A grande marcha nazifascista
Dou prosseguimento ao texto aqui publicado na semana passada (clique aqui).
O eurodeputado espanhol Miguel Urbán Crespo, um dos fundadores do partido Podemos, hoje no Anticapitalistas, diz que a extrema-direita cresce e apresenta-se cada vez mais radical enquanto a esquerda é cada vez mais moderada. As derrotas da esquerda têm se dado pela incapacidade de pensar o futuro. A extrema-direita, por seu lado, propõe o regresso a um passado mitificado e irrealizável.
Diferente dos fascismos clássicos, com sua proposta de um futuro distinto do capitalismo liberal, a extrema-direita atual não tem uma proposta de futuro, mas um regresso ao passado. Não se trata de um movimento revolucionário e sim reacionário.
As próximas eleições da União Europeia serão entre 6 e 9 de junho. Os partidos de matiz nazifascista têm como certa a vitória em dez dos 27 países.
Na Holanda, o Partido da Liberdade (PVV), liderado por Geert Wilders, venceu as eleições legislativas antecipadas nos Países Baixos em novembro de 2023, com uma margem esmagadora. O PVV é um partido anti-imigração, anti-islamismo e anti-União Europeia.
A Frente Nacional (FN), de extrema-direita, liderada por Marine Le Pen, é o principal partido de oposição na França. A FN é um partido anti-imigração, anti-islamismo e anti-UE. Nas duas últimas eleições para Presidente ficou em segundo lugar.
A Liga Norte, ou simplesmente Liga, liderada por Matteo Salvini, é um dos principais partidos italianos. É anti-imigração, anti-islamismo e anti-UE.
O Partido Lei e Justiça (PiS), de extrema-direita, tem a maioria dos votos na Polônia. É um partido nacionalista, conservador e populista.
O Fidesz é o partido governante na Hungria. Da mesma forma que os outros de extrema-direita nos demais países, é um partido nacionalista, conservador e populista.
Além desses, segundo as pesquisas que têm sido realizadas, a extrema-direita tem chances de aumentar sua representação no Parlamento Europeu em outros países como Áustria, Alemanha, Dinamarca, Finlândia, Suécia, República Checa, Eslováquia, Bulgária e Romênia.
A estratégia dos partidos nazifascistas que atuam nesses países é a formação de uma aliança entre eles que fortaleça sua influência no Parlamento Europeu e dê suporte à conquista dos governos nacionais onde têm crescido na preferência dos eleitores. Foi realizada uma reunião em Budapeste entre os líderes da extrema-direita da Itália, Mateo Salvini, da Polônia, Mateusz Morawiecki e da Hungria, Victor Urbán. Segundo um comunicado emitido depois dessa reunião, a pauta do encontro tratou da proteção das raízes da Europa contra o “multiculturalismo sem alma”, decorrente da imigração e da defesa da família tradicional.
A crise
Volto aos conceitos de Miguel Urbán. Não poderemos entender a eclosão de um movimento da extrema-direita como este que estamos a presenciar sem entender que estamos diante de uma crise global do neoliberalismo junto com a incapacidade de pensar o futuro. Temos medo do que virá porque a única certeza que temos é a de que vamos viver pior. E a extrema-direita vem e diz que podemos voltar para trás. É um projeto reacionário de volta ao passado diante da crise política e de governança neoliberal.
Como nos anos 1930, quando estávamos diante da ruptura do Império Britânico como potência hegemônica, estamos agora diante da ruptura do império norte-americano como potência hegemônica. Que maior volta ao passado do que o slogan que elegeu Trump “Make America great again”?
No momento reacionário em que nos encontramos, o neoliberalismo cancelou o futuro e passou a pensar apenas em soluções do passado. O medo de pensar o futuro faz com que, pela primeira vez, quando desaparecem as chances de ascensão social, que na verdade nunca existiram, quando o capital mais se acumula e há mais desigualdade, pela primeira vez na história deixamos de olhar para cima e passamos a olhar para baixo. É o campo em que se constrói a extrema-direita, neste olhar para baixo. A questão não é viver melhor ou pior. É não ser como quem está abaixo de nós. E sobre este medo a extrema-direita constrói a lógica de guerra em que a classe média já não aspira ser uma classe média alta e sim a não ser classe operária que, por sua vez, aspira não ser o imigrante que limpa a sujeira das casas. Nesta lógica terrível a extrema-direita apresenta uma solução: vamos voltar ao passado. Se há escassez, que sejam expulsos os extratos sociais que não têm direito aos recursos escassos, ou seja, os setores mais fragilizados da sociedade.
A esquerda não tem dado respostas a essa lógica. No confronto com o radicalismo da extrema-direita nazifascista, ao invés de praticar exercícios de moderação, os movimentos de esquerda teriam de radicalizar-se e voltar a pensar o futuro.
*Imagem em destaque: Manifestantes da marcha de extrema-direita em Charlottesville, 2017, carregando bandeiras dos Estados Confederados da América, de Gadsden e também da suástica nazista (Anthony Crider/Wikimedia Commons).
Poeta, articulista, jornalista e publicitário. Traballhou no Diário de Minas como repórter, na Última Hora como chefe de reportagem e no Correio de Minas como Chefe de Redação antes de se transferir para a publicidade, área em que se dedicou ao planejamento e criação de campanhas publicitárias. Colaborou com artigos em Carta Maior e atualmente em Fórum 21. Mora hoje no Porto, Portugal.
É autor de Poente (Editora Glaciar, Lisboa, 2022), Dezessete Poemas Noturnos (Alhambra, 1992), O Último Número (Alhambra, 1986), O Itinerário dos Emigrantes (Massao Ohno, 1980), A Região dos Mitos (Folhetim, 1975), A Legião dos Suicidas (Artenova, 1972), Processo Penal (Artenova, 1969) e Texto e a Palha (Edições MP, 1965).