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Ambiente político derruba o desmatamento da Amazônia no Brasil

Ambiente político derruba o desmatamento da Amazônia no Brasil

Desde janeiro, Lula adotou uma política de preservação do meio ambiente oposta à de seu antecessor e avançada em relação ao seu próprio governo entre 2003 e 2010. Para tal, ele renomeou Marina Silva como ministra do Meio Ambiente.

POR MÁRIO OSAVA

RIO DE JANEIRO – O desmatamento da Amazônia no Brasil caiu 22,3% no período de agosto de 2022 a julho de 2023, em relação aos 12 meses anteriores, segundo dados divulgados na quinta-feira (9), demonstrando que a política, com seus estímulos e freios, é decisiva nesta questão crucial.

O novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, inaugurado em 1º de janeiro, não teve tempo de recuperar o sistema de fiscalização ambiental desmantelado por seu antecessor, Jair Bolsonaro, que negou o desmatamento e as mudanças climáticas, como costumam negar os políticos da extrema-direita.

Durante o governo Bolsonaro (2019-2022), a Amazônia sofreu um desmatamento crescente de mais de 10 mil km², que atingiu seu nível máximo em 2021, com 13.038 km² e que caiu para 11.594 km² no ano passado.

Houve picos na história da luta pelas florestas amazônicas brasileiras. Em 1988, de forma alarmante, começava a série de destruições da floresta amazônica, com 21.050 km².

A ascensão da invasão promovida pela ditadura militar (1964-1985) ainda estava acontecendo, sob o lema “Terra sem gente para a gente sem terra”, inspirada na criação de Israel na década de 1940: uma terra sem povo para um povo sem terra”.

Era comum, no período mais seco do ano, geralmente entre julho e setembro, a repetida imagem de cidades cobertas de fumaça e aeroportos fechados por visibilidade zero. Cortar e queimar foi a palavra de ordem, inclusive como condição para a posse de terras anteriormente públicas.

Nas últimas semanas, a fumaça voltou a nublar Manaus, capital do estado do Amazonas, cercada por incêndios favorecidos pela forte seca que afetou quase toda a Amazônia brasileira nos últimos meses.

Leito de um rio amazônico convertido em imensas praias, com vazão típica de riacho. As secas, agora mais frequentes e intensas, somam-se ao desmatamento, ameaçando levar a Amazônia a um “ponto sem volta” de degradação irreversível de suas florestas. (Fotos: Carlos Oliveira e Márcio Melo/Seminf).

Altos e baixos do desmatamento

O Prodes, sigla do Projeto Legal de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia por Satélite, informou na quinta-feira (9), uma perda florestal de 9.001 km² no ano 2022-2023. Os dados oficiais sobre o tema, desde 1988, são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) que executa o Prodes.

Sua série histórica mostra altos e baixos no desmatamento, identificado com ciclos de redução e de boom. Em 1995, foi registrado o recorde de 29.095 km² e no início deste século houve um surto de queimadas que atingiu seu ápice em 2004, com 27.772 km2.

Um programa de combate ao desmatamento, promovido pela então e atual ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, durante o governo anterior de Lula (2003-2010), conseguiu reduzir a área desmatada na Amazônia Legal, composta por oito estados e parte de um nono, Maranhão, para 4.571 km², em 2012. Uma redução de 83,5% em oito anos.

A partir daí, porém, o desmatamento medido pelo Prodes cresceu gradativamente e se intensificou durante o governo Bolsonaro, estimulando a expansão agrícola na região amazônica, a mineração até mesmo em territórios indígenas reservados e o desmonte de instituições de comando e controle ambiental.

Lula mais ambientalista

Desde janeiro, Lula adotou uma política de preservação da Amazônia e do meio ambiente em geral, oposta à de Bolsonaro e até em relação ao seu próprio governo de 2003 a 2010.

Para confirmar isso, ele renomeou Marina Silva como ministra do Meio Ambiente. Ela havia renunciado em 2008, após cinco anos no governo Lula, por discordar de seus grandes projetos de infraestrutura, especialmente a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, na Amazônia Oriental.

Foi uma espécie de reconciliação e de reconhecimento do desastre ambiental, social e até energético que é Belo Monte. Mas algumas discrepâncias permanecem, por exemplo, a exploração de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas, defendida por Lula e rejeitada por Silva e pelos ambientalistas em geral.

Veja Também:  Meio Ambiente: O retorno do reprimido

De qualquer forma, o ambiente político favorável às questões ambientais, gerado pela nova eleição de Lula, foi suficiente para estagnar e reverter a tendência de destruição da Amazônia num momento crítico.

Especialistas estimam que o desmatamento da Amazônia chegou muito perto do “ponto sem retorno”, no qual as florestas perdem a capacidade de regeneração e a extinção se torna irreversível. Estima-se que esse ponto esteja entre 20% e 25% da área desmatada.

Alguns investigadores apontam que cerca de 17 ou 18% da região já perdeu a sua cobertura florestal, e há outra grande parte de florestas degradadas com consequências ainda incertas.

Além disso, a Amazônia vive atualmente uma seca excepcional que transformou grandes rios, cuja largura pode chegar a alguns quilômetros, em extensas praias ou terras secas. As águas deságuam em canais que hoje permanecem a centenas de metros da margem original.

A atual seca é agravada pelo fenômeno El Niño – Oscilação do Sul, o aquecimento das águas do Oceano Pacífico. Mas também se tornou repetitivo a cada cinco anos, mais ou menos, até agora neste século.

O efeito sinérgico do desmatamento, dos incêndios florestais e das secas cada vez mais severas na região ainda não é conhecido. Pode, por exemplo, antecipar o temido “ponto sem retorno”. As secas favorecem o desmatamento e os incêndios florestais.

Território do povo indígena Yanomami, em Roraima, estado do extremo norte do Brasil, na fronteira com a Venezuela, em janeiro de 2023. Autoridades ambientais queimam casa e equipamentos dos garimpeiros ilegais que invadiram terras indígenas e poluem os rios, até com mercúrio. (Foto: Ibama).

Desmatamento menos lucrativo

A mudança política é decisiva não apenas para gerar expectativas de repressão aos crimes ambientais, que já aparece como uma ação concreta no combate à mineração informal, conhecida no Brasil como “garimpo”.

Cenas de barcos, dragas e outras máquinas destruídas e incendiadas pela polícia ambiental tornaram-se comuns desde o início do governo Lula. O garimpo tornou-se alvo prioritário após vir à tona o escândalo do massacre de indígenas do povo Yanomami, no extremo norte do Brasil, na fronteira com a Venezuela.

A repercussão da ofensiva policial contra os garimpeiros certamente funcionou como um controle sobre os desmatadores.

A redução das perdas florestais foi possivelmente maior neste ano do que o indicado pelos dados do Prodes. O ano florestal somou um semestre de cada governo, começando em agosto de 2022, quando a destruição foi acentuada pelos estímulos de Bolsonaro e de seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles.

Há também uma mudança nas políticas em relação à propriedade da terra. A especulação imobiliária é a grande impulsionadora do desmatamento, e isso perdeu força num governo que discorda da agricultura de grande escala e prioriza os pequenos agricultores familiares.

Estudos indicam que quase toda a área recentemente desmatada foi destinada à pecuária, mas a produção não é prioridade daqueles que se dedicam ao desmatamento, sob risco de punições judiciais. A propriedade da terra oferece lucros melhores e mais rápidos com menos esforço.

Os territórios indígenas e aqueles protegidos como unidades de conservação são alvos menos cobiçados e menos desmatados, porque não permitem a legalização ou a monetização de sua posse. O interesse está nos 143 milhões de hectares, ou 29% da Amazônia brasileira, de terras públicas ainda sem destinação.

Com o governo do Partido dos Trabalhadores (PT), de esquerda, do qual Lula é fundador e líder histórico, diminuem as expectativas de que invasores e desmatamentos de terras amazônicas se transformem em propriedades com algum valor de venda.


FOTO DESTACADA: O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas, Marina Silva, em Brasília, em junho de 2023. O retorno do líder ambiental ao governo Lula, após um distanciamento de 15 anos, simboliza a nova prioridade ao meio ambiente do governo brasileiro, que desencoraja o desmatamento na Amazônia. (Foto: Joedson Alves/Agência Brasil).

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