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Cúpula da Amazônia mobiliza o poder florestal global

Cúpula da Amazônia mobiliza o poder florestal global

O evento, realizado na cidade brasileira de Belém do Pará, reuniu nos dias 8 e 9 de agosto quatro presidentes da bacia e representantes governamentais de outros oito países, com o objetivo de adotar medidas conjuntas para a preservação das florestas tropicais e solicitar apoio financeiro dos países ricos do Norte

RIO DE JANEIRO – Uma tentativa de empoderar os países ricos em recursos florestais nos trópicos, assim como as comunidades indígenas e locais, foi o foco da Cúpula da Amazônia, que reuniu líderes da bacia amazônica na terça-feira (8) e na quarta-feira (9), juntamente com a sociedade civil nos dias anteriores, em Belém do Pará, no norte do Brasil.

“Unidos por nossas florestas” é o título do comunicado conjunto que encerrou a Conferência dos oito países amazônicos, juntamente com Congo-Brazzaville, a República Democrática do Congo, Indonésia – países com grandes florestas tropicais – e São Vicente e Granadinas, como o atual presidente da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (CELAC).

Metade dos seus dez pontos repreende os países industrializados do Norte. Primeiro, por não cumprirem seus compromissos de fornecer US$100 bilhões anualmente para os países do Sul em desenvolvimento enfrentarem a crise climática, 0,7% de sua renda nacional bruta em assistência oficial ao desenvolvimento e US$200 bilhões anualmente até 2030 para a conservação da biodiversidade.

Além disso, o comunicado condena medidas ambientais como uma “restrição disfarçada ao comércio internacional”, exige “acesso preferencial aos produtos florestais” e insta os países ricos a acelerarem a descarbonização de suas economias.

A emergência climática já está afetando as florestas tropicais em todo o mundo, acrescenta o comunicado, em uma aparente resposta às pressões dos países desenvolvidos para acabar com o desmatamento em nações tropicais.

Por outro lado, o reconhecimento da “inestimável contribuição dos povos indígenas e das comunidades locais” para a conservação das florestas tropicais lidera o documento, que convoca os países ricos em biodiversidade e riqueza florestal a participarem do diálogo para maior influência em fóruns internacionais e na gestão de recursos para a conservação.

A cúpula da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) contou com a presença de quatro presidentes de países amazônicos – Bolívia, Brasil, Colômbia e Peru – junto com os dois Congos. Outros membros do grupo – Equador, Guiana, Suriname e Venezuela – foram representados por altos delegados governamentais.

Mais de 800 indígenas marcharam pelas ruas de Belém do Pará em 8 de agosto, durante a Cúpula do Tratado Amazônico. Na Marcha dos Povos da Terra pela Amazônia, representantes dos povos indígenas amazônicos exigiram a defesa de seus territórios, bem como uma maior participação nos rumos da bacia e nas decisões de mitigação e adaptação à crise climática. (Cícero Pedrosa Neto/Amazônia Real)

Indígenas e ambientalistas frustrados

Cerca de 30 mil pessoas participaram das cúpulas paralelas dos povos indígenas durante os “Diálogos Amazônicos” de 4 a 6 de agosto.

A assembleia indígena, composta por mais de 800 representantes da Bolívia, Brasil, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa – parte da bacia, mas não um membro pleno da OTCA devido ao seu status como território europeu – e Suriname, aprovou uma carta aos chefes de estado em que exigem seus direitos, especialmente a demarcação e proteção de seus territórios.

Líderes de organizações indígenas, assim como ambientalistas, lamentaram a ausência de metas e prazos para os principais desafios amazônicos, como o desmatamento, a demarcação de territórios indígenas e áreas de conservação.

“Garantir os direitos dos povos indígenas, comunidades locais e tradicionais” é uma das 113 “decisões” que compõem a “Declaração de Belém”, assinada apenas pelos líderes e delegados dos oito membros da OTCA, estabelecida em 1995 para implementar o tratado assinado em 1978.

A bacia amazônica é um bioma de floresta tropical com 7,5 milhões de quilômetros quadrados e mais de 40 milhões de habitantes, segundo dados do governo brasileiro, dois milhões dos quais pertencem a 500 povos indígenas. A Cúpula de Belém foi a primeira do grupo desde 2009.

“Fui incentivado pelo governo ao reconhecer que as soluções para a Amazônia só serão eficazes com a participação das populações tradicionais, que não podem vir de fora ou de cima para baixo, que o desenvolvimento sustentável só ocorre com e para a população local”, avaliou Manuel Cunha, líder comunitário e atual gestor da Reserva Extrativista Médio Juruá.

O Juruá é um dos principais afluentes do rio Amazonas, onde a reserva de 287 mil hectares se tornou um exemplo de bioeconomia, com cerca de 300 famílias coletando borracha e outros produtos florestais, como óleos de frutas, além de gerenciar populações de peixes amazônicos, como o pirarucu.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, anfitrião da cúpula amazônica, ao final de um encontro bilateral com seu homólogo da República Democrática do Congo, Félix Tshisekedi, juntamente com suas respectivas ministras do Meio Ambiente. O país foi um dos três convidados da África e Ásia, com o objetivo de consolidar uma aliança entre os países detentores de vastas florestas tropicais nas negociações climáticas globais. (Ricardo Stuckert/PR)

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Princípios encorajadores

“Três novidades me encorajaram nesta cúpula”, acrescentou Cunha, um seringueiro de 55 anos que se considera “emprestado pelo governo” como funcionário do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, um órgão do Ministério do Meio Ambiente, para gerenciar a reserva.

Além da participação social, os oito governos prometeram esforços conjuntos para combater o “garimpo”, como é chamada a mineração informal e muitas vezes ilegal que está contaminando os rios com mercúrio, um metal pesado prejudicial ao sistema nervoso, e incorporaram as comunidades locais à bioeconomia.

“É necessário falar sobre socioeconomia, porque apenas a bioeconomia permite incluir o monocultivo de soja, com o uso de agrotóxicos, e a pecuária extensiva”, argumentou Cunha à IPS, por telefone de Coari, durante seu voo de volta de Belém para Carauarí, onde vive às margens do rio Juruá.

A colaboração de todos no combate à mineração é indispensável, pois sua atividade na parte alta de uma bacia “envenena a água de todo o rio, afetando os peixes e depois as pessoas, em um efeito dominó”, explicou.

No bioma amazônico, existem 4.114 operações de mineração garimpeira ilegais, liberando mais de 150 toneladas de mercúrio em seus rios anualmente, conforme relatado pela OTCA. Nos últimos quatro anos, a atividade se intensificou no Brasil durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), que incentivou a mineração até em territórios indígenas.

Além de ações para “erradicar a exploração ilícita de minerais”, a Cúpula Amazônica reconheceu a expansão do crime organizado na região e a necessidade de cooperação regional para lidar com vários crimes, não apenas ambientais.

Um Centro de Cooperação Policial Internacional para a Amazônia terá sede em Manaus, capital do estado brasileiro do Amazonas.

Medo do ponto de virada

No entanto, o desmatamento é a principal ameaça ao bioma. A declaração governamental reconheceu o risco do “ponto de não retorno” ou ponto de virada, há muito alertado pelos pesquisadores para a Amazônia, se a área desmatada ultrapassar 20% de suas florestas.

Além desse ponto, a degradação florestal se torna irreversível e a tendência, de acordo com os climatólogos, é a transformação das florestas tropicais em savanas.

As estimativas atuais de desmatamento variam entre 17% e 18%, mas há um fator de incerteza representado por áreas degradadas, onde ocorreu a supressão parcial da vegetação original, estendendo-se além desses percentuais.

Em grande parte do sul e leste da Amazônia brasileira, onde o desmatamento é intenso, o ponto de virada foi ultrapassado; pesquisas mostraram que as emissões de gases de efeito estufa superam a captação natural da floresta nessas áreas.

No entanto, a capacidade de regeneração florestal pode ser restaurada por meio de reflorestamento extenso e urgente, segundo Carlos Nobre, copresidente do Painel Científico para a Amazônia.

O governo brasileiro estabeleceu como meta o “desmatamento zero” na Amazônia até 2030, mas não conseguiu obter a aprovação da Cúpula como um objetivo geral.

A Declaração de Belém anuncia uma Aliança Amazônica para o Controle do Desmatamento, “para evitar o ponto de não retorno”.

Declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pedindo apoio financeiro das nações ricas, juntamente com as resoluções da Cúpula, transformam as florestas tropicais em um instrumento de poder nas negociações internacionais.

“Se quiserem preservar o que resta das florestas, precisam investir não apenas em cuidar das copas das árvores, mas também do povo que vive abaixo”, disse Lula para cobrar o apoio prometido do “mundo rico” para a mitigação das mudanças climáticas.

Lula, como anfitrião da Cúpula e presidente do país que abriga 62% do bioma amazônico, adotou o ativismo ambiental e climático como um fator de seu protagonismo internacional.

No entanto, ele pode perder sua nova imagem de defensor do meio ambiente se conseguir a aprovação, pelas autoridades ambientais, de perfurações exploratórias de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas.

A autorização, solicitada pela empresa estatal Petrobras, foi negada em maio, mas Lula já declarou ter esperança em uma nova decisão favorável. Na Cúpula Amazônica, ele teve como opositor o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, que propôs abolir a atividade petrolífera em toda a Amazônia, também sem conseguir consenso.

*Imagem em destaque: (Ricardo Stuckert/PR)

**Publicado originalmente em IPS – Inter Press Service | Tradução de Marcos Diniz

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