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Círculo vicioso na economia brasileira

A sempre alardeada “situação fiscal brasileira delicada” faz parte de um círculo vicioso onde foi colocada a economia brasileira há duas décadas. Instalou-se o discursinho falso do “risco fiscal de insolvência”, na gestão da dívida pública interna, cujo resgate é realizado, seja com sua rolagem, seja com a emissão de moeda nacional.



Sob o ponto de vista da maioria da população, é falso o dilema entre gastos sociais ou encargos financeiros. O governo social-desenvolvimentista assume tanto a responsabilidade social quanto a responsabilidade fiscal, ou seja, não se restringe a esta.
     Segundo o costumeiro comentário de economista neoliberal, “as taxas de juros refletem a antecipação da inflação, cujo risco de descontrole decorre da situação fiscal brasileira delicada, dada a disposição do novo governo de gastar mais, como a PEC da Gastança durante a transição de governo e a defesa do fim do teto de gastos sugerem”. É falso…
     Dá a entender o seguinte. Antes, durante o governo neoliberal na economia e neofascista na política, derrotado nas urnas pela maioria sensível dos eleitores brasileiros, estava tudo ótimo, de acordo com seu credo!
     “Retroceder na independência do Banco Central abalaria a credibilidade da política econômica, com a consequência óbvia de mais inflação”, prega essa crença. “Subir a meta pioraria ainda mais as expectativas”. Essa ilusória Economia da Confiança pratica o reducionismo simplório de tudo (e de todos) à sua fé: a psicologia uniforme dos diversos agentes econômicos ordenaria a economia brasileira…
     Já antes da posse a Folha de S. Paulo se colocava contra “as indicações temerárias do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT)”, como se a maioria democrática tivesse de se curvar aos desígnios do neoliberalismo eternamente. Seu editorial (02/02/23), persistente e ideologicamente, criticava “a aprovação da PEC da Gastança e o falatório de Lula contra a responsabilidade fiscal, a autonomia do Banco Central e as metas de inflação”.
     Desrespeita o único presidente da República eleito três vezes – seriam quatro, caso o PIG (Partido da Imprensa Golpista) não tivesse apoiado a trama do ex-ministro da Justiça do bisonho capitão reformado para arquitetar a prisão do líder popular em 2018. Agora, têm vindo a público outras tramas golpistas e terroristas da extrema-direita.
     Bisonho se refere a soldado inexperiente na tropa, recruta. Usado como adjetivo indica quem tem pouca ou nenhuma experiência, habilidade, treinamento ou conhecimento em alguma ocupação ou ofício, no caso, para exercer o principal cargo da República.
     Na realidade, a sempre alardeada “situação fiscal brasileira delicada” faz parte de um círculo vicioso onde foi colocada a economia brasileira há duas décadas. Instalou-se o discursinho falso do “risco fiscal de insolvência”, na gestão da dívida pública interna, cujo resgate é realizado seja com sua rolagem seja com a emissão de moeda nacional.
     O risco soberano ocorre por ameaça de um governo estrangeiro não honrar empréstimos em virtude de carência de reservas cambiais. O Risco-Brasil de insolvência do país frente aos investidores estrangeiros foi superado com o acúmulo de reservas internacionais, principalmente no segundo governo Lula e no primeiro da Dilma.
     O excelente portal do Banco Central do Brasil fornece informações estatísticas abundantes a respeito para desmascarar o círculo vicioso onde foi colocada a economia brasileira. A cadeia causal, denunciada recorrentemente pelos neoliberais, é: excesso de gasto social – déficit primário – falta de dinheiro para pagar o endividamento interno – desconfiança do Mercado – elevação dos juros.
     Omitem o embolso dos juros por eles e seus patrões. A pressão midiática recorre à pressuposta causalidade: “desancoragem das expectativas” – inflação – elevação de juros. Não se importam com o efeito final: estagnação econômica e desemprego massivo.
     Na economia brasileira rastejante predominam ocupações informais com baixa remuneração. A maioria da população se mantém pobre. Em 2021, o rendimento habitual de todos os trabalhos dos 40% mais pobres registrou mediana de R$ 1.013 (rendimento médio de R$ 834), da classe média de 40% a 90% foi R$ 1.977 (rendimento médio de R$ 2.239) e dos 10% mais ricos R$ 7.615 (rendimento médio de R$ 10.222).
     Os percentuais da renda concentrada, segundo a PNADC-IBGE de 2021, por essas faixas foram, respectivamente, 13,5%, 45,3% e 41,3% do total. Os 10% mais ricos embolsam esse percentual da massa de rendimentos dos trabalhos e têm condições de planejar investimentos para acumular os rendimentos dos juros em suas reservas financeiras.
     Os dados acumulados desde 2000 dos fatores condicionantes da evolução da Dívida Líquida do Setor Público (DLSP) demonstram esse círculo vicioso onde se meteu a economia brasileira. Ela se elevou de 47% do PIB em 2000 para 59,9% em 2002. Baixou até o fim dos primeiros governos Lula para 38% em 2010. No governo Dilma, chegou ao piso de 30,5% em 2013. A partir de então cresceu até o pico de 62,5% em 2020 e baixou no fim de 2022 para 57,5%. Não houve nenhum risco de insolvência nesse período!
     O revelador é que os maiores fatores condicionantes de seu crescimento foram, disparadamente, os juros nominais. Em dados acumulados, passou de 6,6% do PIB em 2001 para 125,2% em 2021. Reconhecimento de dívidas acumulou apenas 3,3%.
     Como fatores condicionantes para a queda dessa relação DLSP/PIB, o efeito do crescimento do PIB nominal (produto real e inflação) foi de -4,2% do PIB até -86,6%. O resultado primário foi de -3,2% até -20,5%, embora até 2013 tenha acumulado -38,2%. O impacto das variações cambiais até 2014 foi positivo (+2,7%), mas depois caiu até -10,2% em 2021, tornando-se um fator de contraponto ao crescimento da DLSP. Privatizações só têm relevância no discurso neoliberal: -1% do PIB acumulado até 2021.
     Em fluxos acumulados a cada ano, entre 2001 e 2006, os juros nominais condicionantes da DLSP representaram em média 7,2% do PIB. De 2007 a 2014, baixaram para a média anual de 5,2% do PIB. De 2015 a 2022, subiram para 5,8% do PIB.
     Em contraponto, houve superávit primário de 2001 a 2013 em média anual de 2,9% do PIB. Desde 2014 até 2022, o déficit primário registrou a média de -1,8% do PIB e não houve sobra de recursos fiscais para pagar os elevados encargos financeiros do período.
     A DLSP atingiu R$ 5,658 trilhões em dezembro de 2022. O porcentual 57,5% do PIB superou o resultado no encerramento do ano anterior de 55,8% do PIB. Apresenta valores inferiores aos da DBGG (Dívida Bruta do Governo Geral) porque leva em consideração as reservas internacionais do Brasil.
   



      A DBGG é uma das referências para avaliação, por parte das agências globais de classificação de risco, da capacidade de solvência do País. Equivocadamente, a imprensa noticia: “quanto maior a dívida, maior o risco de calote por parte do Brasil”. Ora, somente 13% dela é externa
     O pico da série da dívida bruta foi alcançado em outubro de 2020 (87,57% do PIB), em virtude das medidas fiscais adotadas no início da pandemia de covid-19. No menor percentual da série, a DBGG chegou a 51,5% do PIB em dezembro de 2013. A média anual de 2006 a 2014 foi 54,7%. Com a volta da Velha Matriz Neoliberal, apesar do seu discurso fiscalista, essa média foi elevada para 77% do PIB de 2015 a 2022.
     Observe, na tabela acima, como os encargos financeiros com juros nominais se elevaram de 2020 (4,6% do PIB), quando a Selic foi mantida em 2% aa de agosto até março de 2021, a 2022 (7,5% do PIB), com o atingimento da Selic a 13,75% aa em setembro. Os juros nominais, exceto em 2020, foram o maior fator condicionante do aumento da DBGG. O efeito do crescimento do PIB nominal (inclusive o efeito inflacionário) sobre a dívida bruta não se contrapôs aos juros em 2019 e 2020.
     O debate verdadeiro não se trata da escolha entre inflação ou crescimento, ameaçando a população com um imaginário efeito inflacionário do crescimento. Os neoliberais apontam um automatismo da inflação para os juros, porém, isto não é verdade, porque a fixação da taxa de juro (13,75% aa) disparatada em relação à taxa de inflação (5,78% em 2022) é fruto de um arbítrio (e não ciência) da diretoria do Banco Central do Brasil em manter a maior taxa de juro real do mundo (8 pontos percentuais) e desestimular a alavancagem financeira do crescimento econômico gerador de empregos.
     A Taxa Selic média, nos últimos 20 anos, foi 11,45% aa com 113 meses acima e 127 meses abaixo dessa média. A mínima foi 2% aa e a máxima 26,5%. O resultado desse vício em juros disparatados é a estagdesigualdade, isto é, estagnação econômica mais concentração da riqueza financeira.
 

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