A sociedade civil e o apoio à democracia

A sociedade civil e o apoio à democracia

O governo vai necessitar de apoio permanente de instituições organizadas da sociedade como ABI, OAB, CNBB, associações sindicais, profissionais, comunitárias, religiosas e movimentos sociais.

Quando o inimigo avança, nós recuamos. Quando o inimigo estaciona, nós fustigamos. E quando o inimigo recua, nós avançamos (Mao Tse Tung, ou Mao Zedong, na grafia atual)

A política é uma atividade complexa que não pode ser reduzida a um único fator, como é frequente acontecer na direita – onde tudo se explica pelo combate ao comunismo – e até mesmo na esquerda, onde às vezes tudo é reduzido a uma única causa: é culpa da CIA ou do imperialismo americano. Com isso, a complexidade das ações e relações políticas se perde em favor de uma causalidade única.

Entre nós, o raciocínio estratégico nem sempre prevalece. A citação acima não é neutra: o objetivo é defender a tese de que é mais seguro avançar agora, com o inimigo recuado, do que mais adiante, com sua recomposição. O desastroso vandalismo terrorista dos bolsonaristas enfraqueceu os militares, que lhes deram guarida nos acampamentos e até mesmo, em alguns casos, deram apoio direto, como foi também o caso da PM de Brasília. O bolsonarismo, em geral, saiu muito enfraquecido na opinião pública.

O governo Lula saiu fortalecido da invasão dos bárbaros, dentro e fora do país. Já antes da eleição, o Presidente Biden enviou diversos diplomatas para defender o sistema eleitoral e dar recado aos militares: Nada de Golpe. A razão é simples: Lula é o mal menor. Bolsonaro apoia Trump que apoia Putin, dois inimigos de Biden. A vitória da extrema-direita na eleição brasileira teria impacto na geopolítica mundial, uma vez que as redes de extrema-direita estão articuladas internacionalmente.

Ora, o momento é propício para avançar, já que o “inimigo” está enfraquecido. Lula falou grosso em 12/1, afirmando que as Forças Armadas não são poder moderador. Disse mais, afirmou que as portas do Palácio foram abertas a partir de dentro, onde se encontravam militares e PMs. E, em 21 de janeiro, demitiu o Comandante do Exército e nomeou outro que, embora de passado discutível, fez um discurso defendendo a democracia e o respeito ao resultado das urnas.

Espero que esse espírito contamine o Ministro da Defesa que vem se comportando de forma demasiado conciliadora, como ocorreu com sua declaração a respeito dos “democratas” acampados em frente ao QG do Exército em Brasília. É verdade que ele se equilibra numa delicada corda bamba, mas deve se comportar mais como Ministro do Governo e menos como porta-voz dos militares.

Agora, a hora é de avançar, sob pena de perdermos esse momento em que a correlação de forças políticas nos é favorável. Acho também que Alckmin, com sua cara de bonzinho, devia dar declarações fortes em defesa da democracia e em repúdio à cumplicidade da PM e dos militares com o vandalismo terrorista de domingo 8 de janeiro.

O PT governou o Brasil durante 14 anos. 8 anos de governo Lula, 6 anos de governo Dilma. Não se trata aqui de analisar os inegáveis avanços ocorridos nesse período, mas chamar a atenção para o fortalecimento da direita no Brasil.

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Trata-se de um fenômeno internacional, não apenas brasileiro. Para ficar só na Europa, partidos de extrema-direita se fortaleceram, como na França, e alguns chegaram ao poder, como na Hungria, Polônia e agora na Itália, todos apoiados pelo presidente Putin que, por ter conflitos com os EUA, alguns ainda não perceberam que é um governante de direita à frente de um país capitalista.

No Brasil, o pavio foi aceso com o impeachment da presidente Dilma. Em que pesem seus erros – que não foram poucos – ela não cometeu crime nenhum que justificasse seu impeachment. A partir daí, a porteira foi aberta e, com o apoio da mídia a serviço do neoliberalismo – que continua forte no Brasil – a extrema-direita encontrou seu líder num deputado corrupto, boçal e fascista, que pregava abertamente a ditadura militar contra as garantias democráticas previstas na Constituição.

Após o vandalismo bolsonarista no assalto aos três poderes da República no domingo 8/1, ficou escancarado para a opinião pública que setores da Polícia e das Forças Armadas apoiam um golpe para implantar uma ditadura militar. A PM de Brasília apoiou diretamente, o Exército apoiou indiretamente, sendo que, em alguns casos, deu apoio direto ao vandalismo bolsonarista, além de abrigar terroristas no acampamento do QG do Exército, sabendo muito bem de quem se tratava e o que pretendiam fazer.

Se em 14 anos de controle do Estado pela esquerda não foi possível enfraquecer a extrema-direita, não é difícil concluir que será necessário mobilizar a sociedade civil para a defesa da democracia. Organizar comitês ou grupos de apoio à democracia a partir das entidades populares e dos movimentos sociais existentes, ampliando para setores sociais não organizados que apoiam a democracia e rejeitam o fascismo. A realização de manifestações populares esporádicas é importante e necessária, mas não é suficiente.

A invasão violenta das sedes da Presidência, do Congresso e do Supremo Tribunal e a destruição do patrimônio público constituem uma ameaça à democracia que não desaparece com o fracasso da intentona fascista que utilizou o lúmpen como bucha de canhão. Os empresários que financiaram e os estrategistas que conceberam e articularam precisam ser presos o quanto antes. Parece que estão sendo identificados e serão presos, esperamos.

O Governo Lula faz o seu papel e cumpre o seu dever de exigir o cumprimento da Constituição. Para alcançar esse objetivo, vai necessitar de apoio permanente de instituições organizadas da sociedade como, por exemplo, a ABI, OAB, CNBB, Associações sindicais, profissionais, comunitárias, religiosas e movimentos sociais.

O Estado isolado tende a se enfraquecer, por mais importante que seja sua atuação. A plena defesa da democracia exige a organização e a mobilização permanente da sociedade civil.

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