A realidade dos fatos
Seleção dos principais estudos internacionais da semana – Survival of the richest (Oxfam), World employment and social outlook: Trends 2023 (OIT), La seguridad alimentaria y la nutricion em el Mundo (FAO), Tendencias mundiales de la libertad de expresión 2021-2022 (Unesco) e Transforming education with equitable financing (Unicef) – divulgados pela Inter Press Service (IPS).
O aceno darwiniano em “Survival of the Richest” (“Sobrevivência do mais rico”), título do recém-divulgado relatório da Oxfam, não poderia ser mais apropriado. Lançado nesta semana, quando acontece o Fórum Econômico de Davos, na Suíça, o documento acusa, aponta e cobra medidas contra o abismo social entre o 1% de super-ricos e os 99% da população mundial. Entre elas, aplicação de um imposto, de até 5%, sobre a riqueza dos bilionários.
Desde 2020, com a pandemia e a carestia, o 1% mais rico do mundo se apropriou de US$ 26 trilhões (63%) da nova riqueza gerada neste período, enquanto US$ 16 trilhões (37%) chegaram aos 99% da população mundial. Conforme enriquecem os mais ricos, empobrecem os mais pobres, em velocidade e distância impressionantes: “para cada dólar da nova riqueza global recebido por uma pessoa entre os 90% mais pobres da humanidade, um bilionário embolsa US$ 1,7 milhão”, aponta Isabela Raia em análise publicada na Inter Press Service (IPS).
Fortunas que aumentam US$ 2,7 bilhões por dia, fruto de descontrolada especulação. Essa é a balança do desnível que garantiu, por exemplo, que 30 milionários na América Latina e no Caribe ingressassem no clube dos super-ricos, enquanto 12 milhões de pessoas no continente foram empurradas para a extrema pobreza.
Estudo da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), “La seguridad Alimentaria y La Nutricion en el Mundo“, estima que 130 milhões de latino-americanos e caribenhos não possuem mais recursos para garantir uma alimentação saudável. Dessa população, 8 milhões perderam sua capacidade aquisitiva após 2020.
No Brasil, 33 milhões passam fome, em uma escalada da miséria que precede a pandemia. Em Da Fome à Fome, coletânea de artigos organizada pela ex-ministra Tereza Campello e Ana Paula Bortoletto, ambas da Cátedra Josué de Castro (Saúde Pública-USP), demonstra como um país modelo em segurança alimentar conseguiu retornar ao Mapa da Fome das Nações Unidas, após o desmonte de sua rede de proteção social. Políticas como aumento do salário mínimo e inclusão da população no trabalho informal são fundamentais na reversão desse processo.
A previsão, porém, não é das melhores.
Relatório da Organização Internacional Trabalho (OIT), também reportados pela IPS, “World Employment and Social Outlook: Trends 2023” estima que três milhões de pessoas ficarão desempregadas no mundo, somando 208 milhões de desocupados no planeta.
Em 2022, a participação das mulheres na força de trabalho global chegou a 47,4 %, a dos homens a 72,3 %. Isso significa que para cada homem economicamente inativo, existem duas mulheres na mesma situação. Para os jovens, em relação aos adultos, o desemprego é três vezes maior. 23,5% da juventude mundial não trabalha e não estuda (“nem-nem”).
Os alunos mais pobres, por sua vez, estão se beneficiando cada vez menos da educação pública. Examinando investimentos públicos na educação de 102 países do mundo, o relatório “Transformar la educación mediante una financiación equitativa” da UNICEF indica que, em media, alunos mais pobres usufruem 16% do financiamento destinado à Educação pública, enquanto os mais ricos usufruem de 28 %. Resultado: dois terços das crianças de 10 anos do mundo não conseguem ler ou entender uma história simples, destaca reportagem da IPS.
Uma realidade brutalmente desigual e implacável para quem precisa aprender e, também, para quem ousa denunciar os abusos.
Segundo o último estudo da Unesco “Tendencias Mundiales de la Libertad de Expresión 2021-2022″, 86 jornalistas foram assassinados em 2022; 44 somente na região da América Latina e Caribe, a mais violenta região para o exercício da profissão. Estima-se que nos últimos cinco anos, 85% da população mundial experimentou uma efetiva redução da liberdade de imprensa em seus países.
Fatos e dados de um mundo submetido ao poder dos super-ricos.
Repórter do Fórum 21, com passagem por Carta Maior (2014-2021) e Blog Zé Dirceu (2006-2013). Tem doutorado em Semiótica (USP) e mestrado em Crítica Literária (PUC-SP).