REFORMA TRIBUTÁRIA E EMENDAS PARLAMENTARES

REFORMA TRIBUTÁRIA E EMENDAS PARLAMENTARES

O que está no radar é uma reforma tributária, que seria complementar à reforma fiscal-monetária instituída no “arcabouço” de Fernando Haddad. Ninguém sabe, por enquanto, qual será seu verdadeiro perfil.

Escrevi anteriormente sobre o que considero uma aberração orçamentária num regime parlamentarista, ou seja, as chamadas “emendas parlamentares”. Com Temer e Bolsonaro, eram a principal razão de corrupção de congressistas, já que, através da aprovação de emendas, grande parte deles conseguiu, no passado,  promover, em conluio com o Executivo, licitações fraudulentas de obras públicas, principal fonte de propinas em seu favor e em favor de empresários coligados.

            Conforme entendo, emendas parlamentares deveriam desaparecer de nossa institucionalidade. Elas distorcem o orçamento central do governo porque o desviam das prioridades estabelecidas pelo Executivo, de acordo com suas promessas eleitorais de campanha. Ao Parlamento deveria caber, estritamente, a aprovação do orçamento, seu acompanhamento e sua aprovação ou rejeição. É assim que acontece nos regimes democráticos, com divisão de Poderes entre Executivo, Legislativo e Judiciário.

            Não tenho ilusão, porém, quando ao fato de que esse sistema não vai mudar a curto prazo no Brasil. Para mudar seria necessário que o Congresso decidisse nesse sentido, contra os seus próprios interesses mesquinhos. Alterações fundamentais na divisão dos Poderes da República dependeriam de uma nova Constituinte. E isso não está no radar. Devemos nos submeter, pois, ao “princípio da realidade”, e ver como o sistema pode melhorar a partir, pragmaticamente, do que está aí.

            O que está no radar é uma reforma tributária, que seria complementar à reforma fiscal-monetária instituída no “arcabouço” de Fernando Haddad. Ninguém sabe, por enquanto, qual será seu verdadeiro perfil. É um campo extremamente complicado de disputa de interesses, que se reflete num sistema absurdamente ineficiente em termos econômicos e especialmente sociais, sendo um dos responsáveis pela terrível e injusta distribuição de renda no país e de sua concentração.

            Minha sugestão é que a reforma tributária resolva simultaneamente a questão das “emendas parlamentares”, sem acabar com elas, mas tornando-as aceitáveis do ponto de vista econômico e moral. Hoje, as fontes de tributos mais relevantes do país são o petróleo, o agronegócio e a mineraçao. Efetivamente nossas mais lucrativas atividades empresariais, elas pagam poucos tributos, ou quase nenhum. O agronegócio e mineração, originalmente da esfera estadual (ICMS), são subsidiados na prática.

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É que esses tributos aplicados sobre exportações foram transferidos para a esfera federal, e a União não o cobra direito nem o transfere aos Estados e Municípios, como havia sido previsto na lei Kandir. Com isso, ao longo dos anos, os Estados sofreram um calote do governo de quase um trilhão de reais, recentemente negociado, no âmbito do STF,  por menos de 60 bilhões. Claro, isso é um esbulho. E é a melhor explicação para a situação de penúria financeira da maioria dos Estados menores.

O petróleo é um caso parecido. Os governos Temer e Bolsonaro abriram mão de parte relevante da receita de tributos sobre exportação de petróleo em favor das multinacionais. Perdemos bilhões de dólares. Só recentemente, com a mudança de governo, Fernando Haddad propôs aumentar esse tributo. É um bom começo. Mas creio que não basta. Pode ser mais efetivo, se viabilizado no âmbito de um acordo sobre “emendas parlamentares” na forma adiante.

Minha sugestão é que o ICMS seja partilhado pelos três níveis de governo, e que incida sobre as exportações tanto do agronegócio quanto do petróleo cru e da mineração, em montante suficiente para financiar de forma equilibrada os orçamentos públicos, com alíquota distribuída igualmente entre União, Estados e Municípios.  Essas alíquotas, para facilitar a aprovação da reforma, seriam vinculados a “emendas parlamentares” federais, e o outro tanto a “emendas parlamentares” aprovadas nas assembleias legislativas.

 Isso, embora não resolva a questão moral da destinação das emendas, resolve, em parte, ao menos a questão de suas fontes, que se tornariam institucionalizadas. E isso é bom para a democracia. É que, atualmente, não há controle real sobre doação de empresários para financiamento de campanhas eleitorais, colocando alguns candidatos em situação privilegiada em relação a outros, e mais sujeitos a cooptação por parte de magnatas das classes dominantes, que hoje controlam o Congresso. Para complementar a reforma, e uma vez concentrada a arrecadação estadual e federal nas linhas de produtos mencionadas, os bens e serviços de consumo popular e da classe média deveriam ficar isentos de ICMS.

Já os tributos federais seriam ajustados a esse esquema, e alguns deles poderiam desaparecer,  simplificando o processo tributário. Já o agronegócio, que desempenha papel estratégico na formação de reservas da economia, tem suficiente renda para arcar com esse custo tributário maior.

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