conjunto Habitacional Muribeca em Jaboatão dos Guararapes, em Pernambuco.

O IMPACTO DO CAPITAL


A violência do poder econômico contra a população no território é tema dos documentários Limpam com Fogo (2016) de Conrado Ferrado, Rafael Crespo de César Vieira, que investiga a relação entre os incêndios nas favelas paulistanas e a especulação imobiliária. E do curta Recife, Cidade Roubada (2014), de Ernesto de Carvalho, Leon Sampaio, Luis Henrique Leal, Marcelo Pedroso e Pedro Severien, um vídeo de denúncia do Movimento Ocupe Estelita contra o Consórcio Novo Recife na capital pernambucana.

A pressão do capital também é analisada, em suas dimensões mais gerais, em dois documentários de Silvio Tendler, um entusiasta deste projeto: Dedo na Ferida (2017) que esmiúça o capital financeiro; e Privatizações: a distopia do capital (2014) sobre a quebradeira do Estado brasileiro nos anos 90. Duas contundentes produções contra o discurso privatista e do Estado mínimo da direita e extrema-direita brasileiras.

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As questões ambientais também têm voz na Fatoflix.

Em A Braskem passou por aqui: a catástrofe de Maceió (2021), Carlos Pronzato mostra as causas e consequências do já considerado “o maior crime socioambiental em curso no mundo”, que levou ao afundamento de cinco bairros da capital alagoana pela petroquímica Braskem. Já em Fio da Meada (2019), outra pérola de Tendler, é possível compreender as conexões entre a crise ecológica em curso e a lógica ambientalmente devastadora do capitalismo financeiro.

Outro excelente filme é Entre Rios, de Caio Silva Ferraz, que conta a história de São Paulo sob a perspectiva de seus rios e córregos, explicitando as contradições de uma cidade que soterrou a sua natureza local.

Já no tocante ao papel fundamental dos povos originários na preservação do território, a plataforma conta com belíssimo Para´Í (2018). Uma ficção de Vinícius Toro sobre os valores e a tradição dos povos indígenas, a partir dos olhos de uma criança guarani.

E por falar nelas, o documentário Amanhã (2023), de Marcos Pimentel, retrata a história de três crianças de universos socialmente distintos em Belo Horizonte, explicitando como as desigualdades sociais se apresentam em diferentes territórios.

A RESISTÊNCIA

Além da luta, Fatoflix reúne documentários sobre um conjunto de iniciativas de atores que estão na resistência contra as opressões sociais e econômicas nas nossas cidades.

Eles ganham protagonismo na câmera de Paula Constante, em Os Mutirões da Leste 1 (2020), que entrevistou 100 militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra da Leste 1; e em Capacetes Coloridos (2007), também de Constante, que compara dois canteiros de obras: um erguido pelas famílias no mutirão autogerido pela Associação Paulo Freire, e outro pelos trabalhadores terceirizados durante as obras de ampliação do campus da USP, na Zona Leste em São Paulo.

A Mostra aborda ainda a dura vida dos trabalhadores de aplicativos nas grandes cidades, tema de GIG- A Uberização do Trabalho (2019), de Carlos Juliano Barros, Cauê Angeli e Maurício Monteiro Filho.

Destaque também à resistência popular no documentário Bela Vista: reflexos da resistência (2021), realizado pela comunidade ATHIS na Baixada, sobre os moradores do Bela Vista, uma comunidade da Baixada Santista.

Já sobre educação e cultura, Tendler traz uma inspiradora experiência no Rio de Janeiro em Correndo Atrás dos Sonhos (2024), curta-metragem sobre o Projeto Tempo Livre, criado pelo Sesc Rio, para desenvolver iniciativas culturais no interior do estado.

A Mostra Cidades e Cidadania – Eleições Municipais apresenta também Encontro com Milton Santos: O mundo global visto do lado de cá (2006), uma conversa de Tendler com o maior geógrafo brasileiro sobre questões relacionadas à globalização e à capacidade de governança dos Estados nacionais. Uma reflexão de fundo sobre o território e o papel da mobilização social e do Estado na garantia de direitos e na proteção da população contra as forças do capital.

AS SÉRIES DA FATOFLIX


A Fatoflix também apresenta duas séries. Brasil, Travessias (2018) de Silvio Tendler que, em 13 episódios, abrange onze estados brasileiros e mais de 70 cidades, trazendo um retrato deslumbrante dos vários brasis deste país continente: o Brasil do sertão, da caatinga, do barro, do bordado, do Velho Chico, da madeira, do Jequitinhonha, das Gerais, das aves, da vida campeira, da Viola de Coxo, do cerrado e da montanha.

E a série de sete episódios Autogestão na Habitação, da União Nacional por Moradia Popular, sobre a importância da autogestão, do projeto participativo, da gestão coletiva da obra, do mutirão, do trabalho social, do MCMV Entidades e um episódio focado na criminalização dos movimentos sociais. Um verdadeiro curso de organização e resistência popular.

Por fim, também compõem o acervo, em caráter permanente, cinco grandes clássicos da 7ª Arte para a fruição da genialidade de nomes como Serguei Eisenstein, Jean Renoir, Charles Chaplin, Fritz Lang e do brasileiro Mario Peixoto.

Para auxiliar na escolha dos títulos, cada um dos filmes da Mostra conta com um vídeo-guia, de 1 a 2 minutos, sobre a importância do seu conteúdo.

E VEM AÍ…

A mostra Cidade e Cidadania – Eleições Municipais que começa neste dia 15 fica no ar até o final das eleições de outubro.

Em outubro e novembro, estão no horizonte três mostras que dialogam com a conjuntura: Eleição nos Estados Unidos e Geopolítica Mundial – Cúpula do G20 no Brasil. E, em dezembro, Direitos Humanos – 60 anos do golpe de 1964.

Com este acervo, a equipe desta primeira Mostra da Fatoflix – composta por Cândida Guariba, Bárbara Richard Rozani, Moacir Barbosa, Marcos Diniz e Tatiana Carlotti (com contribuições também de Léa Maria Aarão Reis), sob a batuta de Carlos Tibúrcio – agradece enormemente a cada um dos diretores e produtores dos filmes cedidos.

Contamos com cada um de vocês na divulgação deste material e esperamos que ele possa chegar nas casas, nas escolas, nas organizações populares, nos comitês eleitorais, nas prefeituras e nas câmaras de vereadores, ampliando visões de mundo e fortalecendo nossas consciências sobre o direito, garantido pela Constituição brasileira, de vivermos num país com justiça social e numa cidade de plenos direitos.

Cadastre-se na plataforma, acompanhe as novidades e convide amigos, familiares e colegas para conhecer esta iniciativa. E considere que a Fatoflix é gratuita, mas precisa da sua solidariedade efetiva para cumprir o papel a que se propõe.

Bons filmes!


Foto de capa: Gabriela Matos, do filme Amanhã, de Marcos Pimentel.

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