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POR UMA EDUCAÇÃO PÚBLICA COMPROMETIDA COM O PENSAMENTO CRÍTICO

POR UMA EDUCAÇÃO PÚBLICA COMPROMETIDA COM O PENSAMENTO CRÍTICO

A revogação do Novo Ensino Médio é uma causa nacional que unifica o campo democrático e social

No contexto das reformas de base, no início dos anos 1960, Paulo Freire promoveu uma ruptura com as concepções de alfabetização predominantes, defendendo que o próprio processo de letramento deveria vir acompanhado da conscientização histórico social.

Em um contexto de acirramento de lutas no campo, opondo latifundiários reacionários e as Ligas Camponesas, Freire definiu como nervura central da educação o objetivo de, dialogicamente, elevar a consciência  intransitiva e a transitividade ingênua, fatalista, dogmática, resignada diante da exploração e das opressões, para o patamar da consciência transitiva crítica, comprometida com o conhecimento rigoroso da natureza e das relações sociais.

Essa perspectiva educacional levou Freire a ser cassado pelo primeiro Ato Institucional, ao lado de Anísio Teixeira, cujo suposto crime foi defender a escola pública laica e comum a todo o povo, e de Darcy Ribeiro que, além destas causas, foi cassado pelo seu trabalho em defesa dos povos originários e de uma universidade pública comprometida com os problemas dos povos.

A ditadura empresarial-militar buscou apagar essas heranças democráticas. Impôs uma política educacional em que a expansão da escola pública veio acompanhada de um esterilizante tecnicismo educacional direcionado para a formação de capital humano, nos termos da Escola de Chicago e, revelando o caráter de classe da ditadura, buscando direcionar a formação dos segmentos populares para uma profissionalização rudimentar e precoce no Segundo Grau.

Disciplinas como história e geografia foram dissolvidas na área de Estudos Sociais fortemente laudatória das bases da modernização conservadora.

Esses breves apontamentos são importantes para destacar que a direita e os aparelhos privados de hegemonia do capital (APH), como os que dirigem o Sistema S, nunca admitiram que o país tivesse uma escola pública nos moldes das revoluções burguesas clássicas.

Vale lembrar que na Revolução Francesa um objetivo da escola era formar ´cidadãs/ cidadãos insubmissas/os! ´

Por isso, a educação, nos termos da Constituição Federal de 1988, tem sido sistematicamente atacada tanto pela extrema direita, como pelos agentes da austeridade autocrática.

A ampliação da escolaridade obrigatória para a educação básica, conquistada no segundo governo Lula, compreendendo a educação infantil, o ensino fundamental e o ensino médio, significou uma transformação de escala monumental.

Evidentemente, a educação básica demandaria reformulações das etapas até então separadas na busca de novas sínteses que conformariam o conceito de educação básica como a conclusão de uma etapa em que todos os estudantes poderiam ter vivos conhecimentos científicos, tecnológicos, artísticos e culturais, indispensáveis para a vida social e para enfrentar os grandes dilemas da humanidade.

Os aparelhos privados de hegemonia do capital (APH), especialmente Itaú Social, “Todos pela Educação”, Fundação Lemann, nunca aceitaram que, doravante, todas as crianças e jovens pudessem compartilhar de uma formação científica e cultural ampla, que as permitissem seguir seus sonhos e expectativas de futuro, seja no caminho de uma educação politécnica sofisticada, como presente nos Institutos de Educação Tecnológica, seja prosseguindo sua formação em nível superior, em universidades públicas.

A avaliação econômica do “bloco hegemônico” é que a força de trabalho no Brasil deve ter uma formação utilitarista, carregada da ideologia do auto empreendedorismo e desvinculada da ciência, da arte e da cultura.

Foi no contexto do golpe em 2016 que os referidos APH empresariais, com o apoio do Banco Mundial, viram a oportunidade de levar adiante seu intento de tornar a conquista da educação básica de caráter científico e cultural letra morta.

E isso foi feito por meio da edição de uma Medida Provisória da lavra do governo Temer que, de modo exótico, instituiu a reforma do ensino médio, esvaziando os conhecimentos como competências insípidas e instaurando cinco itinerários formativos, desagregando as ciências da natureza e os conhecimentos histórico-sociais, resgatando aspectos centrais da educação no período da ditadura.

Após sua aprovação como lei, ainda no governo Temer, os mencionados APH lograram regulamentar a implementação do Novo Ensino Médio (NEM) no governo Bolsonaro, um governo que tratou a educação no âmbito da guerra cultural.

A eleição de Lula mobilizou entidades acadêmicas, sindicais, escolas, universidades em defesa da democracia.

A luta de seus sujeitos, milhões de estudantes, professores, parte significativa da comunidade científica e cultural que, desde 2016, está irmanada na defesa da revogação do chamado NEM efetivado por Temer e Bolsonaro.

Já no processo eleitoral ficou evidente que a educação mercantilizada, amplamente majoritária no ensino superior, e a educação básica, dirigida ideologicamente pelas organizações empresariais, não contribuem para a formação da consciência crítica, democrática, o que fica patente ao verificar a relação entre a escolaridade e o voto na via neofascista, o mesmo se passando com o negacionismo e o recrudescimento de disposições de pensamento reacionários.

Mais de 300 entidades, movimentos, coletivos que protagonizaram as lutas nas esferas da educação, da ciência e da cultura expressaram profunda preocupação com o relatório da Comissão de Transição que, no que tange à educação, foi largamente constituída pelos representantes das organizações empresariais que criticaram o governo Bolsonaro por não ter sido eficaz na plena implementação do NEM.

Desde então, manifestos, mobilizações sindicais, abrangendo todos os sindicatos da educação, e estudantis, debates parlamentares vêm instando os dirigentes do MEC a reconsiderar o propósito de implementar uma política que somente agravará o apartheid educacional no país, afastando a juventude de uma educação capaz de assegurar que cada jovem possa ser um dirigente, um intelectual organizador de um novo mundo justo e igualitário, alterando o senso comum em prol da generalização de um bom senso democrático.

O presidente Lula captou a frustração generalizada diante da posição do MEC de levar adiante o NEM, admitindo, apenas, discutir a forma de sua implementação.

O presidente da República determinou que o tema seja rediscutido de modo amplo, visto o evidente desencontro entre os professores, estudantes e comunidade acadêmica e os principais dirigentes do MEC que, quando estiveram no governo do Ceará, implementaram políticas afins às dos referidos APH.

É importante ressaltar que o processo de revogação do NEM demanda a suspensão do calendário de implementação previsto para 2023 e a desvinculação deste processo dos exames do ENEM, pois, caso contrário, estaríamos diante de um fato consumado.

Existem bases curriculares que podem servir de ponto de partida, como as construídas no primeiro governo Dilma Rousseff em 2012, possibilitando um processo de debate que pode ser concomitante com o restabelecimento das diretrizes que possibilitem a tardia, mas necessária, concepção de educação básica como um direito alienável de todo o povo.

O Fórum 21 compreende que o tema da educação popular, que abrange a educação pública, é uma frente crucial para a consolidação das reformas sociais que o país necessita.

As disposições de pensamento da extrema direita não estão circunscritas aos círculos organicamente vinculados ao bolsonarismo, abrangendo largos setores sociais.

O desafio educacional é, nesse sentido, parte da estratégia política.

A reabertura do diálogo já preconizada pelo Presidente da República sobre o futuro da educação básica coloca o tema no patamar político exigido pelos embates hegemônicos no atual contexto de afirmação de um novo horizonte para a democracia representativa e participativa em nosso país.

Conselho Editorial do Fórum 21Portal das Esquerdas.

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