Cooperativa de couro é solução para cidade da Paraíba

Cooperativa de couro é solução para cidade da Paraíba

Por Carlos Müller

CABACEIRAS (Paraíba) – A pequena comunidade de Ribeira se destaca no Nordeste, a região mais pobre do Brasil. Não há desemprego aqui. Um em cada cinco habitantes vive direta ou indiretamente da Cooperativa Arteza de Curtidores e Artesãos do Couro.

“Uma ideia tem o poder de transformar o seu mundo”, disse de forma filosófica Ângelo Macio, presidente da Arteza, ao relembrar a criação da cooperativa em 1998, impulsionada por um padre holandês que já não reside mais na região.

“Você chega na comunidade e não vê jovens desempregados, todos trabalham nas oficinas, têm sua renda, criam seus filhos, têm suas casas… o transporte deles. Tudo vem da atividade do couro”, disse ele, enquanto mostrava uma sandália feita por um dos artesãos da cooperativa.

Este é o caso de Tarcísio de Andrade, 29 anos, membro da cooperativa há sete anos. “Sou casado e tenho um filho. Minha esposa não trabalha, mas vivemos todos do meu trabalho na Arteza. Não pretendo sair de Ribeira”, afirmou enquanto confeccionava uma sandália.

A expansão da cooperativa, que conta com um curtume, uma loja de suprimentos e ferramentas, outras lojas que vendem seus produtos e comércio online, impulsionou a economia local. Inicialmente, o curtume processava 800 couros por mês, depois esse número disparou para 12.000, um patamar que os membros jamais imaginaram alcançar. Atualmente, processam 20.000 couros.

Os 1.700 moradores de Ribeira parecem acreditar que tudo é possível.

Antes, não havia posto de gasolina, lojas de departamento nem farmácias. Graças aos lucros da cooperativa, agora a comunidade conta com esses serviços, e as pessoas não precisam mais viajar 13 quilômetros até Cabaceiras, a capital do município de 5.300 habitantes, do qual Ribeira faz parte.

Energia solar, o motor

O sucesso da cooperativa se deve em grande parte à energia solar. Em 2018, ela recebeu equipamentos no valor de US$ 58.728 do governo do estado da Paraíba, onde o município está localizado, com recursos do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA).

As economias obtidas com os 170 painéis instalados foram decisivas.

“A energia solar foi um marco na nossa história. Hoje estaríamos pagando 10.000 reais (US$ 1.755) de conta de energia elétrica só no curtume, e agora caiu para 600 reais (US$ 105). Conseguimos comprar duas máquinas novas que nos permitiram aumentar a produção e melhorar a qualidade das peles”, disse Macio.

Não havia mais necessidade de aumentar o número de painéis, pois, quando foram instalados, já eram o dobro do que era necessário na época. Hoje, com essa energia, seria possível dobrar a produção e processar 40.000 peles.

O plano original era instalar painéis fotovoltaicos no telhado do curtume, mas a diretoria da cooperativa teve uma ideia melhor: construir um novo telhado.

Assim, ampliaram a área de secagem das peles e aproveitaram a oportunidade para captar a água da chuva escassa para o tratamento das peles, que consome muita água. Além da economia, o telhado antigo só conseguia secar 300 peles. Sob os painéis solares, é possível secar 2.500.

Tradição em Couro

No início, os 28 membros fundadores da Arteza contaram com o apoio do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), uma entidade privada financiada por contribuição obrigatória das empresas. Hoje, são 78 parceiros, beneficiando cerca de 400 famílias.

Toda a microrregião do Cariri, onde o município está localizado, e especialmente Ribeira, têm uma longa tradição no trabalho com couro.

O bisavô de Macio trabalhava com couro, mas seus produtos eram rústicos e consistiam principalmente em roupas grosseiras, chapéus e utensílios de trabalho usados pelos vaqueiros para se deslocarem pela caatinga, o bioma predominante no interior nordestino, repleto de plantas espinhosas.

A produção da cooperativa evoluiu de produtos tradicionais devido ao declínio da criação extensiva de gado e ao desejo dos jovens por produtos mais modernos. Hoje, as roupas de trabalho representam cerca de 10% da produção total.

Atualmente, o produto carro-chefe são as sandálias, que representam cerca de 60% da produção total, incluindo carteiras, bolsas femininas e mochilas, o produto mais caro, que custa o equivalente a 150 dólares.

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Ao se juntar à cooperativa, os artesãos podem comprar insumos como cola e ferramentas, além de couro a preço de custo. Aqueles que não são membros e têm outros fornecedores pagam, em média, 40% a mais. Os membros não precisam se preocupar com as vendas: eles entregam o produto à cooperativa, que negocia com os comerciantes.

Quando a cooperativa recebe o dinheiro das vendas, ela deduz o valor dos insumos retirados pelos membros. No final, eles recebem, em média, 30% de lucro.

Alguns artesãos, no entanto, permanecem fiéis aos produtos tradicionais. É o caso de José Guimarães de Souza, que se especializou na produção de curiosos ‘chapéus de chifre’.

Zé, como todos o conhecem, não é membro da cooperativa, embora sua oficina fique a apenas 100 metros dela. Aprendeu o ofício com seu pai, a quem reverencia com uma foto ao lado de um crucifixo, como se fosse um ícone. Ele compra a matéria-prima e vende seus chapéus através de um comerciante local.

Os produtos da cooperativa são vendidos em lojas de artesanato por todo o Brasil, especialmente nas cidades do Nordeste, onde a marca Arteza já é reconhecida. Por isso, com o apoio do Sebrae, a cooperativa está trabalhando para estabelecer a indicação geográfica dos produtos com seu próprio selo no próximo ano.

“Amanhã, tudo pode acontecer…”

Em frente à oficina de Souza, chamada “Artesanato do Zé – O Rei do Chapéu de Bico”, um grafite chama a atenção. Nele está escrito: “Não se preocupe, tudo pode acontecer amanhã, até nada”. É o primeiro verso de uma música folclórica local chamada “A natureza das coisas”.

O curtume estava processando 16.000 peles quando a pandemia começou, forçando a cooperativa a suspender o trabalho por mais de seis meses. Hoje, já atingiu 20.000 unidades. A receita da cooperativa cresceu 70%, incluindo couro e artesanato.

“O impacto da pandemia foi enorme. Fomos quase até o fundo do poço”, relembrou Macio. No final de 2021, a cooperativa começou a divulgar seus produtos pelo Instagram e outras redes sociais para vender online. Inicialmente, esse tipo de venda representava 20% do total. Hoje, chega a 35% e 40%.

No Cariri, não há tanto couro e a cooperativa é obrigada a comprá-lo de outros estados. Agora, o problema da cooperativa é encontrar matérias-primas e mão de obra, pois todos na comunidade, especialmente os jovens, já estão empregados.

“Os artesanatos foram minha sobrevivência. Com eles criei toda a minha família sem precisar sair da minha terra querida”, disse José Carlos Castro, membro fundador e ex-presidente da cooperativa. Ele atualmente trabalha no curtume, fazendo o trabalho pesado: retirando os pelos e as partes defeituosas das peles.

Sustentabilidade

A Arteza é o único curtume que trabalha com produtos naturais, como a casca de anjico (Parapiptadenia rígida), uma árvore nativa de vários países da América do Sul. O processo de curtimento dura um mês. Se fossem usados produtos químicos, como o cromo, esse processo levaria apenas dois dias.

“Maintemos um processo natural para evitar danos ao meio ambiente e prejuízos à saúde das pessoas. O processo natural está no nosso DNA”, explicou Macio. No entanto, surgem dificuldades. As árvores existentes na região não são suficientes, embora a cooperativa evite o consumo predatório.

Há alguns anos, quando a casca era retirada, a árvore morria. Hoje em dia, a árvore é cortada e brota novamente, podendo ser cortada de novo após cinco a seis anos. O que foi cortado é então retirado da árvore, passado por um triturador e colocado em tanques com água, onde libera o tanino.

Quando o tanino se esgota, a casca é utilizada como cobertura para o plantio da palma forrageira, um tipo de cacto usado na alimentação animal durante a estação seca. A água é tratada e devolvida à natureza, e os galhos de anjico, depois de descascados, são usados para cercas.

Texto originalmente publicado pela Inter Press Service (IPS)

Na imagem, José Carlos Castro, sócio fundador e ex-presidente da Cooperativa Arteza em Ribeira, distrito de Cabaceiras (PB) / Carlos Müller / IPS

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