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Ditadura Civil-Militar de 1964: 60 anos depois

Ditadura Civil-Militar de 1964: 60 anos depois

Além dessa seleção de trabalhos reunidos abaixo, há diversos outros livros sobre a ditadura civil-militar de 1964. Reapresentamos esses volumes aqui, listados para o leitor(a) que não deseja ‘remoer’, mas relembrar o período sombrio da história brasileira recente. Desse modo, trazendo de volta lembranças nefastas e informações pouco conhecidas até hoje – que de vez em quando quase se repetem como ocorreu há pouco mais de um ano – a memória se mantém viva e em alerta.

Desse modo podemos resistir e lutar contra atentados similares quando necessário, em particular diante do avanço atual dos movimentos de extrema-direita em várias partes do mundo. “Recordar o golpe de 64 é uma forma de construir memória e evitar a repetição de novos ataques à democracia”, diz o jornalista Altamiro Borges.

Diversas sugestões de leitura da referida seleção abaixo têm origem em relevante listagem elaborada pelo jornalista Euler de França Belém, da Revista Bula, em abril de 2020, e foram dela extraídas.

Livros e leituras:

*O emblemático volume 1964: (edição física e kindle), versa sobre o golpe que derrubou um presidente, enterrou o regime democrático e instituiu a ditadura no Brasil. É de autoria de Ângela de Castro Gomes e Jorge Ferreira. “Linguagem objetiva, sem exageros acadêmicos ou notas de rodapé excessivas, (…) 1964 destaca personagens e momentos que marcaram o período, relembrando falas de personalidades e trechos de jornais que noticiaram o golpe”, comenta Euler França lembrando: “A direita afirma que o golpe se deu em março. A esquerda, para conectar com o dia da mentira, sustenta que ocorreu em 1º de abril”. O livro narra o período que vai da crise da renúncia de Jânio Quadros, em agosto de 1961, até o golpe civil-militar de 1964 com o conluio das três Forças Armadas golpistas, e de um movimento civil com amplo apoio de setores sociais, de empresários e classe média. (Editora Civilização Brasileira).

*João Goulart – Uma Biografia, de Jorge Ferreira. Um dos melhores estudos sobre o presidente deposto em 64. Aqui, Jango se mostra um político articulado.

*O Projeto Brasil: Nunca Mais foi desenvolvido por D. Paulo Evaristo Arns, Rabino Henry Sobel, Pastor presbiteriano Jaime Wright e equipe, e realizado clandestinamente entre 1979 e 1985 durante o período final da ditadura. Gerou importante documentação sobre a história do Brasil e originou o volume Brasil: Nunca Mais, leitura fundamental na historiografia do regime militar. As fontes utilizadas foram processos criminais que tramitaram na Justiça Militar durante a ditadura e documentação oficial produzida pelo próprio aparato repressivo. Relata também a atuação do aparelho repressivo com os nomes dos principais torturadores dos porões da ditadura.

*Em Mulheres na Luta Armada, a historiadora Maria Cláudia Badan Ribeiro apresenta mais de 45 mulheres resistentes da Ação Libertadora Nacional, a ALN. No livro, as testemunhas mostram que as mulheres não foram apenas uma linha auxiliar na luta armada contra a repressão. (Editora Alameda).

*A Casa da Vovó. Brutalidade e violência na ação dos militares.O título do livro se refere ao apelido dado por eles ao DOI-CODI que funcionava como epicentro de combate aos grupos armados. O autor, Marcelo Godoy, monta sua narrativa com base em documentos oficiais e em entrevistas com aqueles envolvidos em torturas, com torturadores e torturados. Há depoimentos de alguns agentes que operaram na “casa da vovó”.

*Batismo de sangue: Guerrilha e morte de Carlos Marighella,de Frei Betto, (Prêmio Jabuti de 1983) desenha o perfil político de Carlos Marighella, narra episódios relacionados à sua morte, comenta a participação dos frades dominicanos no movimento guerrilheiro, a sua clandestinidade, a atuação no “esquema de fronteira” retirando perseguidos políticos do país. Batismo de sangue é excelente relato da história dos anos sombrios. Uma obra de referência. Lançado em 1982, foi traduzido para o francês e para o italiano. (Ed. Rocco).

*Marighella – o guerrilheiro que incendiou o mundo, de Mario Magalhães, é outra obra de referência sobre o líder da Ação Libertadora Nacional, a ALN, e considerada a mais completa biografia do revolucionário baiano. Inspirou o filme de Wagner Moura, de 2021, exibido nos cinemas e também em sessões gratuitas para populações pobres do campo, favelas, assentamentos, ocupações e periferias das grandes cidades. Por força da censura dos neofascistas que procuraram negar a nossa cultura desde o golpe da presidente Dilma Rousseff, os espectadores brasileiros foram os últimos com acesso à exibição desse filme o qual antes, já tinha sido premiado em importantes festivais de cinema em outros países. É uma história do Brasil vista a partir da perspectiva de Carlos Marighella (Companhia das Letras).

*O uruguaio René Armand Dreifuss, no livro 1964: A Conquista do Estado—Ação Política, Poder e Golpe de Classe, com tradução de Ayeska Branca, Ceres Ribeiro, Else Ribeiro e Glória de Mello, escreveu um trabalho considerado clássico sobre o golpe de 64. Publicado em 1981, Dreifuss documenta a conexão militares e civis, demonstrando que o golpe, além de militar, também foi um golpe civil, com as ações praticadas pelo IPES e pelo IBAD na articulação e financiamento da operação de derrubada do presidente João Goulart (Editora Vozes).

*Além do Golpe – Versões e Controvérsias Sobre 1964 e a Ditadura Militar, do historiador Carlos Fico, faz a crítica das principais obras sobre o golpe e a ditadura. É minucioso e publica documentos essenciais sobre o tema como a íntegra do AI-5 (Editora Record).

*Também de Fico, O Grande Irmão: Da Operação Brother Sam aos Anos de Chumbo – O Governo dos Estados Unidos e a Ditadura Militar Brasileira mostra o quanto a participação americana foi decisiva para a consumação do golpe. “A Operação Brother Sam não foi pouca coisa”, observa Euler Belém (Editora Civilização Brasileira).

*No livro 1964 – O Verão do Golpe (Editora Maquinária) o jornalista Roberto Sander constrói uma síntese do golpe com meticulosa bibliografia e analisa a história cultural do período. Em suas páginas desfilam João Goulart e Castello Branco e até Brigitte Bardot, Nara Leão, Jorge Ben Jor, Glauber Rocha e outros artistas, estrelas da época.

*Visões do Golpe – A Memória Militar sobre 1964, organizado por Maria Celina D’Araújo, Celso Castro e Gláucio Ary Dillon Soares, contém entrevistas de militares que contribuíram para derrubar João Goulart. “Um documento histórico valioso, um maná para pesquisadores porque os militares não falam com facilidade”, anota o jornalista Euler Belém.

*Cães de Guarda – Jornalistas e Censores, do AI-5 à Constituição de 1988, (Editora Boitempo) da jornalista e professora Beatriz Kushnir, é leitura indispensável, e detestado por proprietários e chefes da mídia corporativa. O corajoso livro mostra que, além de apoiar o golpe de 1964, a ‘grande imprensa’, a imprensa corporativa, “coonestou os atos da ditadura”. A relação com a censura foi bem menos tensa do que dizem, hoje, alguns editores e jornalistas das cúpulas de jornais e redes de televisão.

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*Os Anos do Condor – Uma Década de Terrorismo Internacional no Cone Sul, do jornalista norte-americano John Dinges, apresenta a conexão da ditadura brasileira com as de outros países sul-americanos na época, como a chilena, de Augusto Pinochet. Comenta as mortes de Juscelino Kubitschek, João Goulart e Carlos Lacerda (Companhia das Letras, tradução de Rosaura Eichenberg).

*Em Castello–A Marcha para a Ditadura, o autor Lira Neto, que ganhou quatro vezes o Premio Jabuti, mostra que Castello desejava devolver o poder aos civis; mas a um aliado dele, como Bilac Pinto. Sob pressão da linha dura aceitou a candidatura de Costa e Silva. “O que está em jogo é a sagrada unidade das Forças Armadas”, disse Castello aos aliados, segundo consta no livro. “Vamos vender o futuro por uma solução precipitada do presidente”, contestou o general Ernesto Geisel (Editora Contexto).

*Ernesto Geisel, organizado pelos historiadores Maria Celina D’Araújo e Celso Castro, é uma longa entrevista de Geisel com passagens impressionantes no seu depoimento, como esta: “Acho que a tortura em certos casos torna-se necessária para obter confissões”. E garante que o comandante do Exército de São Paulo, Ednardo d’Ávila Melo, era omisso e seus subordinados faziam o que queriam; consequência disso, segundo Geisel, foram as mortes do jornalista Vladmir Herzog e do operário Manuel Fiel Filho (Edição Fundação Getúlio Vargas).

*Combate nas Trevas, de Jacob Gorender, é outra obra até hoje vista como importante relato sobre as ações da esquerda contra os governos militares. Gorender traz os abusos de militares e delegados de polícia e critica também insuficiências de interpretação da realidade por parte das esquerdas (Editora Ática).

*Como Eles Agiam – Os Subterrâneos da Ditadura Militar: Espionagem e Polícia Política é uma edição da Record e o autor é o historiador Carlos Fico. Para muitos estudiosos do período, Fico é o principal historiador da época. Seu conteúdo pode ser complementado pelo livro Ministério do Silêncio – A História do Serviço Secreto Brasileiro de Washington Luís a Lula: 1927-2005 (também da Record), de autoria de Lucas Figueiredo. “O modelo do SNI era mais parecido com o adotado pela ditadura comunista da União Soviética”, escreve Figueiredo.

*O jornalista e escritor Dênis de Moraes revisita o seu trabalho, A Esquerda e o Golpe de 1964, reeditado pela quinta vez há pouco. Ele apresenta episódios e depoimentos que permaneceram inéditos durante os últimos 60 anos e traz a experiência e reflexões da esquerda diante do processo que levou à deposição do presidente Goulart. Em artigo recente, desse mês, Moraes esclarece: “Esta quinta edição, revista e ampliada, vem a público 60 anos depois do golpe de Estado de 1º de abril de 1964. Ela preserva, no essencial, os focos temáticos, os eixos de análise e o estilo narrativo do livro publicado originalmente em 1989. (…) Ao mesmo tempo modifiquei capítulos e incluí outros; reelaborei várias passagens; e, principalmente, introduzi materiais inéditos e novos conteúdos além de ter consultado fontes surgidas em décadas recentes”.

*Os Advogados e a Ditadura de 1964 – A Defesa dos Perseguidos Políticos no Brasil é um volume organizado por Fernando Sá, Oswaldo Munteal e Paulo Martins. Mesmo sob ameaças e pressões, alguns advogados trabalharam para localizar e defender presos políticos cujas famílias perdiam contato com os parentes porque suas prisões não eram notificadas. O prefácio é de D. Paulo Evaristo Arns e relata a história de Sobral Pinto, Modesto da Silveira, Mário de Passos Simas, Heleno Fragoso, Aírton Soares, Marcello Alencar, Sigmaringa Seixas, George Tavares, Hélio Bicudo, Luiz Eduardo Greenhalgh, Dalmo Dallari entre outros (Editora PUC Rio e Vozes).

Diversos outros livros foram produzidos sobre a ditadura civil-militar de 1964. São trabalhos tão importantes quanto os mencionados acima. O Governo Goulart e o Golpe de 64 (da Editora Brasiliense), de Caio Navarro de Toledo, considerado fundamental sobre o tema, importante leitura para revisitar o período. (Ed. Brasiliense, 1982).

De Octávio Ianni, O Colapso do Populismo no Brasil; de Francisco de Oliveira, Crítica à Razão Dualista; de Maria da Conceição Tavares, Da Substituição de Importações ao Capitalismo Financeiro; de Carlos Castello Branco, Introdução à Revolução de 1964, e de Francisco Weffort, O Populismo na Política Brasileira.

Para muitos, O fantasma da revolução brasileira, de Marcelo Ridenti é leitura necessária e esses trabalhos são indispensáveis: Democracia e Ditadura, de Daniel Aarão Reis; A ditadura que mudou o Brasil, organizado por A. Reis, M. Ridenti e Rodrigo Patto Sá Motta; A ditadura em tempos de milagre, de Janaína Martins Cordeiro; As universidades e o regime militar, de Rodrigo Patto Sá Motta.

*Em Câmara Lenta é de Renato Tapajós. Um romance sobre a luta contra a ditadura na perspectiva de ficção. Ano passado foi lançada nova edição pela Editora Carambaia com entrevista do escritor, um parecer do crítico literário Antonio Candido e um posfácio de Jayme Costa Pinto. A primeira edição do livro é de 1977 (Editora Alfa-Ômega).

*Alfredo Sirkis, que foi jornalista, escritor e roteirista de cinema e TV, escreveu Os Carbonários onde narra a saga de um guerrilheiro de apenas 19 anos; o próprio autor. Nos episódios de sequestros de embaixadores, por dominar o idioma do inglês, Sirkis foi uma ponte de comunicação com os estrangeiros capturados (Editora Record).

*O que é isso Companheiro?, de Fernando Gabeira, lançado em 1979, foi um best-seller da safra de livros produzidos por ex-guerrilheiros. Segundo a Editora da época, a Codecri, vendeu 80 mil exemplares. Em 2009 a Companhia das Letras divulgou que a obra, então com mais de 40 edições, teria vendido cerca de 250 mil exemplares.

*Na Corda Bamba é o sugestivo título do volume de autoria do pesquisador e professor de História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense, Daniel Aarão Reis, lançado no começo desse ano. São “memórias ficcionais” no dizer do autor, ou, como escreve Renato Janine Ribeiro, na apresentação da obra: “Livro que está perto do que hoje se chama auto ficção: uma história ou, na verdade, um emaranhado de histórias, reais, que são tratadas com a liberdade que alguma ficção permite”. A jornalista e escritora Cristina Serra, também apresentando Na Corda Bamba na sua contracapa, é precisa: “Ele nos faz pensar que ainda vivemos ‘na corda bamba’, num país que não teve a coragem de enfrentar a fundo o passado dos anos de chumbo. Terá um dia?”.

Esperamos que sim, em especial as novas gerações. Com toda a firmeza de que somos capazes, e com as informações das quais dispomos.

*Alguns dos trabalhos relacionados não reeditados podem ser localizados no site da Estante Virtual.

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