Panfleto progressista da Oxfam

Panfleto progressista da Oxfam

Panfleto é um texto curto, violento e sensacionalista, geralmente sobre assuntos políticos, no passado impresso em folheto e de distribuição limitada. Hoje é digital e circula em grande escala internacional, na rede social de todo o mundo, especialmente, se for traduzido.

A Oxfam é uma confederação internacional de 21 organizações, operando em rede de 65 países, como parte de um movimento global pela mudança social. Visa construir um futuro livre da injustiça causada por pobreza.

Nesse sentido, merece todo o nosso apoio. Mas isso não a isenta de críticas conceituais e/ou metodológicas, em termos construtivos, isto é, oferecendo uma alternativa para aperfeiçoar seus argumentos em favor de sua causa progressista.

Por exemplo, em sua Nota Metodológica do documento distribuído em Davos, no primeiro mês de 2024, entre outros erros conceituais, para “denunciar o capitalismo”, afirma: “as cinco maiores empresas do mundo, juntas, são avaliadas em mais do que o PIB combinado de todas as economias da África Subsaariana, da América Latina e do Caribe.” Oh!, espanta-se o leigo em Economia.

A Oxfam expõe suas fontes para fazer tal afirmativa. As cinco principais empresas globais por capitalização de mercado de ações, de acordo com o ranking global 2000 da Forbes sobre as maiores empresas do mundo, publicado em 8 de junho de 2023, eram: Apple (US$ 2,746 trilhões), Microsoft (US$ 2,310 trilhões), Saudi Aramco (US$ 2,055 trilhões), Alfhabet/Google (US$ 1,341 trilhão) e Amazon (US$ 1,084 trilhão). Suas capitalizações somavam US$ 9,5 trilhões.

Fora a companhia petrolífera estatal com sede na Arábia Saudita, a maior companhia do ramo do mundo em termos de reservas de óleo cru e de produção, as demais são conhecidas big techs, cujos aplicativos/programas são usados comumente. Mas cabe comparar esse estoque de riqueza, acumulada ao longo de anos, com os fluxos de renda em um ano dos diversos países de continentes mais pobres?

De acordo com a previsão do World Economic Outlook de outubro de 2023 do FMI, o PIB combinado das economias da África seria de US$ 2,867 trilhões, e o das economias da América Latina e do Caribe somaria US$ 6,517 trilhões. Isso representaria um total de US$ 9,4 trilhões. Seria, portanto, um valor inferior à capitalização de mercado das cinco maiores empresas do mundo.

Um leigo poderia deduzir: os acionistas dessas cinco empresas vendem todas suas ações e compram todos os países dos continentes citados: 54 da África, 13 da América do Sul e 25 do Caribe! Como sete das dez maiores cotadas em bolsa do mundo têm bilionários como CEOS ou principais acionistas, somando o valor total de capitalização de mercado US$ 10,2 trilhões, poderiam combinar e comprar mais uma boa parte do mundo!

Ora, aí está a importância de entendimento dos conceitos da Ciência Econômica para os leigos não serem enganados. Quais são os problemas de comparar o Produto Interno Bruto (PIB) nominal de países com estoque de riqueza dos bilionários?

Comparar o fluxo de renda anual de países com o estoque de riqueza dos bilionários apresenta sérios problemas. Essas métricas refletem aspectos diferentes da economia e não são diretamente comparáveis.

O PIB mede a produção total de bens e serviços em um país em um determinado período, no caso, um ano. Ele reflete o valor adicionado na atividade econômica, mas não indica como esse fluxo vira riqueza, distribuída entre os diversos estratos sociais.

Por sua vez, o estoque de riqueza dos bilionários representa a acumulação de ativos financeiros e patrimônio líquido ao longo de anos, no caso, desde quando suas empresas abriram o capital em bolsa de valores para capturar dinheiro de novos associados. Evidentemente, não está diretamente ligado à produção anual, embora a distribuição de lucros e dividendos possa ser relacionada ao valor adicionado na empresa em foco.

A especulação sobre o ganho de capital – comprar a ação mais barata em relação à possível cotação de venda – é a grande motivação dos investidores no mercado secundário de ações. A informação da Forbes diz a respeito do sobe-e-desce dos seus valores de mercado, ou seja, das expectativas incertas sobre os preços futuros.

Caso esses bilionários resolvessem vender todas suas ações para comprar os países, a notícia se espalharia e haveria um crash na bolsa de valores de NYC! Espalharia pelas demais do resto do mundo e a fortuna do “pobre” bilionário se desmilinguiria…

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O estoque de riqueza acionária dos bilionários costuma ser altamente volátil e sujeito a mudanças rápidas devido a flutuações nos mercados financeiros. Comparar isso com o PIB anual, uma medida mais estável de agregado macroeconômico, leva a interpretações equivocadas sobre a saúde econômica em longo prazo de um país – ou de continentes!

A comparação entre o PIB e a riqueza dos bilionários não aborda diretamente a desigualdade econômica dentro de um país. Um país com um alto PIB, mas com uma distribuição de renda desigual, tem sua transformação em riqueza, como em saldos financeiros, cada vez mais concentrada em uma pequena porcentagem da população.

Países com grandes populações, como o Brasil, têm PIBs elevados, devido ao tamanho da sua força de trabalho e mercado consumidor, mas isso não implica em uma alta renda per capita. Da mesma forma, um bilionário, ao habitar em um paraíso fiscal com uma população pequena, tem um impacto significativo no seu estoque total de riqueza, mas isso não reflete a situação da maioria da população. Veja o caso de Mônaco…

O estoque de riqueza dos bilionários é influenciado também por fatores não estritamente econômicos, como herança, investimentos imobiliários e flutuações nos mercados de ações. Já o PIB reflete, principalmente, a produção econômica.

Em resumo, embora ambos os indicadores forneçam informações valiosas sobre a economia de um país, eles abordam dimensões diferentes. Para uma avaliação mais completa, é útil considerar uma variedade de indicadores econômicos e sociais capazes de abordar tanto a produção e originação de renda quanto a distribuição de riqueza, bem como a qualidade de vida da população.

O PIB representa um fluxo, pois quantifica a produção e a renda gerada em um período específico. Por ser uma medida anualizada ou trimestral, reflete a dinâmica econômica, isto é, as variações ao longo de certo tempo.

A riqueza tem como indicador um estoque, representando a acumulação ao longo de vários períodos. Reflete a riqueza total detida em um determinado momento.

Além disso, o PIB nominal e o PIB por Paridade do Poder de Compra (PPC) são duas formas diferentes de medir a produção econômica de um país, e cada uma aborda as comparações internacionais de maneiras distintas. No ranking mundial do primeiro, os Estados Unidos ainda é a maior potência econômica, do segundo, a China o ultrapassou.

O PIB nominal refere-se ao valor total de bens e serviços produzidos por um país em termos de sua moeda nacional corrente. Não ajusta os valores para as diferenças nos preços de bens e serviços entre os países. O PIB por Paridade do Poder de Compra (PPC) leva em consideração essas diferenças, convertendo as moedas locais para uma moeda comum (geralmente o dólar dos EUA) de modo a equalizar o poder de compra.

Portanto, o primeiro, influenciado pelas flutuações cambiais, subestima ou superestima o verdadeiro poder de compra em diferentes nações. O segundo permite uma comparação mais precisa do poder de compra real entre os países. Expõe as diferenças reais no padrão de vida ou bem-estar social.

Mudanças nas taxas de câmbio distorcem a verdadeira variação na produção econômica através do PIB nominal. A apreciação da moeda nacional eleva a posição no ranking. O ranking do PIB por Paridade do Poder de Compra reduz a influência das flutuações cambiais, pois converte as moedas locais para uma moeda comum com base no poder de compra relativo.

O PIB por Paridade do Poder de Compra oferece uma perspectiva mais precisa do padrão de vida da população ao considerar o custo relativo dos bens e serviços, por exemplo, da diferença entre aluguéis. É melhor indicador de desenvolvimento econômico.

Portanto, a Oxfam não deveria usar o PIB nominal para comparar economias africanas, latino-americanas e caribenhas com as fortunas dos maiores bilionários em ações de cotações voláteis, “acumuladas por toda uma vida”. Se fosse o caso – mas não é –, o PIB por PPC seria mais bem empregado para comparar essa riqueza e o poder de compra e consequente padrão de vida das populações desses países.

Ambas as medidas – fluxo e estoque – têm aplicações específicas e fornecem insights diferentes sobre a economia de um país e a riqueza pessoal de bilionários. Literalmente, os ricaços não podem “comprar” toda a economia de uma Nação soberana…

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