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Cidades fantasmas

Cidades fantasmas

Se a Europa fechar suas fronteiras aos imigrantes, como desejam os partidos da extrema-direita, o suicídio demográfico será mais rápido

Nas montanhas de Portugal existem quase setecentas povoações que se tornaram aldeias fantasmas porque nelas já não há mais habitantes. Nos estados alemães de Brandemburgo e Saxonia-Anhalt, prédios em ruína, vitrines tapadas e ruas vazias compõem a paisagem das cidades. E na Itália a pequena e bela Sambuca, na Sicília, pôs à venda casas antigas e abandonadas pelo preço de seis euros para atrair moradores.  Em Civita de Bagnoregio, a duas horas de Roma, vivem apenas doze habitantes. As pessoas que abandonaram todas essas cidades partiram para centros maiores ou para o exterior em busca de emprego. Deixaram para trás suas histórias e as casas onde viveram por séculos suas famílias e seus antepassados.

No caso de Portugal, algumas das aldeias abandonadas apresentam às vezes raro movimento pela curiosidade de alguns turistas e poucos aventureiros. Santo Antônio de Vale de Poldros, no Alto Minho, tem apenas um habitante, Fernando Gonçalves, que tem 52 anos e voltou de Andorra, para onde havia emigrado, para abrir um restaurante na aldeia em que nasceu. A 1.700 metros de altitude, Santo Antônio de Vale de Poldros oferece uma vista a dominar o vale do Rio Vez. Muitos dos poucos que a visitam comparam-na à aldeia dos hobbits, da saga O Senhor dos Anéis. É um lugar muito bonito.

Todas elas, junto com diversas outras aldeias, vilas e cidades pelo território europeu sofrem com o fenômeno do despovoamento que decretou a morte de muitas delas e ameaça o futuro de outras. Seus moradores partiram em busca da própria sobrevivência e já não há tantos nascimentos como acontecia no passado. Quase não há crianças.

Portugal deve perder 1,1 milhões de habitantes nos próximos trinta anos, segundo projeção da ONU. A Alemanha, por sua vez, vai perder onze milhões de habitantes em idade ativa.

Mais caixões que berços

A União Europeia já calculou que até o ano de 2050 vão desaparecer 50 milhões de trabalhadores e a imigração vai disparar. A população está em declínio no Velho Continente, cada vez mais um território de velhos e que hoje produz mais caixões do que berços, diz uma notícia de jornal.

Um estudo da Fundação Robert Schuman, importante centro de estudos da UE, alerta para o que chamou de suicídio demográfico e diz que o cenário é alarmante. Ninguém menciona o problema e, o que é pior, não se prepara para enfrentá-lo. Um dos autores do estudo, o economista Michel Godet, diz que não há consciência da dimensão dessa crise, que não consta da agenda política, apesar do forte impacto que causa na economia do continente. O PIB é mais baixo nos países onde é menor o aumento da população. Até 2040 o potencial de crescimento econômico da Europa vai cair pela metade. Godet chama a atenção para o fato de que o desenvolvimento tecnológico não será capaz de reverter a tendência, pois tanto o crescimento quanto a produtividade têm desacelerado de maneira consistente desde os anos 1980 tanto na Europa quanto no Japão e nos Estados Unidos.

Convulsão social

Há risco de convulsão social antecedida de uma convulsão cultural, alertam cientistas sociais, pois na medida em que a população da Europa vai encolher, a da África vai disparar com mais 1,3 bilhão de habitantes nos próximos trinta anos. “A pressão migratória sobre a Europa será maior do que nunca. Haverá um choque demográfico: uma implosão dentro da UE e uma explosão fora das suas fronteiras”, dizem os investigadores. E no entanto as instituições europeias comportam-se como se este ‘tsunami’ não estivesse prestes a acontecer.

A pressão migratória e a rejeição aos imigrantes, vistos como ameaça, fará crescer a xenofobia, o fortalecimento dos partidos de extrema-direita neonazifascistas e o risco que eles representam para as democracias e o estado de direito. A integração social de pessoas com valores culturais muito diferentes e assim evitar o surgimento de guetos isolados é também um desafio para a Europa. Ao contrário do que acontece na Inglaterra, onde existem quarteirões isolados para os indianos e outros para os africanos.

Portugal é apontado como o país que melhor lida com a integração dos imigrantes pela sua história de contatos com populações distantes e com diferenças culturais desde a época dos Descobrimentos.

Embora nos últimos séculos o normal tenha sido o aumento das populações e em 2025 a população do mundo esteja prevista em oito bilhões de habitantes, ao final deste século sessenta por cento dos países terão números menores de habitantes. Até a China deve apresentar forte declínio populacional a partir de 2030. A diminuição do número de habitantes será a norma, com exceção dos países mais pobres e com baixo nível de cidadania.

Alemanha, Espanha, Hungria, Eslováquia, Portugal, Itália, Grécia, Romênia, Polônia e Geórgia são os dez países da Europa que, entre todos os outros, enfrentarão as maiores quedas em seus números populacionais entre 2020 e 2100, e nisto estão de acordo demógrafos e cientistas sociais.

Para enfrentar o suicídio demográfico, a solução seria implementar políticas de família que promovam a natalidade. As pessoas teriam a possibilidade de ter quantos filhos desejassem sem comprometer o seu padrão de vida. Não haveria necessidade de ir buscar população estrangeira para ocupar os empregos e seria mais fácil a integração dos imigrantes nos países que os acolhessem. A imigração, atualmente, é a única forma de absorver o impacto do declínio das populações e seria irrealista acreditar que uma política de aumento da natalidade faria as pessoas voltarem a ter quatro ou cinco filhos como antigamente. Se a Europa fechar suas fronteiras aos imigrantes, como desejam os partidos da extrema-direita, o suicídio demográfico será mais rápido.

E haverá então mais aldeias e mais cidades abandonadas. Seus antigos habitantes estarão mortos ou terão partido em busca de uma vida melhor.

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