Abuso da liberdade de expressão e guerra civil
Um observador crítico sistemático não é só quem analisa e avalia informações, eventos ou fenômenos de forma metódica, qualitativa e quantitativamente. Este utilizaria uma abordagem sistêmica para observar e interpretar dados, procurando identificar padrões, tendências, contradições e inconsistências.
Além disso, um observador crítico construtivo também é capaz de questionar suposições, reconhecer vieses e considerar múltiplas perspectivas ao formar suas análises e conclusões. Ele busca compreender, de maneira profunda, o sistema complexo observado, emergente de interações de múltiplos componentes e pessoas, adotando uma postura crítica e reflexiva em relação ao objeto de estudo.
Na rede social (virtual em lugar da presencial) há confusão entre crítica positiva e crítica destrutiva. Esta ocorre quando as pessoas têm dificuldade em distinguir entre feedback construtivo e críticas prejudiciais ou destrutivas.
A crítica positiva é oferecida de maneira construtiva, com o objetivo de ajudar um governo a melhorar algo importante para o bem-estar social. Geralmente, é específica, objetiva e oferece sugestões para aprimoramento. O foco está em identificar pontos fortes e áreas de melhoria de forma construtiva e respeitosa.
Em contraponto oposicionista, a crítica destrutiva é feita de maneira negativa, muitas vezes sem oferecer soluções ou sugestões úteis. Os extremistas, sejam de direita, sejam de esquerda, abusam da crítica pessoal, insultuosa ou desdenhosa, com objetivo de minar a confiança, desmotivar e causar danos à reputação da pessoa ou do governo criticado. Agem em um processo de sabotagem.
As críticas construtivas, apresentando alternativas viáveis, são valiosas para o crescimento pessoal, profissional e governamental, enquanto as críticas destrutivas são apenas prejudiciais e contraproducentes. A chave está em como a crítica é entregue e recebida: com respeito mútuo, abertura para aprender e foco na resolução de problemas com apresentação de alternativa.
A liberdade de expressão sem limites, em redes sociais, só contribui para o aumento das tensões e divisões, em uma sociedade, especialmente se essa liberdade for utilizada para incitar violência, disseminar ódio ou promover ideologias extremistas de direita ou de esquerda. Em contextos nos quais existem profundas divisões étnicas, religiosas, políticas ou sociais, a liberdade de expressão ilimitada amplifica essas divisões e visa criar um clima de conflito.
Se as mensagens de ódio e incitação à violência se espalham livremente sem nenhum tipo de restrição ou consequência para o odiento, isso alimenta o ressentimento e a hostilidade entre diferentes grupos, aumentando o risco de confrontos violentos, chegando até mesmo a uma guerra civil.
Portanto, enquanto a liberdade de expressão é um direito fundamental em uma sociedade democrática, necessita-se encontrar uma moderação entre esse direito e a proteção contra os discursos apenas incitadores da violência por causar danos à coesão social e à segurança pública. Envolve estabelecer limites legais e políticas com proibição do discurso de ódio e a incitação à violência, em geral, de idiota sem consciência de fazer mal a si próprio e aos outros.
O odioso incita o ódio e causa indignação. Seu complexo de inferioridade perante a quem critica, pessoalmente, é execrável por ele não conseguir suportar o sucesso de um adversário político. Sendo-lhe insuportável a derrota, expressa ou propaga o ódio. Seu comportamento reprovável merece condenação pública e judicial.
As plataformas de redes sociais como Facebook e Twitter (X) têm algum (não absoluto) poder de conectar pessoas, disseminar informações e até mesmo influenciar comportamentos. Não devem tentar moldar ou transformar a maneira democrática e institucional como nos relacionamos.
Há limites para a liberdade de expressão, de acordo com as leis e normas culturais de cada país. Ela não protege discurso odiento, para incitar à violência, com difamação, ameaças, calunias, pornografia infantil etc.
Discurso de ódio se insere entre outros tipos de conteúdo considerados ilegais ou prejudiciais. As plataformas online também devem ter políticas próprias sobre o permitido ou não em seus espaços de comunicação. Musk (X) cortou a moderação!
As plataformas têm o poder de controlar as manifestações de ódio e agressão através de políticas de uso proibitivas desse tipo de comportamento. Elas necessitam implementar sistemas de moderação de conteúdo, como filtros automáticos e equipes dedicadas a revisar denúncias de usuários.
Além disso, as plataformas devem promover a conscientização sobre comportamentos aceitáveis. Encontrar o equilíbrio entre a moderação e a liberdade de expressão é um desafio constante.
As mensagens influenciam a formação da opinião pública. Moldam a percepção de pessoas sobre questões sociais, políticas, econômicas e culturais, dependendo da forma como são apresentadas e disseminadas em tempo real.
A credibilidade da fonte, a veracidade da informação e a diversidade de perspectivas nem sempre desempenham um papel crucial na formação da opinião pública. Diante disso, “a opinião pública é a pior entre todas as opiniões”!
Ela pode ser influenciada por desinformação, polarização e manipulação. Nem sempre os internautas navegantes estão conscientes da origem e do contexto das informações recebidas e são críticos ao avaliar diferentes pontos de vista.
A diversidade de opiniões é fundamental em uma sociedade democrática, e o diálogo construtivo leva a um entendimento mais amplo e informado dos problemas. Entretanto, a manipulação da opinião pública ocorre de várias formas.
Extremistas fazem a disseminação deliberada de informações falsas ou enganosas para influenciar as opiniões das pessoas. Essa política de desinformação se junta à propaganda de seu credo com uso de técnicas persuasivas para promover uma agenda política, ideológica ou religiosa.
Daí a polarização provoca a ampliação das divisões sociais e políticas para incitar conflitos e aumentar a discordância entre grupos de pessoas. Faz coleta e uso não ético de dados pessoais para segmentar e direcionar mensagens específicas para acirrar as divisões regionalistas, psicográficas ou comportamentais.
Abusa de uma indevida manipulação e exploração de emoções como medo, raiva ou esperança, para influenciar as opiniões e os comportamentos. As pessoas nem sempre estão atentas e críticas em relação às informações consumidas.
A opinião pública uniforme refere-se à convergência geral das opiniões e atitudes de uma sociedade nacional em relação a um determinado assunto, geralmente resultante de um consenso ou pacto social-constitucional. Nem sempre é possível encontrar uma opinião uniforme sobre todos os temas, mas a tolerância respeitosa com a divergência saudável, para o debate público, é necessária.
Em algumas questões, a opinião pública se torna mais polarizada, com diferentes grupos acirrando visões divergentes. No entanto, a opinião pública necessita se unificar em torno de uma Constituição Nacional, especialmente em resposta a eventos ou crises, cuja solução exige um amplo consenso entre os cidadãos.
Uma guerra civil entre cidadãos de uma sociedade nacional tem o risco de ser desencadeada por uma combinação de fatores como divisões étnicas, religiosas ou ideológicas. Profundas e históricas, elas se manifestam em conflitos de identidade e rivalidades entre grupos dentro de uma sociedade.
Tensões e conflitos entre diferentes facções políticas, exacerbadas por questões como distribuição desigual de poder, recursos e oportunidades, levam às disputas até chegar à luta armada. Desigualdades econômicas e sociais com pobreza extrema, corrupção, exclusão política e marginalização de certos grupos, alimentam ressentimento e descontentamento generalizado.
Disputas por territórios, recursos naturais ou fronteiras se intensificam e levam a confrontos armados entre diferentes grupos dentro de uma nação. Fraqueza institucional, corrupção, abuso de poder, falta de Estado de Direito e violações dos direitos humanos minam a confiança dos cidadãos nas instituições e levam à violência, devido à insatisfação generalizada. Muitos morrem, todos perdem.
Um populista de extrema-direita (ou esquerda) irresponsável pode detonar “o barril de pólvora”. Extremistas só contribuem para o surgimento de uma guerra civil!
Fernando Nogueira da Costa é professor titular do Instituto de Economia da UNICAMP. Obras (Quase) Completas em livros digitais para download gratuito em http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/). E-mail: [email protected].