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O nazifascismo no coração da Europa

O nazifascismo no coração da Europa

As eleições europeias de 2024 marcaram mais um avanço dos partidos de extrema-direita na Alemanha e na França e refletiram a mudança no panorama político dos dois países que lideram a União Europeia. Alguns analistas chegam a afirmar que a União Europeia não passa de um projeto geopolítico da Alemanha e da França para exercerem o domínio do continente.

Na Alemanha, o partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD) teve cerca de 16% dos votos, um aumento em relação aos 11% obtidos nas eleições de 2019. O resultado coloca a AfD superando o partido social-democrata (SPD) do chanceler Olaf Scholz, que teve 14,6% dos votos, o pior resultado do partido em uma votação nacional desde a Segunda Guerra Mundial. A campanha da AfD, mesmo com os escândalos envolvendo seus principais candidatos, conseguiu capitalizar o descontentamento com o governo atual, que também viu uma queda no apoio aos seus parceiros de coalizão, os Verdes e os Democratas Livres.

Na França, o partido de extrema-direita Rassemblement National (RN), liderado por Jordan Bardella e Marine Le Pen, alcançou um resultado impressionante, obtendo entre 31,5% e 32,4% dos votos. É quase o dobro do obtido pela aliança centrista do presidente Emmanuel Macron, cujo partido Renascença teve cerca de 15,2% dos votos. A vitória do RN foi tão expressiva que levou Macron a dissolver o governo e convocar novas eleições legislativas, que foram vencidas por uma coalizão das esquerdas. O resultado reflete uma clara mensagem de insatisfação do eleitorado francês com o governo atual e um desejo de mudança política.

Impacto

O avanço da extrema-direita na Alemanha e na França reflete uma transformação política e provoca temor nas consciências que estão ao lado da democracia. Trata-se de uma tendência observada em outros países europeus, onde partidos de direita e extrema-direita ganharam terreno significativo nas últimas eleições. É um fenômeno que desestabiliza o equilíbrio de poder na Europa, com a extrema-direita dos partidos neofascistas ocupando quase um terço dos assentos no Parlamento Europeu. Na Alemanha, o crescimento da AfD representa um desafio direto ao governo de Olaf Scholz, enquanto, na França, a grande votação do RN está provocando uma reconfiguração política.

Embora a extrema-direita tenha avançado tanto na Alemanha quanto na França, existem algumas diferenças importantes entre os movimentos nos dois países.

A comparação entre os números de votos indica que o apoio à extrema-direita é significativamente maior na França do que na Alemanha atualmente.

O RN emergiu na França como a força política dominante no primeiro turno das eleições. Na Alemanha, embora a AfD tenha avançado, ainda não é o partido mais votado, ficando atrás de outros partidos tradicionais.

Enquanto, na França, a vitória da extrema-direita foi tão impactante que levou o presidente Macron a dissolver o governo e convocar novas eleições legislativas, na Alemanha, embora o resultado da AfD tenha sido significativo, não provocou uma reação tão drástica do governo.

A Alemanha, devido ao seu passado nazista, tem uma relação mais complexa com partidos de extrema-direita. Isso pode explicar por que, apesar do avanço, a AfD ainda enfrenta mais resistência do que o RN na França.

Na França, o RN é liderado por figuras que se destacam, como Marine Le Pen e Jordan Bardella. Na Alemanha, a AfD enfrentou escândalos envolvendo seus principais candidatos durante a campanha, o que pode ter limitado seu crescimento. Foram escândalos ligados à espionagem e nazismo explícito.

Enquanto o RN, na França, faz parte do grupo Identidade e Democracia no Parlamento Europeu, a AfD foi recentemente expulsa desse mesmo grupo, indicando possíveis diferenças em suas abordagens e alianças a nível europeu.

Essas diferenças refletem os contextos políticos e históricos distintos de cada país, bem como as estratégias específicas adotadas tanto na Alemanha quanto na França.

Ascensão

Na Alemanha e na França, a ascensão da extrema-direita tem sido apoiada por diversos movimentos, principalmente por movimentos neonazistas independentes.

A Alternativa para a Alemanha (AfD) tem se beneficiado de uma identificação “libertária” e do uso eficaz das redes sociais para atrair jovens eleitores. Esse chamado “oportunismo digital” tem sido uma ferramenta importante para a mobilização e crescimento do partido.

A AfD surgiu como uma resposta anti-establishment, especialmente contra a União Europeia e as políticas de imigração durante a crise dos refugiados. Esse posicionamento atraiu eleitores insatisfeitos com o consenso político tradicional na Alemanha.

O Rassemblement National (RN) tem se apoiado em movimentos nacionalistas que promovem a soberania nacional e a preservação da identidade cultural francesa. Esses movimentos têm feito o partido crescer, especialmente em regiões que se sentem ameaçadas pela globalização e pela imigração.

O RN também recebe apoio significativo de grupos conservadores que se opõem às políticas progressistas do governo, incluindo questões relacionadas à imigração, segurança e valores tradicionais. Esses grupos veem o RN como um movimento a apoiar contra as mudanças sociais e culturais.

Enquanto, na Alemanha, a AfD se destaca pelo uso estratégico das redes sociais e pelo apelo libertário, na França, o RN se apoia mais em movimentos nacionalistas e identitários. Ambos os partidos, no entanto, compartilham um forte componente anti-establishment e se beneficiam do descontentamento com as políticas de imigração e globalização. São movimentos que têm desempenhado um papel importante na legitimação e expansão da extrema-direita em ambos os países, refletindo tendências globais de insatisfação com o status quo político e econômico.

No seio desses partidos há uma forte tendência de oposição ou ceticismo em relação à União Europeia, questionando a integração europeia.

Especialmente na França, há uma forte oposição à presença e influência do Islã, e em ambos os países há críticas às elites políticas tradicionais e às instituições estabelecidas, conservadorismo social e oposição a políticas progressistas, incluindo direitos LGBT e feminismo. Há ênfase em políticas de segurança rígidas e punitivas e resistência aos processos de globalização, vistos como ameaças à soberania nacional e à identidade cultural.

Na Alemanha, o Alternative für Deutschland (AfD) tem sido o principal expoente dessas ideias. Na França, o Rassemblement National (RN, anteriormente Front National) de Marine Le Pen tem sido o principal veículo dessas teses.

Redes sociais

As redes sociais têm desempenhado um papel fundamental na disseminação das ideias da extrema-direita, possibilitando a divulgação de conteúdos radicais e discriminatórios que seriam bloqueados ou filtrados pelos veículos de comunicação tradicionais. Partidos e líderes de extrema-direita utilizam táticas como a publicação em grande frequência de vídeos curtos no TikTok e Instagram, formatos que são favorecidos pelos algoritmos dessas plataformas. Capitalizam a desilusão dos jovens com os partidos tradicionais e com o futuro, apresentando-se como alternativas.

As mídias sociais facilitam também a conexão e articulação entre grupos de extrema-direita de diferentes países, criando uma rede internacional de apoio mútuo.

As plataformas são também usadas para espalhar notícias falsas e teorias da conspiração, que frequentemente alimentam narrativas extremistas. As ferramentas de segmentação das redes sociais permitem que esses grupos atinjam públicos específicos mais suscetíveis às suas mensagens. A extrema-direita tem sido hábil em explorar os algoritmos que essas redes criaram.

*Imagem em destaque: Force Ouvrière/Flickr

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