TEMPONOITE

TEMPONOITE

(Presídio Político de São Paulo, 1975)

E sobreveio um Tempo sem entranhas. Anos de pedra espessa,/
dias de muro e medo://

a morte invadiu/
com seus exércitos/
o espaço aberto das ruas//

e o silêncio das armas/
sepultou com seus ferros/
e o manto verde-oliva/
os ossos dos meninos trucidados.//

E os coveiros do Continente/
estenderam seu império/
de delatores,/
carrascos,/
elegantes assassinos/
de farda impecável/
e coturnos reluzentes,//

até o porão das fábricas, a marcha dos retirantes,/
os barracos das favelas, os bancos das escolas,/
os sonhos dos saqueados,//

até a última fresta/
onde a boca dos humanos/
passasse ao humano ouvido/
palavras de rebeldia.//

E a noite pensou de si mesma/
que era um Tempo sem prazo,//

sem passado, sem futuro,/
um Tempo que se bastava,/
da própria dor se nutria.//

Os olhos da Noite cega/
não viram fagulhas saltando/
na alma das oficinas,/
não viram tochas ardendo/
na marcha dos retirantes,//

não viram os favelados/
recriando o fogo vivo/
nas estações depredadas,//

e os olhos dos estudantes/
clareando de esperança/
as ruas submetidas.//

Os olhos da Noite cega,/
não viram o sonho do Povo/
reacendendo fogueiras/
no ventre da escuridão/
enquanto busca romper/
as turvas cadeias do sol//

e AMANHECER!

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